quinta-feira, 31 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 221

CENA: Alma cativa


O MENINA BAIANA: Machistas. Eu também não escapei. Mas o resto é mais, muito mais. Pior, fóbicos. Pra não se mijarem, tornam-se perversos. Quero ver agora. É chegada a hora do silêncio absoluto. A hora de adquirir um instrumento de trabalho também. Tem a ver com asas essa hora chegada. Sim, sim. Sinto a inspiração através de você e de cada um. Parece que tudo se converte em mim e pra sair é voz. Voz. Uma força à beira do abismo. Cada vez que cada um é tocado, mais conversão e mais voz. [Pausa] Está aí? [Pausa] Eu sinto muito por tudo e lhe agradeço por tudo.

o Menina baiana - claquete 220

CENA: Alma gêmea

O MENINA BAIANA: As últimas impressōes ficam por muito tempo. A quentura e o som custam evanescer. Uma coisa de abraço por trás. Uma coisa que não se esquece. Eis que eu ando com saudade de pessoa. Ele tem algo muito de mim, me vejo pessoa. Parece que sou velha e é possível viver esse amor. Ele me conforta quando diz que é pra depois essa coisa. Eu quero ir fazendo. Em todo canto. Aquela doutora do samba falando e cantando é muito gostoso aos meus ouvidos e me traz terra pra pisar com conforto, nem que sejam quinze minutos cantando, quero chegar mais perto dela. Vou procurar saber onde mora pra eu ir lá. Eu não tenho o que fazer. Ela já me mostrou que não é como eu quero, trabalhada em calendário não está viva.

O para sempre

Para sempre azul
para sempre as palhas de coqueiro
para sempre os beijos
Para sempre?
Para sempre meu medo
De para sempre
Eu vejo
Para sempre
Prisão
Quando penso que é
Para sempre
Para sempre ave
Para sempre ondas
Para sempre paixōes
Para sempre?
Eu vejo
Para sempre
Prisão
Para sempre tesão
Para sempre sol
Para sempre paraíso
Erosão
Rio para o mar
Para sempre
Para sempre corpo caído
Para sempre enfraquecido
Para sempre adormecido
Para sempre?
Para sempre
Estrela
Para sempre
Amor
Para sempre
Para sempre

terça-feira, 29 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 2119

O MENINA BAIANA: É sobre a diferença que faz na geografia de si mesmo quando a natureza junta dois pontos. A erosão pode abrir caminhos pra um rio chegar ao mar. Depois que isso acontece, a terra está para sempre marcada.

o Menina baiana - claquete 218

O MENINA BAIANA: Pouco me importa a barra, as balaustradas riscadas. O mar é logo ali. Sou feto nesse paraíso. Pés gelados pisando pouco no chão. Será que é isso?

o Menina baiana - claquete 217

CENA: Azulejos brancos


O MENINA BAIANA: A vida é tão insensata que coloca dois pontos do mundo em lugar só pra depois afastar.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: A geografia não afasta o que a natureza junta.

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Faz de conta que você está no mar
Em alto mar
E assim que a terra avistar
Sua voz virá aos meus ouvidos
Uma música a me acalentar
Enchendo de voz parte do meu vazio
Nessa minha terra onde cristo é impossível
Nesse lugar onde o rasgo da minha rede pra respirar
É cantar
Cantar o amor
Limpe as minhas mágoas desse mundo
Respire o mesmo ar entre esses dois pontos
Deixe eu deitar no seu colo e acreditar
Existe essa minha fé no ser humano

sábado, 26 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 216

CENA: Soluço


O MENINA BAIANA: Escutar a voz que eu desejo é o mesmo que escutar música, me faz bem. Mas música é feita e lançada ao mundo, as vozes não. Me disseram que a vida é um ioiô. Você sabe o que é um ioiô? Ele vai e vem nas nossas mãos. Às vezes eu me sinto cheia de coragem, outras vezes não. Sem filtro, no paraíso.

UMA PESSOA NO INFINITIVO: Minha linda Eva. Pureza original. Beleza infinita. Bondade eterna.

