sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

 O chão muito varrido

Carrega a lombar

A dor durante o ato insistido

Ampara semblante silêncio

Shshshsh...

Tem uma dor aqui

Algumas dores por aí

Há de haver o perdão

Da criança que aprendeu com seu pai sobre narizes serem ventas 

Dessa criança em adulto apontando o racismo

De sua consciência cidadã no serviço público


Há de haver perdão

Nas palavras sucintas ditas em tons suaves

Pelos benefícios dos silêncios

Resumidos a números

Na liberdade de ir

Apenas







 Conversão em crise na lombar

Muitos dias na cama quando a coisa não passa e nem me deixa passar

E eu gozei

Regozijei

Através do silêncio

Atravessei meu mar de me lavar

A minha cabeça cara pra fora da água da piscina

Assim fizeram os cães meus cães

O inseto que se come dentro da água

Uma asa com sangue

E farelos de aveia

Suficiente pra chamar um morcego mergulhado e faminto filhote

Tudo pelo ralo da pia 

Eu não vou criar um morcego dentro da água

Morcego dentro da água engarrafada não se cria


Na veia 

Morcego

Minha face consegue boiar para fora da água 

Sem criar três bichos 

Apenas boiar

Talvez a música venha chamar

Eu deixo

É possível fazer silêncio de mim na companhia dos outros

É preciso dançar

Antes de ir

Cantar 

Até chegar

Deixar os lábios encostarem com delicadeza 

Cerrar

Palavras que vêm pra mim

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

MARCADOR DE PÁGINAS

 vocês fingem

mentem

escondem

e quando eu digo

nada adianta

tudo isso

porque surgem evidências

e eu tenho olhos de ver

uma lógica inconsciente

a palavra da criança, do velho, do adolescente

aquilo que escapa 

quer ser calado na ética do nada

nem por mim, nem por vocês


aconteceu comigo

acontece comigo

ter que fingir

mentir

esconder

deixar de ser

quem sou eu

por vocês



terça-feira, 31 de outubro de 2023

 A mesma música

Aquela que banha nos primeiros sinais 

de um arranjo

Um encontro

Uma passagem

O outro lado vazio para sempre

E mesma música preenche os ouvidos abertos para sempre

Parece que o simples violão junto a palmas assovios

um piano

meia-lua 

Contrabaixo 

Na mesma música

Uma voz que reza à brasileira 

São raízes na terra de viver até morrer


sábado, 27 de maio de 2023

 Aí: 

TAB

Sou toda sua

Quando você aparece

Inunda 

Em mim

Meu animal 

Indomável

Matador

Sem cura

domingo, 23 de abril de 2023

 Então eu choro novamente

Se é que eu choro

Minha ofegância com meus olhos ardidos

Aliás tudo ardendo na cara

Por que rompe?

Por que vejo (e aqui vem o choro) a sozinhez agarrada em um outro que não existe

Objeto que não existe

Choro uma alteração de consciência

Incontido, abandonado

E os cães latem muito alto em meus ouvidos 

As lágrimas brotam na mágica do corpo 

Água e sal

quarta-feira, 29 de março de 2023

 Mastigando meus dentes e assim triturando nada além dos meus próprios dentes

Triturando pensamentos nem pensados 

Incontrolável e imperceptível

Uma força capaz de dolorir

Enquanto se dá a morte

A vida se atualiza

Desse jeito mastigado

Impossível de engolir

terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Eu vi um menininho parado na frente da nossa varanda em festa. Parece ter sido capturado pelo som do violão, da percussão e das vozes que emanava de lá. Ele estava acompanhado de uma babá, chegou a caminhar mas só até a outra parede da varanda, parecia estático mas os olhos se dirigiam pra dentro da varanda, mesmo eu não sabendo pra onde seus olhos se dirigiam quiçá seus tantos sentidos. Eu estava usando um copo e um canudo de plástico pra tocar, mostrei a ele. Perguntei: você está gostando da música? Ele anuiu quase sem esboçar movimento e o seu olhar na minha direção durou apenas como um flash, rápido, sem sorriso, sem movimentar visivelmente qualquer parte do corpo.

Outra pergunta poderia substituir a primeira: Do que você está gostando? Talvez o corpo dele mexesse mais na elaboração da resposta a essa pergunta. Mas eu não estava trabalhando, estava me divertindo ainda que com profissionalismo. O cachorro fez aproximação mas a criança pouco se mexeu mesmo quando o animal subiu até alcançar-lhe os ombros. Parecia que ele tinha pousado ali em meio a música. Recebi notícias que ele esteve tocando algum instrumento no palco local. Então estava explicado. A contemplação na qual aterrissa o artista captura o corpo do artista.

Ao disponibilizar os sentidos (audição , tato, olfato, visão, paladar) para a música especialmente, tende-se a afinar o corpo de uma forma tal que onde soar uma nota os ouvidos estarão lá.