sábado, 31 de março de 2018

Tapa a boca de tristeza
Abre a boca de alegria
Tapa a boca de tristeza
Abre a boca e berra
Tapa a boca com comida
Abre a boca de tristeza
Tapa a boca
Tapa a boca
Tapa a boca
Engole o choro
Tapa a boca
Aperta os olhos
Fecha os olhos
Tapa a boca
Grita pra dentro
Chora pra dentro
Tapa a boca
Alguém bateu
E a boca à tapa todo dia

quarta-feira, 28 de março de 2018

E quando está tudo bem
Não está tudo bem
Ainda que tudo bem
Aqui vai quase tudo bem
E um pouquinho de medo
Pitada de ódio
A linha média a esgarçar
Por dentro
Por fora a casca a descamar
Por dentro
Choro pra não chorar
Sem saída
Sem silêncio
Uma gota, por favor
No meu ouvido
Agora no outro ouvido
Mais cinco horas
De corpo assentado
Muito tempo
Corpo morrido.
As moças sussuram nos meus vértices
Quando vai tudo bem
Eu aguento uma boa notícia
Tudo quase tudo bem
Nada bem
Quase tudo explodindo

domingo, 25 de março de 2018

Qual o plano que faço comigo?
Aonde está o íntimo do meu desejo
Aquele desgarrado do Outro
É insano
Caminhadas até à praia
Todo dia linha do horizonte
Ondinhas
Lembro de não sei onde
Ele veio
Ele foi-se
E nunca mais virá
Eu não vou
E nós não teremos um relacionamento
Ele disse
Eu morri
Estou morta
Qual o plano que faço comigo?
Um barco sem vela
Aqui e lá
No estômago e no devaneio
Mais lindo do mundo
É preciso atravessar
Sentir-me estrangeira
Bem naquele lugar onde é impossível voltar quando quiser
O peito travará
A mão retirará parte do óleo da face
Haverá um choro
Quiçá um berro ensurdecido nas espumas
Por ele mesmo
Uma terraplanagem
Um louco planeamento
Por mim mesma
Comigo
Enquanto busco algum sentido
Nesse ir e vir
Chacoalhar de emoções
É o único plano que faço comigo

quarta-feira, 21 de março de 2018

De bruços e mal súbito
Sucumbindo no meio da semana
Há algo de errado em mim
Que não tem cura
Ou cura breve
Com ele
Sem ele
Com presente
Sem futuro
Eu queria que os carros parassem e desligassem os faróis
Pronto
Agora o horizonte some
As estrelas que nunca vi
Reluzem
A vela azul me dá uma sombra
Lá estou eu
Ciumenta
Covarde
Inerte
Fumante
E Nelson Rodrigues
Falante


Então eu não sou puta
Porque ando triste
Ando triste por não ser puta
Penso em me matar
Diferentemente das putas
Felizes por serem como os poetas, as cantoras, as mães?
Puta é quando não tem jeito de não ser puta
Minha mãe me chamou de puta na maternidade
E pessoas gritam de alegria quando volta a luz

terça-feira, 20 de março de 2018

Homicídio
O cão que se faz presente
Corre muito
Pula um muro alto
Pula de volta
Fica
Aguarda o sinal vermelho
Junto
Atravessa
Muito bem

domingo, 18 de março de 2018

Olhe bem pra minha cara
A cor da minha pele
O tipo do meu cabelo
Meu olhar
Eu me pareço com ela
Pareço?
Eu tanto me pareço com ela
Tanto
Que eu segurei o meu choro ontem
O dia inteiro
Eu chorei por ela
Por me parecer tanto com ela
Eu nem a conhecia
Eu a conheci me olhando bem
Veja
É a cara
Quase igual
Igualzinha
Eu tanto me pareço com ela
Tanto
Que eu morri junto com ela
Minha selfie colou com a dela
Depois do dia do meu aniversário
Veja bem
Eu sou ela


quarta-feira, 14 de março de 2018

Deve ser tão difícil viver comigo que todo dia tem que cantar e tocar quando eu chego. A porta sempre fechada. Eu escrevo. Estamos enjaulados. Há um bicho que nem sabe que é selvagem e fica louco pra sair quando eu chego. Saímos juntos todas as vezes que ele sai. Ainda que eu lhe peça o tempo de um cigarro, ele rosna o seu estresse, anda pra lá e pra cá, querendo sair. Estamos todos presos. Até o outro lado do oceano está preso. Até a terra que se movimenta, já que disse que a terra não treme. Quanto menos poesia melhor? Sou uma eterna doente. Doente sem cura da solidão do ser animal.

segunda-feira, 12 de março de 2018

Assim
Bem assim
Com a bunda pro céu
Cotovelos na areia
Corpo boiando dentro da água salgada
Poça
Escurece
Aquele que de tudo reclama
Reclama
Lá atrás
Eu o chamo
Venha cá, venha cá
Ele fala, fala mas não vem
Num piscar de olhos pra trás
Lá vem ela
Imensa
Espumante
Assustadora
Possante
Mergulho
Barriga na terra
Onda por cima
De mim
Tudo certo
Natureza é
Bem
Assim

sexta-feira, 9 de março de 2018

Calo me

Um dia me calo
Pensarei bem baixinho
No silêncio
Todos serão esquecidos
O silêncio é pra todos serem esquecidos
Calar a voz do coração
Cheio de ódio
Jorro de amor
Por si

domingo, 4 de março de 2018

Leitura para sempre

Corpo fechado
Agora
Pra já
Corpo templo
Agora
Pra já
Corpo membrana
Rede do ser
Pra não pescar
Corpo juízo
Agora
Pra já
Fique longe desse corpo