domingo, 30 de dezembro de 2018

Mais sensíveis, menos sensibilizados. É necessário algo muito forte pra mexer com a couraça advinda das cicatrizes, pra afrouxar os pontos da sultura de modo que elas permitam o rasgo na grande membrana e a tesoura do desejo, a linha da saudade, a agulha da dor, os pontos da estrada em cascões sejam dispensados de suas funções e deixem entrar com tudo a poesia, o cheiro dos corpos, a suavidade das vozes, o gosto da boca, o raciocínio veloz e lógico, a música, o amor, a ilusão. Por mais sangrenta e brilhante a ação do rasgo, sempre será solidão.

sábado, 29 de dezembro de 2018

Tinha a saudade do marinheiro também. Mas as baleias em festa no mar me provocaram gritinhos de muita alegria. Tanta alegria! Uma baleia bem de pertinho para estimar.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

O BABÁ E A DONA DO TERREIRO

A água jorrava bem acima da cabeça dela molhando o seu corpo inteiro. Assim, escutando o chiado do jorro, ele foi chamado a se banhar. Ele disse que Xangô avisou por todos os meios que a sua senhora é e sempre será a Música. Debaixo d'água os dois, ela disse:

- Diga a Xangô que eu cheguei. Eu sou das águas, estarei sempre aqui pra você sempre ir com Nossa Senhora.

Banharam-se juntos. O corpo dela girando lentamente nas mãos dele, enquanto sorria. Possuíram-se. Molhados e exaustos, ele descansa a mão no peito dela e diz:

- É um reencontro. Eu não sei porque está acontecendo agora... É forte.

-  Você não esperava que eu fosse chegar tão rápido. Vou caminhar enquanto seus pedacinhos vão-se juntando.

- Não faça isso. Eu serei sempre dela, minha alma está vendida.

- Acha que eu cheguei por quê?

Ela gargalha alto, silencia bruscamente em seguida, se olham nos olhos e ele desvia. Então ela diz:

- Eu me sinto muito feliz aqui. Minha alma é ela. Nem preciso mais cantar.

 - Sim, você precisa! Seu canto é o que lhe faz existir.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Carta ao Maestro

Quando tudo é solidão e as paredes em branco nao sustentam o risco que eu faço, eu busco outras paredes. Não sei se o nome dessas coisas que sustentam a ponta do meu lápis, ainda que o façam escorregar, podem ser chamadas de paredes. Podem ser taludes, sapatas, tubulões, pilares, vigas, algo que impeça o meu tropeço. Alguém, não algo, algo não move a humanidade, alguém move a humanidade por alguém. Naquele dia de vento nulo e horizonte desaparecido, naquele dia em que levantei da mesa do jantar com o meu cão, eu cumprimentei alguém cuja fala no passado me fez paredes, pilares, essas coisas que impedem que o pensamento caia no buraco sem fundo. Foi só isso. O espelho-alguém disse que eu não estava tão só nessa cidade de pouca vergonha e muita verdade de pouca justiça e muita vaidade. Depois a saga da travessia, depois axé, depois meu primeiro panorama percussivo mundial, tudo entre o centro e o rio vermelho e eu, querendo silêncio de mim, diminuindo a urgência desse vômito musical, dessa coisa incontida porém barrada com muito esforço por um pouco menos de 220 horas mensais por tantos anos. Um pouco menos. Porque eu só chego tarde, quando as paredes estão trincadas, úmidas e escorregadias, e eu em terreno movediço.

sábado, 15 de dezembro de 2018

Usam as mesmas palavrasd. Dizem que já leram o meu livro. Depois dizem que sou uma incógnita. Exigem o meu corpo.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Mira ella mira
Mirou
Acende a luz na cabeça
Me conte do que já fui
Quando mira ella
pomba gira
Baiana roda
Padilha
Hermosa

Está doendo tanto
Mira para dentro en mi
Manuseia
Manuscreve
Alerta-te
E me deixa fugir lá pra onde não tem esconderijo
Lá onde o cão cansado desmaia em sono profundo
Onde o ventre chama pela vida
No lugar mais úmido do mundo
Bem lá dentro
Entre as formigas, sapos, cobras e preguiça
Onde as flores suportam o peso das águas muito maior do que elas

"em mim o eterno é música e amor"

A vida é sem sentido e eu tenho sentido pouco a vida, ainda que o vazio seja fruto do imaginário, ele vem como uma sensação, assim como o amor o é.
O solado adere ao chão sustentando o corpo trêmulo. O físico é aparentemente harmonioso e a sede avisa que o corpo está vivo.
Homem de mim.
Vinde a mim.
Cara no espelho.

domingo, 9 de dezembro de 2018

"Ando com saco da saudade
Tirando sarro da saudade
Escorraçando a saudade a ponta-pé
Ando mijando na saudade
Dando na cara da saudade
Dizendo pra ela quem ela é
E agora fico rindo sozinha
Na frente do espelho
E agora fico rindo só minha
Na frente do espelho
E agora fico rindo só linda
Na frente do espelho"
Uma mata, um cavalo, uma vaca, gatos, cães, neném, mar, casinha fresca, rede, horta, livros, lápis, papeis, contas, bicicleta, barco, mergulho, algumas coisas que doem, velhice, último suspiro, eu, você, o mundo. O que for manso, silêncio, música e poesia. 

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Encontro com o maestro

Todo dia é nascer e morrer. O sol morre a noite vive, o sol nasce a noite morre. Todo dia, todo dia, todo dia. Uma tristeza chega, e lá se vai a alegria. Quando o olhar está no nada, logo surge algo pra se olhar, um encontro pra se abraçar e lembrar que é preciso continuar a nascer e morrer, até que a morte faça desaparecer a vida e a vida continuar após a morte.
Olhe aqui por dentro, entre as pálpebras. O sorriso e as pazes durante o dia, o que lhe dizem? O trabalho com vigor, a rotina cumprida, contêm as lágrimas no cair do dia. Vai-se arrastando pela casa. Cadê a paixão, meu deus? Os beijos, a companhia, as gargalhadas, onde estão?  Uma mulher mal amada anda rasgando o mundo por onde passa. E se não está faltando alguém ao seu lado, do que sente falta?
As almas sempre encontram-se. Na grande membrana, os traços ancestrais marcam o amor. O desejo impõe o deslimite e assim, a água salgada que sai do corpo é capaz de encher um oceano e através das ondas enviar a mensagem: saudade.

domingo, 2 de dezembro de 2018

Uma voz com poder canta lá de longe que o sol há de brilhar mais uma vez. O longe é aqui. Escuto todo o repertório com clareza, a clareza que faz o silêncio do vento parado e das ondas mansas da maré vazia. Na folha de papel amarela amassada está escrito que a ilusão do ser humano é a de que ele rege o mundo. Os filósofos (para que os filosfiló?) para os angustiados seres humanos feitos de palavras cientes da morte. O mar agitado na volatilidade dos sentimentos. A evitação faz a sua parte com primazia.

terça-feira, 27 de novembro de 2018

Olhei pra um espelho e disse eu sou assim. Eu demoro. Todo mês. Eu fico pensando. Pensando . Choro pelo mundo todo. E o meu mundo. É o vento frio entrando pela vidraça. Barulho das ondas no mar.
Minha filho cacau
Essa fruta quase baiana de tão bem plantada e tão quanto espantada
Vassoura de bruxa quem te criou te põe pra fora
Minha filho cacau
Eis a solução
A tentação da apetência de única ponte
De tentativas
De amar

domingo, 25 de novembro de 2018

Quando o corpo precisa parar
Fica quieto e ninguém te bole
Ninguém te liga
Você desliga
Do mundo
Quando o corpo descansa
Seja lá quanto tempo levará pra isso
Carimbaram de outro nome
Inventaram novos códigos
O corpo inerte passivo
Em transformação
Entre dobras dançadas em luto por outros corpos
Agora sem órgãos
Apenas tecido
Essa vou decantar
Brasa leira
A brasa e leira
Sangue latino
Lero lero
Puapixuna
Avacanoeiro
O sertão o mar o grito
Abraço
Caravana
O mundo
Meia lua inteira
Cicatrizes
Meu mundo e nada mais. Homens não admitem mulheres homens ainda que sejam mulheres. Mulheres homens eu digo pra colocar um nome na mulher. Não existe mulher e homem, feminino e masculino, xereca e pinto - tudo invenção pra diminuir o outro a partir da diferença. A mulher fica vulnerável enquanto sangra, enquanto grávida, enquanto parturiente. Nessas vulnerabilidades, dependente da figura que não sangra, que não gera em seu ventre, que não expele do seu ventre, que não amamenta, aconteceu os primórdios da relação de poder e diferenciação de sexo. Lacan fala desse primórdio da diferenciação a partir das placas M e F em portas distintas dos banheiros. O corpo feminino sofre alterações hormonais ciclicamente. O corpo masculino não tem menopausa. Há corpos de mulheres muito mais fortes do que corpos de homens. Mulheres copulam com vários homens, homens copulam com várias mulheres, salvo quando o corpo da mulher está sangrando, gerando, parindo, amamentando, além das variações cíclicas hormonais. Homens sempre estão aptos a copular. Mulheres não. Mulheres podem copular com vários homens quando sangrando, gerando, amamentando, girando ciclicamente seus hormônios. Crianças também são vulneráveis e crianças mulheres são educadas a serem vulneráveis. Mulheres começam a alterar a gramática. A mulher homem sente na pele a homofobia. Una mujer sin complejos. Desea  todo hombre. O homem esconde sua fantasia sexual da mulher porque ela não admite essa fantasia. O homem divide a sua fantasia sexual com outra mulher-homem. Gosta de um homem chupando seu pênis e sente prazer no seu ânus.

