terça-feira, 30 de outubro de 2018

As faces se desvelam diante do que não se tem controle
Eu queria ter mais vocabulário pra te dizer mais coisas que eu vejo
Mas ando triste, confusa desorganizada diante do que eu não tenho controle
Eu poderia estar falando do meu medo da morte
Eu poderia estar pedindo que ela se atrase
Que venha no incontrolável vírus
Na enlouquecida bactéria
Que venha naquele músculo cansado
Nas artérias entupidas
No tumor invisível
Numa inflamação furiosa
Na febre que cala a fala
Que atormenta a pele
Que paralisa os quereres
E marca o fim dessa minha contribuição em palavras

O incontrolável vem de você e é de você que vem a minha contagem regressiva
É dos seus ouvidos, dos seus dedos
É?
Foi?
Do seu silêncio vem a minha confusão
Das suas palavras malditas
Dessa sua boca que nem abriu e ficou compartilhando bocas mentirosas e assassinas
Doeu?
Você me confunde e diz que me ama
Vermelho sou eu?
Não sou poeta que decanta palavras
Eu agora quero cuspir a secreção das minhas vias respiratórias
Depois que você me mandou parar de falar
Apontou pro meu corpo e tentou me impedir de continuar a manter meus passos
A garantir meu espaço
Você sim!
Você sim!
Assassino de mim
O dia em que os pais atiraram nos filhos
Os tios atiraram nos sobrinhos
Mães atiraram nas filhas
Avós atiraram nos netos
Primas atiraram em primos
Amigos atiraram em amigos
Irmãos atiraram em irmãs

O que é que tem se eu te amo muito?
Me diz o que é quem tem?
Você me ama muito?
O que é que tem?

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Pra lembrar de quando eu estive chorando e alertando.


Quero ver todo mundo que viu
Cinco travestis mortas
Em sete dias
Eu quero ver quem viu
Perfil por perfil
Selfie por selfie
Quero ver quem tá metendo as caras pra ver
Quero ver meu pai
Minha prima
Aquela amiga funcionária terceirizada da maior empresa do Brasil
Quero ver virar
Quero ver se estão vendo
Suas caras
Suas carnes
A parte que lhes toca
Sendo mastigada
Amordaçada
Ameaçada
De morte
Vou pro teatro
Vejo uma rede de pescador
Os presentes devolvidos (por ela)
Ela devolve os plásticos
E algumas frutas
Como maçã
Esmaltes são devolvidos
Pentes de monte
tampinhas
Palitinhos
Peixinhos
Moreias
Mortas
Se o mar
Morto

domingo, 21 de outubro de 2018

Parece que a música de Milton e de Zé me abriram o peito no meio sem dor, só um aperto que tá no meu peito. Eu disse a mim hoje que sou feita de música brasileira. Ela me faz chorar. Chorar por essas coisas tão lindas que escuto e um dia a morte vai me tirar. Tem o choro da dor do mundo no meio dela. Me diz um monte de verdades. Na cara. Um grito. Um ai. 
Casas esquecidas. Casa do meu peito fissurado por deixar entrar canções.

domingo, 14 de outubro de 2018

Vinde a mim as palavrinhas
Secadoras palavrinhas
Vinde a mim e entrem em mim
Minha casa é a vossa morada
Santas palavrinhas
Ao assentar no meu corpo
Façam de mim um instrumento das vossas vontades
Me inscrevam
Tatuem de preto, de branco
Perfurem rasgando minha pele seca
Façam com que eu cale e as aceite
Contenham meu cuspe e minhas veias suculentas alteradas
Enxarquem-me com o seu manto
E onde houver ódio
Façam de mim apenas o ponto final

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Diário de bordo

Como fazer existir a palavra liberdade?
Como encontrar o amor?
Como saber a verdade?
Alguém viverá esse amor
Alguém viverá esse amor também
Assim como uma índia brasileira amou marinheiro português
Nas praias do Rio Vermelho
E viveu com ele o resto da sua vida
Assim como uma onda precisa da praia
Duas pessoas se amarão
Pra fazer viver a palavra liberdade
Pra fazer existir o amor
Pra saber que a morte é a única coisa que separa as almas aqui na terra

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Olho pra ela sempre
E me despeço todos os dias
Olho o que ela deixa pra trás e me chama a atenção
Sei que deseja estar bem viva após a morte
E deixem que fale da morte
Coisa mais viva que isso é impossível
Coisa mais viva que isso é só olhar pra o que ele deixa
Pra estar livre e viva
Para sempre
Viva
Para sempre
Aqui
Para sempre