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Eu abria a porta da minha casa e lá estava o casal. Eu olho pra moça me colocando na ponta dos pés pra ficar mais alta do que ela e imponho um olhar com arrogância. Ela de mãos dadas com ele, na minha porta, eu tendo que receber na minha casa. Senti-me trêmula. Com mal-estar. Passei mal. Eles olhavam pra mim sem entender porque fiquei muda diante da cena do casal. Quando eu te reencontrei, você estava só. Depois escolheu quem te acompanhar. Eu, muda. Ó arvore frondosa!, tanto recolhimento, avanço, acendido pelo reencontro do reencontro. Não foi tão bom quanto você imaginava. Não foi tão bom como o que está contido em uma cena de cinema e cruzamento de hormônios-intelectuais. Vou parar com isso.

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

O princípio do fim

"Vou sair pra ver o céu 
Vou me perder entre as estrelas 
Ver d´aonde nasce o sol 
Como se guiam os cometas pelo espaço 
E os meus passos 
Nunca mais serão iguais
Se for mais veloz que a luz 
Então escapo da tristeza 
Deixo toda dor pra trás 
Perdida num planeta abandonado
No espaço 
E volto sem olhar pra trás
No escuro do céu... mais longe que o sol... 
Perdido num planeta abandonado 
No espaço"
O que é um vício
O que é uma paixão
O que é a calúnia
O que é o tesão
O que é a distância
O que é o abandono
O que é a aproximação
O que é a ponte
O que é o corpo
O que é o homem
O que é o chão
O que é o grito
O que é o maldito
O que é aquela coisa que não se vai quando tem que ir.


segunda-feira, 19 de novembro de 2018

 Uma tentativa de escrever pra você, amor. As rugas vão-se fazendo pelo corpo e sustentam-se no dia todo mesmo em febre de final de dia. Ventosas nos sorrisos ao  receber um sanduíche quente na padaria de tantos olhos reconhecíveis enquanto cruza com aquele ator de cinema irreconhecível e ri durante uma conversa sobre ter ou não ter dois cães. Despede-se dos que não lhe oferecem futuro em voz alta pela rua sozinho. Estou deixando claro pra você, amor. Lugares desertos lotados, o homem catando lixo esforçando-se em seduzir pelo pára-brisa sem perceber os esforços daqueles pés no acelerador e na embreagem em terreno tão íngreme e quase insuportável na escuridão de flash vermelhos. Tenho pouco para te dar, amor. O caminho pelas pedras solicita cada micromúsculo debaixo do sol no ser tao cujos pés minúsculos escorregam sobre o limo fresco cheirando à maresia. Assim será se for, amor. Errante corpo atarantado agarrando-se a uma corda no pescoço de um animal guiando pelo norte verdadeiro do outro lado da rua catando comida pelo chão. Seja lá quem você é, amor. Mate-me.
Há algo cíclico e o trabalho é saber qual o ponto da curva
Se é parabólico
Ou algo que aponta na distância perfeita daquele centro eu
Girando feito um catavento desmantelado
Enquanto o sol nasce e queima
Enquanto a maré sobe e desce
Enquanto o sol se põe e turvam-se as vistas
Clamando alucinações

O mundo é todo sujo mesmo
E a liberdade é o gozo do morto
É a razão pela boca daquela criança preta
Neta de pescador
Aqui é o lugar onde ninguém sabe
Há ânsia de vômito
Falta de apetite
Insônia
Asfixia
Tontura
Coisa emperrando a saliva descer pela garganta
Nessa busca de saber
 Buraco vai-se abrindo
Areia seca ou areia molhada
Pessoas permanecem na margem
Eu fundo
Bem fundo
Segurando a corda no pescoço animal
Definhando em Gardner
Desconfiando em Claudel
Esvaindo em Jonker
Sufocandom Regina

Mergulhando nos demônios

É proibido sonhar

terça-feira, 30 de outubro de 2018

As faces se desvelam diante do que não se tem controle
Eu queria ter mais vocabulário pra te dizer mais coisas que eu vejo
Mas ando triste, confusa desorganizada diante do que eu não tenho controle
Eu poderia estar falando do meu medo da morte
Eu poderia estar pedindo que ela se atrase
Que venha no incontrolável vírus
Na enlouquecida bactéria
Que venha naquele músculo cansado
Nas artérias entupidas
No tumor invisível
Numa inflamação furiosa
Na febre que cala a fala
Que atormenta a pele
Que paralisa os quereres
E marca o fim dessa minha contribuição em palavras

O incontrolável vem de você e é de você que vem a minha contagem regressiva
É dos seus ouvidos, dos seus dedos
É?
Foi?
Do seu silêncio vem a minha confusão
Das suas palavras malditas
Dessa sua boca que nem abriu e ficou compartilhando bocas mentirosas e assassinas
Doeu?
Você me confunde e diz que me ama
Vermelho sou eu?
Não sou poeta que decanta palavras
Eu agora quero cuspir a secreção das minhas vias respiratórias
Depois que você me mandou parar de falar
Apontou pro meu corpo e tentou me impedir de continuar a manter meus passos
A garantir meu espaço
Você sim!
Você sim!
Assassino de mim
O dia em que os pais atiraram nos filhos
Os tios atiraram nos sobrinhos
Mães atiraram nas filhas
Avós atiraram nos netos
Primas atiraram em primos
Amigos atiraram em amigos
Irmãos atiraram em irmãs

O que é que tem se eu te amo muito?
Me diz o que é quem tem?
Você me ama muito?
O que é que tem?

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Pra lembrar de quando eu estive chorando e alertando.


Quero ver todo mundo que viu
Cinco travestis mortas
Em sete dias
Eu quero ver quem viu
Perfil por perfil
Selfie por selfie
Quero ver quem tá metendo as caras pra ver
Quero ver meu pai
Minha prima
Aquela amiga funcionária terceirizada da maior empresa do Brasil
Quero ver virar
Quero ver se estão vendo
Suas caras
Suas carnes
A parte que lhes toca
Sendo mastigada
Amordaçada
Ameaçada
De morte
Vou pro teatro
Vejo uma rede de pescador
Os presentes devolvidos (por ela)
Ela devolve os plásticos
E algumas frutas
Como maçã
Esmaltes são devolvidos
Pentes de monte
tampinhas
Palitinhos
Peixinhos
Moreias
Mortas
Se o mar
Morto

domingo, 21 de outubro de 2018

Parece que a música de Milton e de Zé me abriram o peito no meio sem dor, só um aperto que tá no meu peito. Eu disse a mim hoje que sou feita de música brasileira. Ela me faz chorar. Chorar por essas coisas tão lindas que escuto e um dia a morte vai me tirar. Tem o choro da dor do mundo no meio dela. Me diz um monte de verdades. Na cara. Um grito. Um ai. 
Casas esquecidas. Casa do meu peito fissurado por deixar entrar canções.

domingo, 14 de outubro de 2018

Vinde a mim as palavrinhas
Secadoras palavrinhas
Vinde a mim e entrem em mim
Minha casa é a vossa morada
Santas palavrinhas
Ao assentar no meu corpo
Façam de mim um instrumento das vossas vontades
Me inscrevam
Tatuem de preto, de branco
Perfurem rasgando minha pele seca
Façam com que eu cale e as aceite
Contenham meu cuspe e minhas veias suculentas alteradas
Enxarquem-me com o seu manto
E onde houver ódio
Façam de mim apenas o ponto final

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Diário de bordo

Como fazer existir a palavra liberdade?
Como encontrar o amor?
Como saber a verdade?
Alguém viverá esse amor
Alguém viverá esse amor também
Assim como uma índia brasileira amou marinheiro português
Nas praias do Rio Vermelho
E viveu com ele o resto da sua vida
Assim como uma onda precisa da praia
Duas pessoas se amarão
Pra fazer viver a palavra liberdade
Pra fazer existir o amor
Pra saber que a morte é a única coisa que separa as almas aqui na terra

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Olho pra ela sempre
E me despeço todos os dias
Olho o que ela deixa pra trás e me chama a atenção
Sei que deseja estar bem viva após a morte
E deixem que fale da morte
Coisa mais viva que isso é impossível
Coisa mais viva que isso é só olhar pra o que ele deixa
Pra estar livre e viva
Para sempre
Viva
Para sempre
Aqui
Para sempre

segunda-feira, 24 de setembro de 2018



Foto: Amanda Gomes, 2018.


Você consegue mexer com todo mundo!
E quando está assim
E quando está assim
Vestida para o mar?
Gira o corpo pela cintura
Gira
Gira e chama
Chama
E canta
Canta 
Canta
Sua alma é de artista
Menina baiana
Salvador é a cidade da música
Cantora baiana
Soteropolitana
Sua família é um terreiro
E eu peço a benção 
Minha sereia
Pra eu viver
Quero ficar

Todo dia eu venho aqui e olho todo dia pra sua caixinha
Todo eu estou aqui com olhos abertos ainda que lacrimejantes todo dia
Todo dia eu sinto que devo trabalhar muito todo dia estudar muito
Todo dia fazer muitas coisas iguais
Todo dia cerrar os olhos na memória da sua voz todo dia
Todo dia é santo dia e eu reaprendo todo dia
A orar
A rogar
A chorar
A grunhir
Todo dia

sábado, 22 de setembro de 2018

Parece que eu sou o diabo
Tão bom e tão mau
Tão prazeroso e tão assustador
A beleza do mar revoltoso
E o medo de se afogar
Ele tem que se afastar um pouco
Silenciar muito
Manter a distância

O diabo é o diabo por quê?
Porque é livre.
Porque incita a sua liberdade.
Porque lhe aperta o peito de tesão e de saudade.
Porque pulsa.
Porque cria.
Porque odeia.
Porque ama.
Porque canta.
Porque sente a morte como ninguém.

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

O amor é uma árvore milenar

Minha cama é uma duna
Quando eu me deito
Minhas mãos alcançam a janela
Meus dedos adormecem brincando com a água do mar
Lá fora
Quando vem rompendo o dia
Eu me levanto
Piso na areia
Eu moro na praia
Da paciência
Todos os dias são assim

terça-feira, 11 de setembro de 2018

Carta pública à menininha

Menininha,

estou acordado pensando em você e como a vida é curta e a morte é dura. Ou a vida é dura e a morte é curta? Ou a vida é a morte? Ou há vida porque há morte? Eu sei que... Eu não sei de nada, minha flor. Apenas me disseram que você depois de nascida ficaria sem mim, mas comigo após a morte. De quando te fiz chorar de rir, até você dizer ai minha barriga está doendo de tanto rir. A vida doi, coisa linda, tão bonitinha. Eu fiz muitos esforços pra continuar. Qualquer dia desses eu termino essa carta, amorzinho. Hoje o tempo acabou. Agora, meu coração agora é o seu coração. Você é a minha semente. Sorria o meu sorriso, minha vida. Seja Clara, Amor.

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Caiu a ficha
Eu a vi ali embaixo
No chão
Faltou ar
Muita febre alta
Vomitos
Internação

A ponte retrátil se abriu
Eu a vi sumindo
Surgindo uma piscina
Limpida e própria
Para todos

Ainda falta ar
Afinal há um elevador
Com porta entreaberta
Frio na barriga
Estado de choque
Uma borracha na paixão

Os olhos burros querem atirar em todos os barcos da linha burra do horizonte
Bang Bang

Covardes brincam
Com eu te amo
Não se brinca
Quero atirar até afundar
A sua boca maldita
Desgraçado
Barco à vela
Assim de longe é mais fácil
Para covardes


sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Fotografia

Então concordaram sobre a Santa morte. Ela lhe falou da santa fé que encontrou na música. Ele lembrou que nascer e morrer é a todo tempo.

sábado, 11 de agosto de 2018

Diário de bordo

Agora é o sol, haja vista que sempre foi ele desde a primeira partícula.
Será por isso essas luzes vindo em direção ao meio do meu peito fazendo um aperto e cindindo em muitas linhas o meu corpo quente, respiração em repouso, óculos escuros, protetor labial, cuidado com a água imprópria, molho só os pés, escuto sobre a vida de uma desconhecida sem dentes inferiores cujo marido brinca com o meu cão. São desenhos do sol. São muitas linhas luminosas. Às vezes doi o aperto. Às vezes é dor da paixão. Às vezes não. Muita dor no mundo. O Sol queimando.

segunda-feira, 6 de agosto de 2018

S2

É linda a minha mascara
Linda a minha bandeira do Brasil hasteada
A minha rede
Meu sofá
São lindas as minhas plantas
É lindo aguardar brotar
Meus livros são lindos
E a cabeceira da minha cama
O criado-mudo é lindo
Lindo é o meu amigo cão
Linda é a prainha
O arco-íris
O horizonte
O meu lugar

domingo, 5 de agosto de 2018

Fotografia

Tenho certeza que aquela velha sentada no banco da praça sabe
Aquela velha sentada no banco da praça que viu o casal de velhos se aproximar e sentar ao seu lado
Eles falaram sobre o mais esperado encontro de filosofia do ano
Disseram que viajar não serve pra nada mas que morar nos lugares sim
Ele falou das chicotadas que levou da menina de cabelos longos na juventude
Ela disse que já não acredita mais em casamentos
Disse assim: cada vez menos
E mostrou a ele o outro casal de velhos dançando forró no clarão da praça
Ele a convidou pra dançar
E ela perguntou se era um convite sério
Falaram de tempo musical e arte marcial e música clássica
De mergulhos na baía e de pesadelos com o fundo do mar
Ela disse que viu outro mundo
Ele disse que não viu cavalos marinhos
Ela falou que se ele escrever será lembrado após a morte
Ele disse que tudo será esquecido em quinhentos anos
Ela pediu pra ele parar com isso
Sobre isso de ser esquecido
Eles se olharam e sorriram
Ela falou que lhe falta a fé
Ele disse que a vida é sem sentido
Ela disse que o silêncio é um sentido da vida
Ele diz que enquanto isso faz as coisas que lhe dão prazer
E aquela velha levantou sorrindo desejando boa noite ao casal

sábado, 4 de agosto de 2018

Diário de bordo

Obrigada pelo seu medo
Obrigada
Obrigada
E não havia nada
Obrigada por isso
Obrigada
Uma psicopatologia
Muito obrigada
Obrigada

Tudo de ruim que um dia eu senti, hoje já não sinto nada, foi tanto amor e fé, e hoje já não é nada, vem o silêncio, os feches de luz do lado de fora congruem bem no meio de mim, à altura do peito, eu canto todo dia e quando escurece sou ainda aquela criança que teme morrer de quê?

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Diário de bordo

Você é o meu eu preferido
Eu sou tão você quando está comigo que quando você não está eu deixo de ser muito eu
E é só isso
O seu silêncio me provoca
Outros eus meus
Eu medito
Eu rezo
Eu choro
Eu resigno
Eu proíbo

Eu estou aqui com você
Eu amo você
Eu atravesso o meu mar e posso entender
Que eu vivo melhor quando me vejo em você

segunda-feira, 30 de julho de 2018

Aqui estou eu
Nesse universo avesso
Em palavras tuas
Em lugares meus
Em pensamentos de quem quer que seja
E cultua a lua
Para parir o dia
Para depois dizer
Boa noite

Porque um sorriso desavessa
teu sorriso
Sua arruda no cabelo
Destrambelha o que não tem jeito
Naquele cachorro de rua que era meu
No "fuck you baby" de poeira e indicador no vidro do meu carro

Eu de avesso
Apaguei
E por seu som
Me guiei
Para além
Desse avesso
Nesse mundo
Que a gente
Tem


sábado, 28 de julho de 2018



Sob o eclipse lunar e rompimentos e desenhos na areia e pedaços de carne podre espalhadas

Quando eu fui ferido
Vi tudo mudar
Das verdades
Que eu sabia
Só sobraram restos
Que eu não esqueci
Toda aquela paz
Que eu tinha
Eu que tinha tudo
Hoje estou mudo
Estou mudado
À meia-noite, à meia luz
Pensando
Daria tudo por um modo
De esquecer

Eu queria tanto
Estar no escuro do meu quarto
À meia-noite, à meia luz
Sonhando
Daria tudo, por meu mundo
E nada mais
Não estou bem certo
Se ainda vou sorrir
Sem um travo de amargura
Como ser mais livre
Como ser capaz
De enxergar um novo dia
Eu que tinha tudo
Hoje estou mudo
Estou mudado
À meia-noite, à meia luz
Pensando
Daria tudo por um modo
De esquecer
Eu queria tanto
Estar no escuro do meu quarto
À meia-noite, à meia luz
Sonhando
Daria tudo por meu mundo
E nada mais
(Meu mundo e nada mais, de Guilherme Arantes)
Minha cama está cheia de areia e minhas mãos para fora da janela tocam o mar. De longe já se via que sereia homeriana é a verdade sobre as sereias. Iemanjá é vaidosa porém muito amável. Se eu sou uma sereia, eu mato.

quinta-feira, 26 de julho de 2018

Quando o Amor é insustentável, o que nos sustenta nesse mundo?

O fim nunca é o fim
O fim de um invólucro é a metamorfose
O fim daquilo que ainda nem se sabem asas, depois da descompressão
É um voo
Mesmo sem saber
Voar

Quando uma trinca é um abismo
A água tende a escorrer pelo vale
Veem-se aves voando
Homens construindo pontes
Uma corda é colocada para o equilibrista

O fim nunca é o fim
A pausa é para a música existir
A paragem serve ao próximo movimento
O corpo nasciturno nu, para ser envolvido por um tecido

O abdômen contraído para aquela dor chegar ao fim
A lágrima caída enxarcando a face para aquela dor chegar ao fim

O abdômen contraído por aquela risada depois da dor que se foi
A lágrima caída enxarcando a face depois daquela dor que se foi

O fim nunca é o fim
A caça morta na barriga do predador
A criança que chora aprende a dizer da dor
O amor quando vai embora faz caminho pra um novo
Amor

terça-feira, 24 de julho de 2018

Parada olhando para os buracos e coisas dentro dos buracos. Dá agonia. Ele diz que está agoniado e sente vontade de vomitar. Medo de mim, medo de mim. Medo de mim.
Uma píton
Um caminhão
Uns cavalos
Uma avalanche
De pedra
De terra
De neve
Um toró
Um incêndio
Um furacão
Um tsunami
Um desabamento

Sobre mim.

sexta-feira, 20 de julho de 2018

Eu vou inventar que a noite e o dia não existem mais, talvez assim eu viva melhor. De dia pode haver silêncio, de noite pode haver barulho das panelas. Eu caminho com o cão de noite e de dia. Eu sinto medo de noite e de dia. Eu penso naquela paixão de noite e de dia. Eu sinto vir uma música de noite ou de dia. Perco o sentido da vida de noite e de dia. Sinto felicidade de noite ou de dia. Sinto amor todo dia. Penso em disistir todo dia. Busco algum sentido de noite e de dia.

quarta-feira, 18 de julho de 2018

Antes da flor carnívora

Sonhei com uma flor
Uma flor embalada
Uma flor ganhada de alguém
Cujo nome não sei
Tampouco a intenção
Eu olhava pra ela sem querer e sorria por dentro
Com amor
Com algum pensamento ancestral
Ela já ficando velha naquele lugar
Algum rosa desbotado
Embalada em um plástico desarrumado
Trazia algo de bom
- Você é uma boia pra mim.

- Estamos boiando juntos.

- Eu sinto medo. Medo de te perder.

- Quando decidir sobre a pausa, por favor, me avise. Não me deixe sem me avisar. Eu sofro.

Eu sou uma flor carnívora. Amo com as minhas vísceras, ando com as minhas vísceras, exponho as minhas vísceras. Quer ver? Eu atrapalho por um segundo a sua vida quando suas mãos tocam em mim. Menos de um segundo. Logo você me olha com intriga. Pensa que me ama. Pensa em ir embora. Só pensa e cala.
[Pausa de mil compassos]
.
.
.
Com a certeza de quem desejar ficar, eu me fecho em flor. Me mordo por dentro. Arranco as pelezinhas. O amor é igual a dor, aquilo em estado gasoso que fulano disse. Aquilo cujo tamanho quando está dentro de um corpo, preenche o corpo todo de cada pessoa.

- Você tem sido a minha psicóloga. Você será muito boa psicóloga.

- Mas só eu falo da minha vida...

- É no escutar sobre a sua vida que você me tira daqui.

- Obrigada por me aturar há um ano.

- Eu amo você há um ano.


BOIAR =
  1. transitivo direto
    deslocar à tona da água; prender a boia(s) para que flutue.

    "boiamos os toros de madeira rio abaixo"
  2. 2.
    intransitivo
    manter-se à tona de água, líquido; flutuar.

    "atirada à água, a cesta boiou"
  3. Fonte: Google 

terça-feira, 17 de julho de 2018

De um ponto no mundo para um ponto no mundo

Agora está em suas mãos o meu desejo de suas mãos. Está em suas mãos as horas que ainda não vivemos. Nesse dia de seus tempos idos eu lhe desejo que deseje o seu desejo do meu desejo. Agora eu vejo na televisão aquele mar que banhou nossos corpos juntos, o mesmo mar que levou o seu corpo, o mesmo mar que quer levar o meu corpo, se suas mãos assim desejarem remar.

E aquela estrela cadente? E aquela outra estrela cadente? 

Seja lá o que suas mãos de boca traduzam seus pensamentos de mãos, que venha com saúde e sempre com saúde para você, e assim será para mim. 

Por ora, levo a minha mão a minha boca e desejo o meu desejo. Fecho a mão e a repouso sobre o meu coração por cinco segundos. 

domingo, 15 de julho de 2018

Os moradores se associam e conseguem diminuir o volume das badaladas por um pedido direcionado àquele que reza. Parece que não é nada disso e eu estou prestes a me matar. O volume das badaladas foi diminuído mas o resto está aqui sem direção. Levo protetor auricular e oculos escuros. Visto preto e jeans. Depois que meus órgãos forem retirados, deixem-me de jeans e ponto. Vou-me matar porque meu corpo mente suporta nada desse mundo doente.  Olho o passo a passo daquele nó para enfiar o pescoço. Vou apagar as luzes e fazer dormir os moradores. Vou-me encolher toda assim como eu era antes do dia em que eu nasci.

quarta-feira, 11 de julho de 2018

Aqui não se faz promessas, existem declaraçōes de Amor. O instante pra ser vivido é o lugar da saúde, o encontro é o que torna a vida melhor. O Amor dispensa juras, ele se declara e pede calma, ele lembra que existe a possibilidade de um novo dia. Sai por entre os lábios com um cheiro bom e deseja desejos bons. O Amor mostra o quanto muita coisa foi alterada a partir da sua presença - o trabalho, os estudos, a família, a viagem tão desejada, o cão. As lágrimas são encerradas só com o Amor. Há ressaca da tristeza porque há Amor. Há vontade em viver quando há Amor.

terça-feira, 10 de julho de 2018

Eu visitei aquelas terras da infância enquanto meu pai assumia a direção. Fiquei estarrecida com a devastação. Acabaram com a floresta e assim o cheiro daquele caminho. Eu chamei por deus de tão assustadora aquelas imagens. Eu sabia o que a havia ali, naquela curva, naquelas retas, naquela ladeirinha, e contestava quando meu pai dizia que eu estava enganada. Agora eu via a terra nua, algumas hortas eapalhadas, algumas casas mal acabadas, uns verdadeiros barracos, e muito pó subindo em meio ao sol. Nada de sombras das árvores. Nada de árvores. Acabaram com tudo. Eu estava muito indignada. Alguns latidos eu ouvi. Latidos de cães famintos, magros, pobres, eu imaginei. Não sabia para onde estava indo. Assisti apenas a passagem e essa paisagem agora inóspita. Nem sei se era tristeza dentro de mim.

segunda-feira, 9 de julho de 2018

E daí que eu esteja chovendo por dentro?
E daí que eu esteja queimando?
Se não deu tempo de entregar a resposta, e daí?

A loucura é a mãe da sanidade
O ódio é irmão gêmeo do amor

E daí?
Amanhã é outro dia
E eu estarei morta
E daí?

A saudade mata a gente
E um triste gemido sai

Mariana Magalhães dos Santos
1981 + 2018

domingo, 8 de julho de 2018

E agora a febre
De agora
O corpo cansado
De agora
Os olhos ardem agora
Ninguém liga

Deixa arder
Isso sim é motivo
De cama
De choro
De dor

De paragem

O que for lágrima
Descerá pelas narinas
O que for palavra
Sairá naquela tosse maldita

terça-feira, 3 de julho de 2018

Naufrágio

É uma viagem no navio
Mais uma viagem de não sei quantas horas
Uma viagem de não sei quantos dias
Menos um dia
E só você
Nas voltas que esse mundo dá
Nos nós que carregam as cordas dessa embarcação
Minha garganta
Meu pensamento
Meu coração navio

quinta-feira, 28 de junho de 2018

Estou aqui pra lhe dizer que pare de buscar a cura. Um dia pare.

301

É a hora das jandaias
É a hora de olhar pro estado febril
A hora de descobrir os véus
Talvez a hora de algum riso de mim
É a hora de fechar os olhos
Hora de sentir o corpo em movimento trêmulo
É a hora de assistir ao relaxamento
Hora de chegar a algum entendimento
Ou hora de desentender de vez
Hora de pensar em nada não existe
Talvez a hora de contar sobre algum sonho
Hora de capturar falhas falas
Hora do esquecimento
É a hora do choro
E hora de enxugar as lágrimas de criança
É a hora que pode falar da morte
Hora sem censura
Hora com vestes
A hora do aperto no peito
Hora do sem sentido
É a hora de buscar sentidos
Talvez a hora de alguma música
Hora de cantar essa música
Pra ver a hora que isso dá
Hora de...
Aham...
Siiim...
Hum.
Tá bom.

sábado, 23 de junho de 2018

Pistas

Quero ir como vai o ar de um sopro
Pra refrescar a quentura da vida
Quero ir sem saber que estou indo
Pra impedir as lágrimas metafóricas
Minhas, tuas, deles
Quero ser luz nesse dia da minha ida
Ser paz e par de quem acompanhar o meu corpo já enrijecido
Sem órgãos
Ser sentido
Quero pouco tempo pra esperar um pouquinho
Ir dentro do meu ninho
O meu cada olho opaco
Ser todas as palavras que deixei
Quero indicar algum caminho

sexta-feira, 22 de junho de 2018

O corpo aguenta
Chora e soluça
Grita pra dentro
E faz o nó na garganta
A febre é quando o corpo aguenta em chamas
Quente e calado
Metáfora pra suportar
A vida inventada
Machucada
O corpo aguenta as memórias
Aguentam as porradas

sábado, 16 de junho de 2018

Pessoa comum e abelhas míopes

Só há um
Só um coração
Mesmo com tantas flechas
Há um só
Ocupado
Sendo um só
Bate por aquilo só
Num pensamento só
Ele pergunta
Quantos quilos pesa um sonho que você sonha?
Só eu respondo
Que pesa o peso que eu sonhar que pesa
Assim, sozinha nessa vida que não tem que
(Não tem que nada nessa vida)
Ter consciência senão inventá-la

sexta-feira, 25 de maio de 2018

Aqui tem nada que acomode seus olhos
Esse fechamento perfeito que você espera
Essa imagem previsível
Formatada em significados
Tem nada disso
Há um som alto e meu corpo
Cantando
Preferindo as mãos no volante
Do que
Do que
Do que
Essa coisa que gagueja e chora
E pede pra voltar
E canta
Canta
Canta
Rema
Rema
Prefere as águas
E desce
Fundo
No meio da noite
Contando os dias pra lua cheia de explicações sobre as variáveis
As ondas
As inscrições
Que deixam a memória
Nessa alma polimorfa
Sedenta
Perambulando
Rosnando
Cantando
Por aí

quarta-feira, 23 de maio de 2018

A memoria alimenta a desrazão
A memoria é lenha pra razão
A memoria aparece em lágrimas e tremores assim de repente invade
Um sorriso no meio de tanta gente
Ela sabe a conta exata dos dias que foram esquecidos e quantas respostas deixaram de ser dadas
Imagens mnemicas
Imagens acusticas
Leva o bujão pra qualquer canto
Explode quando bem quer

terça-feira, 22 de maio de 2018

Vamos voltar pra casa. O apetite precisa ser mantido e a comida ser feita pelas próprias mãos. Quando se tem que explicar o amor, já deixou de ser amor. Quem sabe como amar e mudar as coisas? Como amar e assim mudar as coisas? Mudar de movimentar as coisas, de plantar a planta, de calar o indizível desse sentimento e seguir, construindo, alterando. Qual o nome disso senão trabalho?

sábado, 19 de maio de 2018

Os olhos não abriram mas a consciência foi chamada por uma vibração intermitente
Uma digital no ecrã
Uma voz mais que aprazível começa a ecoar
As cegonhas
Os castelos
Os flamingos
As rolhas todas do mundo
Os dispositivos do autocarro
O amigo
Os estudos
A justiça
A igreja
O suicídio
Os cavalos

E eu
E você
E a voz
Minha voz
Sua voz

A pausa
O abastecimento
O perigo
Até já
Os olhos abrem e comungam com a consciência pela luz porque é dia
Muitas digitais no ecrã
Silêncio
Vibração
E jorro

Há segurança diante do inseguro quando há amor e busca.

sexta-feira, 18 de maio de 2018

A felicidade é o amor bem ali
Na praia seca
No cão escorado
No cigarro já apagado
Na ave
Nas pedras
Caçando
O silêncio
Bem dentro
A quentura do cão
O só estar
Bem ali
Ele chama pro ar
Surge a matilha

quarta-feira, 16 de maio de 2018

Eu posso ir à tona com você? Posso ir? Um dia eu irei à tona com você? Você vem? Há um engano? Você está mesmo aí? Por favor, seja cauteloso, me queira bem. Quero ir à tona com você. Sei lá. Vamos?
Ceticismo perrônico e budismo. Hoje respingou em mim. Não seria eu se não fossem eles. Há puta. Eu puta.
Hoje eu estudei. Hoje eu estudei e trabalhei. Hoje eu estudei, trabalhei e iniciei uma produção de um evento. Mais um evento. Eu me pergunto agora se tudo isso é a mesma coisa hoje. Pra aquilo ficar em paz. Hoje eu também expus o meu pensamento íntimo e fui advertida do e se a frustração. Há frustração. Há uma metralhadora engatilhada em minhas mãos. Talvez eu esteja infeccionando novamente hoje.

domingo, 13 de maio de 2018

Quando não se apega em um
Um é o todo
Se joga no mundo
De todos
Se a âncora é um todo
Muito gulosa
Gosta de viver

sexta-feira, 11 de maio de 2018

AMO-TE AMO: uma história entre dois pontos no mundo.

No Future

Eu quero escutar um eu te amo. Eu quero dizer um eu te amo pra quem me disser esse um eu te amo. Acontece, mas é segredo. Um delírio do amor. As palavras eu te amo são o delírio por si só. Sozinho. Quieto. Falso. Verdadeiro. Quando a distância entre dois pontos é unida com eu te amo é muito bom. Existe futuro? Eu te amo.

quinta-feira, 10 de maio de 2018

Você diz pra eu observar a minha fala cujo assunto é ela. Recorrentemente ela. Isso mexe comigo, doutor. Os pensamentos craquelam todo santo dia. Os olhos ardem constantemente. Agora lacrimejam. Estou com o posso nada, o leão e a criança. E você? Está tudo muito claro, doutor. O que quer viver sem pensar nela? Eu não vivo sem ela. Tampouco você. Vê? E aquele caminhão que você foi obrigado a ver por baixo e de lá atestar ela? Isso me ajuda a viver, doutor. O correio me entrega livros,  eu penso em promover saúde e realizar projetos, desejo atravessar o oceano Atlântico. Com ela, doutor. Sem ela eu não sou.
Essa agonia sentida enquanto eu respiro o ar imaginariamente escasso, o passeio com o cão de guarda guiado pelo estrangulador, o chamado surdo pra que os olhos cerrem o dia que findou. Vê? É tudo dela. A vida só existe porque ela permite, doutor. Você bem sabe. Está há meses sonhando em subir aos ceus num canarinho. Então me diga, doutor. Quem vai lhe proporcionar essa viagem senão ela?

terça-feira, 8 de maio de 2018

Se ela sempre me olhar assim
E deixar que eu me deite na cama ao seu lado
Deslizando as minhas mãos por todo o seu corpo
Até que o seu sono chegue
Se ela sempre responder as minhas perguntas no dia seguinte
E caminhar pela praia no horário marcado
Devolverei a sua mochila
Vazia
Mochila sem pertences
Vazia
Se ela atravessar o oceano
E voltar sempre
Vazia
Eu abrirei a porta do carro pra ela entrar
Trabalharei dia e noite em mergulhos profundos
Cuidarei dos cães
Criaremos juntos um novo móvel
Se ela sempre
Vazia
Até a morte
Chegar

quinta-feira, 19 de abril de 2018

Você já sabe o que vai além da fantasia
Um dia
Outro dia
Mais um dia
Você já sabe que além da fantasia nada resta
De um dia
Depois outro dia
Mais um dia
No meio da fantasia você sabe o que há
Um dia eu e você
Outro dia sem eu e você
Depois você com ela
Só dela
Sempre dela
Mais muitos dias

Saber o que está além da fantasia
Da terra firme
Do outro lado do oceano
É pra poucos, Comandante
Poucos ouvidos pra fantasia
Muitos delírios
E alguma agonia

terça-feira, 17 de abril de 2018

Há algumas noites elas me protegem o sono
Juntas no mar, na praia, brincávamos nas poças quentes
Mergulhos e jacarés
E saudade do que nem se pensava que estava por vir
No quarto, os móveis imutáveis, agora desengastados por não sei quem, elas promoviam uma nova arrumação
Isso era sempre um feito meu
Surpreendida, observei tudo lá de cima, onde eu fugia das brigas, onde elas nunca queriam ficar
Agora o sino da minha aldeia adotada me informa que mais uma hora vai começar a passar
E que muitas horas desse dia já morreram
E o quanto é triste ver chorar enquanto come
Aquela que estava protegida
Por elas enquanto dormia

sexta-feira, 13 de abril de 2018

O nada enquanto nada é muita coisa.

Agora é a hora. Basta usar a matemática. É tudo pra depois da morte. A vida é muito curta. Quase duas horas. Tenho me sentido cada vez mais sozinha. Essa coisa de cantar é um bem e um mal. Sinto apenas que sou um instrumento de motivação alheio. Me falta objetivo, projetos, razão de ser. Vou pra análise, às vezes choro, às vezes me vejo bem, bem como todo mundo acha que é bem. Mas em mim é tudo o contrário. Minha voz está imensa, afinada, todo dia eu trabalho.

["Tenho tido dois pensamentos sobre isso: se isso nao é um sentimento dos dias de hoje e se não é uma forma depressiva para a qual nos endereçamos com certa frequência."]

Talvez as duas coisas. Aí eu pergunto: ora bolas, não era isso que você queria? Por que cargas d'água não se aquieta? E não tenho resposta. Estou chorando menos, acho que aprendendo a chorar por dentro. Tento sentir as cascas, não tem cascas, tem uma película, cheia de olhos, bocas voz, narinas.

["Como o cada um vai lidar com o desaparecimento da convivência para a focalização na produtividade (inclusive de si, haja visto as redes virtuais), é a questão pra mim."]

Estou solitária na rede virtual. É tudo uma coisa só. Todo mundo está morto. Que produtividade é essa? Nem convivência, nem produtividade. Tudo está morto. Sou de Peixes. A maré tá seca.

quarta-feira, 11 de abril de 2018

Eis que agora yo soy
un cão
La femme del la matilha
The namoradinha
And he put on me your jacket because the rain  start
Eis que sou quem tem cascas
Finas peles na alma
And he put your hand on me
Because he said
you are very pretty, mi amor. Yo precisava falar isso
Eis que sinto nada além de estar na matilha
E deixar que me guie ao mar
Mergulho
Sininho
Pés de cinderela
Bruxa
Pode ir correndo embora
Eis que eu reconheço
Acho que posso mergulhar

segunda-feira, 2 de abril de 2018

Musiquinha

Que é que se esconde lá?
Que é que se esconde lá atrás daquelas nuvens cinzas
Do mar de amar?
Que é que se esconde lá?
Que é que se esconde lá?
Que que se esconde lá atrás daquelas nuvens cinzas?
É um escândalo de luz de lua
Um escândalo de luz de lua no mar de amar
Que que se esconde lá?
Que que se esconde lá atrás daquelas nuvens cinzas do mar de amar?
Daqui posso gritar como se estivesse no deserto?
Daqui posso quase nada porque é apenas deserto
Com sorriso nos olhos
Lágrimas na boca
Nesse deserto tem cheiro de maresia
Enquanto muda a estação
Hoje eu encontrei com a loucura
Passei por ela na rua e sentada no passeio perguntei se ela ia bem
Mas que eu fosse pra longe com o cachorro
Me pediu, um Real, um cafezinho, um suco, um leite, qualquer coisa pra comer junto com o pão
Eu disse: nada tenho, loucura
Então ela insistiu
Um cafezinho
Eu me recolhi, coloquei a água no fogo
Um cafezinho
Levei à loucura e sentamos juntas no passeio, na sombra, do outro lado da rua
Enquanto ela me dizia que os estados unidos estavam em tudo aqui e logo seria tiro pra todo o lado
Quando perguntei o seu nome, me disse que era miséria
Mas o café estava sem açúcar!
Eu pedi pra descansar um pouco até resolver se iria atendar a mais um pedido dela
Todas as pessoas são assim. Encontros. As pessoas vão e vem, todo santo dia. Encontram-se e despedem-se. Bom dia e boa noite e até já ou nunca mais. As pessoas são encontros. Sem encontro não há salvação.

sábado, 31 de março de 2018

Tapa a boca de tristeza
Abre a boca de alegria
Tapa a boca de tristeza
Abre a boca e berra
Tapa a boca com comida
Abre a boca de tristeza
Tapa a boca
Tapa a boca
Tapa a boca
Engole o choro
Tapa a boca
Aperta os olhos
Fecha os olhos
Tapa a boca
Grita pra dentro
Chora pra dentro
Tapa a boca
Alguém bateu
E a boca à tapa todo dia

quarta-feira, 28 de março de 2018

E quando está tudo bem
Não está tudo bem
Ainda que tudo bem
Aqui vai quase tudo bem
E um pouquinho de medo
Pitada de ódio
A linha média a esgarçar
Por dentro
Por fora a casca a descamar
Por dentro
Choro pra não chorar
Sem saída
Sem silêncio
Uma gota, por favor
No meu ouvido
Agora no outro ouvido
Mais cinco horas
De corpo assentado
Muito tempo
Corpo morrido.
As moças sussuram nos meus vértices
Quando vai tudo bem
Eu aguento uma boa notícia
Tudo quase tudo bem
Nada bem
Quase tudo explodindo

domingo, 25 de março de 2018

Qual o plano que faço comigo?
Aonde está o íntimo do meu desejo
Aquele desgarrado do Outro
É insano
Caminhadas até à praia
Todo dia linha do horizonte
Ondinhas
Lembro de não sei onde
Ele veio
Ele foi-se
E nunca mais virá
Eu não vou
E nós não teremos um relacionamento
Ele disse
Eu morri
Estou morta
Qual o plano que faço comigo?
Um barco sem vela
Aqui e lá
No estômago e no devaneio
Mais lindo do mundo
É preciso atravessar
Sentir-me estrangeira
Bem naquele lugar onde é impossível voltar quando quiser
O peito travará
A mão retirará parte do óleo da face
Haverá um choro
Quiçá um berro ensurdecido nas espumas
Por ele mesmo
Uma terraplanagem
Um louco planeamento
Por mim mesma
Comigo
Enquanto busco algum sentido
Nesse ir e vir
Chacoalhar de emoções
É o único plano que faço comigo

quarta-feira, 21 de março de 2018

De bruços e mal súbito
Sucumbindo no meio da semana
Há algo de errado em mim
Que não tem cura
Ou cura breve
Com ele
Sem ele
Com presente
Sem futuro
Eu queria que os carros parassem e desligassem os faróis
Pronto
Agora o horizonte some
As estrelas que nunca vi
Reluzem
A vela azul me dá uma sombra
Lá estou eu
Ciumenta
Covarde
Inerte
Fumante
E Nelson Rodrigues
Falante


Então eu não sou puta
Porque ando triste
Ando triste por não ser puta
Penso em me matar
Diferentemente das putas
Felizes por serem como os poetas, as cantoras, as mães?
Puta é quando não tem jeito de não ser puta
Minha mãe me chamou de puta na maternidade
E pessoas gritam de alegria quando volta a luz

terça-feira, 20 de março de 2018

Homicídio
O cão que se faz presente
Corre muito
Pula um muro alto
Pula de volta
Fica
Aguarda o sinal vermelho
Junto
Atravessa
Muito bem

domingo, 18 de março de 2018

Olhe bem pra minha cara
A cor da minha pele
O tipo do meu cabelo
Meu olhar
Eu me pareço com ela
Pareço?
Eu tanto me pareço com ela
Tanto
Que eu segurei o meu choro ontem
O dia inteiro
Eu chorei por ela
Por me parecer tanto com ela
Eu nem a conhecia
Eu a conheci me olhando bem
Veja
É a cara
Quase igual
Igualzinha
Eu tanto me pareço com ela
Tanto
Que eu morri junto com ela
Minha selfie colou com a dela
Depois do dia do meu aniversário
Veja bem
Eu sou ela


quarta-feira, 14 de março de 2018

Deve ser tão difícil viver comigo que todo dia tem que cantar e tocar quando eu chego. A porta sempre fechada. Eu escrevo. Estamos enjaulados. Há um bicho que nem sabe que é selvagem e fica louco pra sair quando eu chego. Saímos juntos todas as vezes que ele sai. Ainda que eu lhe peça o tempo de um cigarro, ele rosna o seu estresse, anda pra lá e pra cá, querendo sair. Estamos todos presos. Até o outro lado do oceano está preso. Até a terra que se movimenta, já que disse que a terra não treme. Quanto menos poesia melhor? Sou uma eterna doente. Doente sem cura da solidão do ser animal.

segunda-feira, 12 de março de 2018

Assim
Bem assim
Com a bunda pro céu
Cotovelos na areia
Corpo boiando dentro da água salgada
Poça
Escurece
Aquele que de tudo reclama
Reclama
Lá atrás
Eu o chamo
Venha cá, venha cá
Ele fala, fala mas não vem
Num piscar de olhos pra trás
Lá vem ela
Imensa
Espumante
Assustadora
Possante
Mergulho
Barriga na terra
Onda por cima
De mim
Tudo certo
Natureza é
Bem
Assim

sexta-feira, 9 de março de 2018

Calo me

Um dia me calo
Pensarei bem baixinho
No silêncio
Todos serão esquecidos
O silêncio é pra todos serem esquecidos
Calar a voz do coração
Cheio de ódio
Jorro de amor
Por si

domingo, 4 de março de 2018

Leitura para sempre

Corpo fechado
Agora
Pra já
Corpo templo
Agora
Pra já
Corpo membrana
Rede do ser
Pra não pescar
Corpo juízo
Agora
Pra já
Fique longe desse corpo

domingo, 25 de fevereiro de 2018

Quando o mundo inteiro,
e se o mundo inteiro, olhar pra um espelho de mundo que não Marte... Para que tantas palavras se mal-estar? Para que tantos desejos?
Quando o mundo inteiro, e se o mundo inteiro, olhar pra um espelho de mundo do cão que vê e ladra, mas não morde, e se acostuma, e retrai a mira... Para que ser menino ou menina nesse mundo? Para que paga pau, bota pau, tira pau? Para que fila no banheiro?
Para que pagar horas?
Para que tanta ilusão?
Por que não as coisas mais simples da vida?
Eu sou péssima e ótima. Eu sou eclipses.
Eu sou mal-estar bem-me-quer.
Eu sinto quando doi no meu meio do peito.
Eu também sou você, ainda que não mire nesse espelho.

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

Na idade em que o mais coerente é esperar nada da vida. Nem musica, nem título, nem amigos. Ainda que nada não exista, até nesse não existir, esperar algo, alcançar algo, é nada. A morte é quem alivia a vida. Esperar nada é buscar algum alívio. Buscar nada também o é.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

É um rio sem direção desde que ele borrou o meu batom vermelho e nunca mais deixou. Deixa por alguns dias. Sempre volta. Até que a morte nos separe.
Quando vem a nuvem preta eu digo não quero viver nas sombras e ele vem correndo. Está tudo bagunçado mesmo a nuvem preta passageira descarregada. Vinte e quatro horas de nuvem passageira e um solitário no dedo indicador. Meteoro. Masturbação. Ilusão.
Eu tolero.
Tu toleras?
Ela tolera?

Nós toleramos.
Vós tolerais?
Elas toleram.

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Quadro casamento rasgado

O elevador tinha paredes de vidro. O teto começou a ameaçar estilhaçar. Estilhaçou sobre a minha cabeça e a de mais algumas pessoas que lá estavam. Havia uma mulher grávida. Eu assumi a posição de organizar a saída segura das pessoas. Eu seria a última a sair, ordenei que a mulher grávida saísse primeiro. Estávamos cientes do perigo, porém havia discernimento nas ações. O teto caía vagarosamente, transparente, todos abaixavam-se cautelosamente e protegiam como podiam os olhos.
De repente, uma cena de amor e sexo. Muito real. Muito intensa.
Um dia isso vai passar. Esse mal estar por todo o meu corpo. Hoje estou num limite. Posso matar alguém.
É porque não tem você
Eu posso ser feliz com outros
É porque não tem você
Eu posso ser feliz
É porque você vem
E comunicação se mede por cada vinda sua
Você sempre vem
É porque eu acredito
Sou para ti uma princesa
É porque você é o príncipe que não pode ser
Por que é?
Você me chama de amor
E esse é um chamado
É porque sou sua princesa e amo você,
Meu príncipe que não pode ser
Bem quietinha aí onde está
Sentadinha
Não, não
Aqui não!
Silêncio, agora
Preciso falar de novo?
Onde está não pode distensionar
Sim, sim
Pode nada de onde você está
Há uma nuvem de lágrimas sobre os meus olhos

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Pensei que de tão quieto estivesse dormindo. Seus flatos me diziam algo. A simbiose afetada mais do que eu imaginei. Seu pescoço estrangulando por quase meia hora enquanto eu cantava uma música na língua inglesa. Seu pescoço estrangulando enquanto alguém que não eu lhe fazia carinho, lhe carregava no colo. Eu estava feliz porque cumpríamos a viagem em paz, mas nada estava em paz. Quando eu toquei no seu corpo quis estrangular o outro corpo, aquele que eu mesmo alimentei, aquele outro corpo que consentiu, corroborou, permaneceu na inércia de se colocar cego diante do outro. Fiz uma pergunta por indignação, afinal, meu Deus!, estávamos na cena de um crime sem intenção de matar? Eu corri saltando do carro, entre a porta e a porta do outro lado minhas pernas deram apenas um passo largo. E o vômito de não suportar mais tanta falta de tato. Tanta falta de acuidade visual. Tanta falta de intenção de matar.

sábado, 17 de fevereiro de 2018

Você tem que criar
Casca
Cascão
Por baixo há
A nova fórmula da água
Você tem que criar
A membrana é uma
Gelatina
Geleia
Geral
No buraco da casca do cascão entra e sai luz
Chacras
É muito buraco
Em um único cascão
Você tem que criar
Para para de doer
Coração
Você tem que parar de si
Abrir
Sabe como faz?
Para abrir e parar de jorrar
As luzinhas de tantos buracos
Arrefece
Bomba de gás
Lacrimogêneo
Quando tudo é tão pouco

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

É menino de vez. Vez pelo rabo. Não deu certo. Vez pra pagar a conta do almoço, ejaculou na comanda e enquanto digitava a senha do cartão. Eu perguntei se toda vez teria que ser assim, porque tem algo de errado nisso.
Chegou um homem alto, preto, cujo dedo mindinho todo era feito de metal ouro. O nome foi recalcado, mas havia uma certeza de algo errado. Ele queria matar? Estava armado e, todos em perigo, abri a porta do casarão pra polícia entrar e livrar todos. Não livrou. Deixou o homem ir. Por quê? Porque o homem alegou que não queria matar, queria apenas abrir algumas cabeças pra ver os cérebros vivos funcionando. A tensão fica para sempre no casarão. Há uma ala médica. No outro dia, eu senti minha cara molhada com gotas que caiam do telhado. Era sangue. Também molhava a cara de outra pessoa pra certificar que era sangue. O homem havia voltado? Aberto cabeças no sótão? O telhado estava encharcado de sangue. A policia de novo convocada. Eu buscando o meu carro pra ir embora. Nunca achei. Nunca acharam o homem. Vieram com uma crianca, uma menina no colo, estava ferida e o meu susto achava que ela estava morta. Só ferida. O casarão foi evacuado por ordem da polícia. O homem poderia estar em qualquer lugar. Ali inclusive. Ele estava naquela menina lá fora, debochando porque construíram um casarão ao lado e o seu plano iria continuar.

terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

Na mania

Todo dia o cão pode
Morrer atropelado
Morrer envenenado
Morrer depois de uma briga
Todo dia ele corre
Some
Todo dia ele pode nunca mais voltar
Encontrei com uma moça
Vestida de preto na rua
De braços abertos
Dizendo bem alto
Você é o melhor cão do mundo

domingo, 11 de fevereiro de 2018

Baixe a cabeça
Um pouco mais
Mantenha o queixo alinhado ao chão
Alinhado quer dizer em uma mesma linha
Levante as vistas
Assim, olhe para o horizonte
Gire cento e oitenta graus
Pode girar trezentos e sessenta
Caminhe
Amigos são nomes de pessoas
Mãe também
Pai também
Só nomes
Siga

O cão dormindo balança o rabo
Parece alegria

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Minha cama cairá
Em breve deitarei na grama com o cachorro ao lado
Comendo o que ele comer
Bebendo da poça que ele encontrar
Às vezes numa roda de capoeira
Na roda sentada a cantar
Sem coleiras
Enforcador
Vamos andar pela cidade
Até a morte chegar
Ou de tanto frio
O coração parar

Rascunhos de rasgos cicatrizando

UMA BREVE ANÁLISE INSTITUCIONAL
 Instituição: psicanalítica
Vou falar da instituição psicanalítica. Falar sobre o que eu vivi nessa instituição chamadacConfraria dos Saberes, fundada no bairro de Ondina em Salvador no ano de 2006 pelos psicanalistaa Maria da Conceição Nobre e Eduardo Sande, egressos do Colégio de Psicanálise da Bahia. Trata-se de uma composição de análise institucional sobre a formação do psicanalista no Brasil..
De que vale um diploma de formação psicanalítica e a exigência do nível superior para oo exercíci do ofício? A biografia de uma das mais importantes psicanalistas pós-freudianas, Melanie Klein (1882-
1960), informa que ela “chegou a estudar arte e história na Universidade de Viena, mas não chegou a graduar-se”. Fez análise com Ferenczi, discípulo direto de Freud e fundou sua escola de psicanalise em Londres. Caminhando no que eu tenho construído como a minha linha
freudiana do tempo aparece, após Klein, o psicanalista argentino com formação kleiniana, Emilio Rodrigué. Residindo na Bahia, escreveu a biografia de Freud em três volumes publicada aqui no Brasil pela editora Escuta em 1995 – Sigmund Freud, O Século da Psicanálise (1895-1995), contribuindo à psicanalise local na formação de muitos psicanalistas, tal como Maria da Conceição Nobre, sua analisanda e minha analista. Eu, graduanda em psicologia, sou uma psicanalista?
A história da psicanalise apresenta na biografia de importantes psicanalistas, o rompimento com a instituição psicanalítica, aliado a fatores que geram esse rompimento – a repetição destes casos merece ser destacada. Muitas vezes é um rompimento no campo teórico, como
assistimos na famosa história de Freud e Jung ou de Freud e Ferenczi, o primeiro deserdado ee est último diagnosticado como psicótico. Eu costumo dizer que Jung é um psicanalista e que Ferenczi, além de psicanalista é o verdadeiro príncipe herdeiro. Os mais contemporâneos
Jacques Lacan e Françoise Dolto também não escaparam da repetição, ambos rejeitados pela IPA (International Psychoanalytical Association).
O caminho na psicanálise é de cada um.
A instituição psicanalítica é um agrupamento de psicanalistas, que “estudam e discutem casos clínicos, pensam sobre a teoria, produzem trabalhos clínicos e teóricos e vivem no divã o método que pretendem utilizar” (SALEME, 2008, p. 103), formando novos psicanalistas - pessoas em análise que se dispõem a estudar a teoria e desenvolver a prática. Freud diz que
um psicanalista é aquele que faz análise e estuda a teoria. Eu também costumo dizer: a teoria é o chão da análise, é ela quem dá os calços para que o analisando se reconheça em seu processo, cujo trabalho consiste na flutuação do discurso atraindo novos significantes para a alteração do caminho de desejo do sujeito. Concordo com SALEME (2008, p.119): “O analistaana pode compreender os conceitos psicanalíticos se puder reconhecê-los em si próprios”. Portanto o saber da teoria psicanalítica está intrinsicamente aliado à análise, e não há teoria psicanalítica sem a clínica psicanalítica. No Brasil. hoje existem instituições psicanalíticas emitindo diploma de formação de psicanalista. Um papel assinado por uma instituição psicanalítica reconhecendo a existência de
um psicanalista é o que faz um psicanalista? Um psicanalista no Brasil precisa somente ter nível superior para exercer o ofício, conforme a Classificação Brasileira de Ocupações, emitida pelo Ministério do Trabalho (2010). O Projeto de
Lei Nº 3.944/2000, de autoria de Eber Silva, versa em seu capítulo IV que quem fiscalizará e registrará as entidades serão os Conselhos Federal e Estadual de Medicina. O Projeto de Lei foi rejeitado por unanimidade pela Comissão de Seguridade Social e Família nesse mesmo ano e
está arquivado. O artigo de BALEEIRO apresenta um apanhado da mobilização nacional,desvelando que há um interesse da Sociedade Psicanalítica Ortodoxa do Brasil (uma sociedadesocied de direito privado) em ser pioneira na regulamentação da psicanálise. Segundo a autora:
“De qualquer maneira os grupos que atuam em psicanálise
começaram a se incomodar.
Nos parece que o projeto retira ursos das cavernas, mexe com
vaidades, une facções,
promove discussões.” (BALEEIRO, 2001)
Eu, diplomada em nível médio profissionalizante desde 2000, sou uma psicanalista.
Passei a ser membro da Confraria dos Saberes em 2006. Fiz análise com Maria da Conceição
Nobre e por ela fui convidada a ingressar no grupo. Leituras, roda de discussões, eventos
filosóficos, estatuto de formação de psicanalise, atendimentos, testagens de inovações
técnicas tal qual dispositivo nomeado como “mundofreudiano”, apresentação de casos
clínicos, coordenação de grupos de estudos – fui instituída psicanalista por mim e pelos meus
pares dentro de uma organização.
Porém a normopatia esteve lá. Este termo foi encontrado em minha leitura do livro de Maria
Helena Saleme, cujo título é “a normopatia na formação do analista”, publicado em São Paulo
pela editora Escuta, em 2008, com prefácio de Joel Birman. Ao trazer sobre as repetições
sintomáticas dentro da instituição psicanalítica, esclareceu-me sobre os entraves vividos na
minha formação até a minha saída da organização em 2015, com condução às reflexões sobre
a instituição – a hipótese da autora “é de que as formações psicanalíticas inserem o analista
em formação em uma montagem perversa que transforma a criatividade em normopatia”
(p.105)
Quando da criatividade, não atende mais à instituição o formando. A autora traz que a
alteridade é posta de lado dentro da instituição pelo jogo de poder, impedindo a criação, o que
me leva a supor que isso se refere não somente ao “enrijecimento da teoria psicanalítica e o
advento das instituições psicanalíticas” (p.103), mas também a questões de extimidade
(conteúdos do setting analítico que vazam para o ambiente externo) e contratransferência (manifestação do inconsciente na análise) na instituição, haja vista que os psicanalistas em
formação geralmente são atendidos por psicanalistas do próprio grupo. Então há um convívio.
Eu o vivi até por sete anos dentro da instituição.
“A psicanálise não é uma questão de ensino e sim de
‘transmissão’. A transmissão da psicanálise se passa pela
identificação com a postura ética de outros analistas. A teoria
está escrita, alguém pode conhecer todos os livros escritos sobre o
assunto e não será, por isso, um psicanalista. A psicanálise possui
uma ética e uma liberdade de pensar que se contamina e é
transmitida na convivência com o psicanalista quando ele mostra
como ouve e como se posiciona frente às questões. A transmissão
se dá no contágio. É por isso que o aumento de regulamentos e de
critérios burocráticos não traz garantia nenhuma. Ao contrário
(...) transmite algo diverso do que se poderia chamar psicanálise.”
(SALEME, 2008, p. 103)
Atravessar as questões de uma instituição psicanalítica requer um debruçamento sobre o que
é um psicanalista, passando pelo entendimento de que um psicanalista se faz psicanalista no
divã, no encontro com o seu desejo, manifestando a sua singularidade, a sua arte, a sua
política, perfazendo caminho pelo chão da teoria freudiana.
“Justamente porque a falta-a-ser, que coloca o sujeito em
movimento de transformação no decurso da própria análise,
muito provavelmente, o colocará assumindo possíveis autorias
reflexivas e técnicas a partir de suas flutuações, abrindo “chãos”
tão singulares quanto seu próprio percurso como analisante, ou
seja, novas perspectivas teóricas e testagens práticas, como
ocorreu com os já citados Jung e Ferenczi. Sendo assim, a
psicanálise estaria muito mais para apoiar a falta-a-ser do sujeito,
pela via de sua criatividade, do que seu encerramento, comum
aos processos institucionalizantes, os quais tantas vezes tem
ocorrido, a efeito do enrijecimento normopático.” (EDUARDO
ROSA, 2016)1
 Entendo que essa análise coloca a própria psicanálise em questão.
Docente em Produção Cênica / ITEGO em Artes Basileu França
Psicólogo Clínico / Psicanálise
Life Coach / Membro da Sociedade Latino Americana de Coaching - SLAC
Doutorando em Artes Cênicas / PhD Candidate in Performing Arts
Universidade Federal da Bahia / Middlesex University London

Referências:
SALEME, Maria Helena. A normopatia na formação do analista. São Paulo: Escuta, 2008.
FREUD, Sigmund. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
Freud. Rio de Janeiro: IMAGO, 2006.
BRASIL, Ministério do Trabalho e Emprego. Classificação Brasileira de Ocupações: CBP, 3ª ed.
Brasília: MET, SPPE, 2010.
BALEEIRO, Maria Clarice. Sobre a regulamentação da psicanálise. Trabalho apresentado na XIII
Jornada do Círculo Psicanalítico da Bahia, novembro de 2001.
Biografia de Melanie Klein encontrada em: http://febrapsi.org.br/biografias/melanie-klein/

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Sou apenas um bicho de mangue. Fica ali entre a terra e o mar e se move com dificuldade. É bom manter a distância. Eu nem sei o que é o amor.

domingo, 4 de fevereiro de 2018

Ela acredita em seus casamentos

Quero sonhar com você

Amor
Acabei de despertar depois de um sonho bom. Eu estava em algum lugar de floresta, era como se eu fosse uma visitante. Um lugar de treinamento daqueles homens de guerrilha. Parecia uma volta ao tempo. Lá havia outras mulheres, eu ficaria no grupo delas, mas havia o homem lá, especial, era o meu homem. E eu me despedia dele pra ele ir pra floresta treinar e, enquanto eu desenvolvia minhas atividades, esperava ele retornar. Era uma atmosfera de muito amor entre nós dois.
O tom da pele dele era igual ao seu, as pernas fortes, parecidas com a suas, o que eu sentia perto dele, ao falar com ele... Tudo muito parecido. Muita paz, alto astral e desejo.

sábado, 3 de fevereiro de 2018

É um tipo de pele que sai andando por aí
Um tipo de pele recobrindo um quebra-cabeça transfigurado
Curvas, reentrâncias, corrugações, alucinações
De pele pela boca sempre ferida
Casquinha arrancada
Como um docinho que é mexido
Da pele
Rasga
A pele
E a boca continua lá

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Parece que fim
Aquilo que não começo
Parece que fim
Aquilo que não futuro
Parece que sim
Coisas cheias de não
Me toque
Parece que você
Acabou pra mim
Parece que sim
Parece que fim
Aquilo que você pouco quis alimentar
E matou
De fome
Parece que sim

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

A lua está linda
A lua está cheia
(Luna llena)
Assim igual aos seus cabelos
Muito cabelo
(Cheio demais)
É pra lua
Tome lua
Muitos cabelos

(Disseram-me Raíssa e Evelyn)
Hoje eu andei no rio vermelho e encontrei duas meninas que rolaram na grama com o cão
Hoje eu andei no rio vermelho e a roda tocava é d'oxum e o cão latiu
Hoje eu andei no rio vermelho e pedi o violão pra tocar e o cão se livrou da coleira com habilidade
Hoje eu andei no rio vermelho e cantei em frente ao mar o cão sumiu
Hoje eu andei no rio vermelho e cantei e alguém disse que foi à marte enquanto isso
Estava lá macia
Monstruosa
Estava crack
No meu juízo
De menina que já não gostava da gueixa
Estava claro

Uma voz toda
Sabe como é uma voz toda?
Tem coisas que não podem ser
E nunca podem ser
Ficam no determinado lugar
E lá
Nesse mesmo lugar
Nem depois
Nunca serão

Cotovelos nos joelhos
Crânio ao chão
Num piscar de olhos
Um buraco
Enorme
Cheio
Vazio
Um poço
Pulsando no fundo
Translúcida
Corrente
Alguma coisa qualquer que pode ser

sábado, 27 de janeiro de 2018

Poesia áspera:

Cama
Música
Cachorro
Cigarro
Caetano
Espanhol
Pedaço de caixa de fósforos

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Bem nessa época de transumanos
de maus tratos e injúrias
Agora aqui bem de frente
Na cara da gente
Pau na cara
Mão no saco
Tira peito
Bota peito
Minha menininha
Minha coisinha tão bonitinha do pai
Fraldinhas descartáveis
Quero ver você subindo
Escada de marinheiro
Corta cabelo
Faixa no peito
Aperto de mão
Desapareça
Desapega
dança pra ver o fim do mundo
Do mal da morte
Do amor

domingo, 21 de janeiro de 2018

Lá trans

Sou viado
Eles me querem
Viados
Não toleram suas viadagens
E se vão
Me escondem para sempre
Segredo
Vadio
De viados
Muito mulherzinha
Até certo ponto
Troca sapato
Trocam corpos
Ando só
Viado

quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

Sei que vou chorar até as luzes tentarem cegar os meus olhos enquanto eu vejo você na penumbra
Um dia eu posso não chorar
Mas no outro dia eu choro

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Serei menos
Serei menos
Serei menos tudo
Serei menos menina
Menos menino
Serei menos mulher
Libidinosamente serei menos
Conterei com força tudo de mais
Serei menos impetuosa
Serei menos sensível
Serei mais uma
Mais aquela
Serei mansinha
Mais minha
Menos sua

De plástico

Só peço licença ao amor
Dedico o jorro
Da atenção
Espasmos de emoção
E mansidão

Só peço licença pra amar
Caminho sobre as cordas
Bamboleante
Abro as pernas
Na dança
Da solidão

Um rede no mar
Um vento sopra
E balanço
Uma trégua
Um descanso

Só para amar

domingo, 14 de janeiro de 2018

Um pedido perdido

Acorda
 Fala comigo
Antes que a noite troveje e todos recolham seus olhos, seus cabelos, seus dentes e aquele cheiro que se sente quando um corpo passa
Na noite
Acorde e coloque a minha voz pra escutar
A sua voz alimenta a minha alma enquanto eu acordo
Cheiro o dia
Habito a casa
Cubro-me de panos recortados
Ligo o carro
E uso minhas digitais
Pra tocar o mundo
Onde ninguém sabe de nada
Todo mundo sabe de tudo
O certo é o sim não
Acorde pra mim
Desperte-me
Ajuda-me
A viver

sábado, 13 de janeiro de 2018

Nos dias de hoje

Acabou com tudo quando eu lhe vi de costas
Eu digo a verdade
Mal me quer
Não me quer
Vi uma mulher velha
A bunda de minha avó branca
E manca
À frente tudo bem
Boca, pêlo, pênis
Língua sedenta
Pela mente o que bem lhe convém
Eu lhe convenho
A todo momento
Eu lhe chamo
Quando convier




Quanto mais eu estiver na solidão
Mais eu vou poder
[cão late]
Falar aos outros
Sobre ela
Que ela doi
Que é o corte pra nunca mais
Que é um cão correndo
[Cão late]
Latindo
Que ela só tem a morte
É a única coisa que ela tem
[Cão arpeja]
E alguma arte
[Cão late]
E alguma arte





Do que eu quero muito a vida me dá pouco
Vai ver que o pouco da vida
É o muito da vida

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

A gata extraordinária
O supra sumo
Um caminhão cheio de areia
Com muita areia
Uma rockstar
Um quiabo
Um filho
Um cachorro
Um carro
Um emprego

Eu vejo pessoas em prisões sentimentais
Eu vejo pessoas quaisquer
Eu vejo muita solidão

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Pra não jogar tão pouco fora

Era pra não brincar com fogo
Era pra pular a fogueira
Era pra não ficar triste
Era pra erva inspirar
Era pra rede balançar
O inacabado
O descontinuado
O interrompido
O indesejado
E assim findar
O que era pra não ter sido
Eu fico assim
A menina baiana
O menina baiana
A o a o a o a o

A-O Menina baiana

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Quando eu tinha sono mas não tinha nada, encontrei barros. Barros perguntou o que eu desejava pra minha vida e eu disse que queria viver em família, trabalhar, criar cachorros. Barros disse que eu só pensei em mim com esses pensamentos. Perguntou onde estava o próximo. Na música. Naquele vazio onde ela toca. Só ali.

domingo, 7 de janeiro de 2018

No jogo de face oculta
É bom falar com voz
Bainhas dilatadas no grave
Fluidos carnais
Encontro casual
Sala
Sexual
Virtual
Imortal
E voz basta
Call me
Call me
Traga-me um pouco d'água
Está chovendo aí
O sol brilhando aqui

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

A minha Bahia

Tem a água que me cerca
Eu dentro dela
Estou entre o mar e a terra

No fundo ela
Me guarda
No meio ela
Me açoita

Pede desculpas
Baía de mim
Diz que me ama
Bahia
Sorria
Sofria
Chovia

Deixe que falem que é impossível viver assim
Aqui
Lá fora é ilusão
De baía
Terremotos
Furacão
Vulcão
Frustração
Qualquer língua enfiada na boca podem chamar de beijo de língua
Mas eu sou saliva de você
Bahia
Converse o que quiser comigo
Você é o meu lugar
O amor é quando tudo seca. O mesmo para o ódio.