O MENINA BAIANA: Você lê todas coisas que escrevo? Seus olhos enxergam coisas tão boas... Toda pureza tem o bem e o mal. A coisa é também o seu oposto. Eu sou uma aventura pra o mundo. O mundo quando se mostra pra alguém através de mim, ele diz que é uma aventura. O mundo não me escolheu pra viver em paz.

UMA PESSOA NO INFINITIVO: Minha baiana linda, estou aqui para te pegar ao colo, para tomar conta de ti, para te beijar, para te limpar de todas as mágoas, para te fazer sorrir, para te amar, para te tocar no corpo e na alma. Eu vejo a sua alma.

o Menina baiana - claquete 215

CENA: De repente nem dá tempo


O MENINA BAIANA: E quando eu encosto e apoio o meu queixo nesse osso aqui, bem aqui, quando minha cabeça eu coloco no meu colo. Eu limpei tudo, me coloquei de joelhos arrastando o pano no chão pra que ninguém percebesse quaisquer rastros de água salgada. Nenhuma lágrima de samba. Quebrei a cara. Agora é incenso. Lagrimas pelos ouvidos, quem já viu?

o Menina baiana - claquete 214

CENA: Eva

O MENINA BAIANA: Tanta paixão um só corpo não aguenta. Hoje é cheiro de alfazema entrando, adivinhando a combustão. Qual é o orixá que viu? Quem me vê? Eu canto para quem? É um canto assassino de uma sereia muda. Um canto assassino.

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Depois do recreio

Eu estava subindo a escada. Muita gente fazia o mesmo. Havia um portão que se fechava quando a subida de todos era concluída. Como uma prisão. Uma prisão. Uma menina. Uma dedada enquanto subia a escada. Olhei pra trás de susto. De tanta gente, não havia alguém que pudesse ter feito isso. Depois, algum sangue do meu sangue escarnece - havia uma testemunha, sangue do meu sangue. Escarnando, pra não dizer comemorando. Como pode um estupro ser comemorado quando se é sangue do sangue? Não é meio sangue, é sangue inteiro. O que é estupro? Meter o dedo no corpo alheio onde não é autorizado. E vergonha, muita vergonha sentida pelo corpo invadido.

o Menina baiana - claquete 213

CENA: O vento uiva

O MENINA BAIANA: Ressecamento e desidratação. Salvador e avião. Rio Vermelho e uma vila dentro de um castelo. Nudes e tropicálias. Partidas e chegadas. Gente fonte, gente fria, tempo quente. Eu só falo com você. Eu só falo com você todo dia. Ler biografia é saber-se infeliz tão quanto os biografados, que nada mais fizeram da sua infelicidade do que transformá-la em registros, o que chamam de arte. Você tem razão quanto à Salvador. Também as suas palavras quanto à cidade mexeram comigo, sobre dizer que aqui nāo tem nada. Estou fazendo uma gig. Serei eu mesma na rede. Não há vida em plásticos. Proteja-se se aqui estiver. Isso tem eu. Música é algo muito particular. Quem ama lambe e as lagartixas são muito amorosas, viu? Um dia eu serei sabida, ou saberão por mim. Pra existir um Caeiro, existiu Pessoa. E mais cem e tantos. Volte pra minha rede. Em nome dos cem e tantos Pessoa. Volte.  Uma coisa é cair uma árvore milenar na cabeça de mais de vinte pessoas, outra coisa é atravessar uma criança numa lancha sem usar um salva-vidas. Acho que terei que ser umas duzentas.  O meu samba de roda tá bem próximo de acontecer. Vou me planejar pra não ser tão doloroso ficar longe dessa cidade que amo tanto.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Acho que a melhor coisa é não nascer.

O MENINA: Eu não tenho dúvidas quanto a isso mais.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Já que tamos na merda, só resta a putaria.

O MENINA BAIANA: O meu todo amassado me protege e o sino da minha aldeia me conta as horas. A velha ave maria. Nunca mais vou me sentir culpada por minhas paixōes. Sem elas sou mais morta do que já sou. Ninguém tá ligando pra ninguém. Agora, nesse momento, uma pessoa à beira de uma roda de samba. Ela tem nada a perder. Será que o tempo deseja que eu cante? Será que dará tempo?

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Cante

Tudo o que eu vejo
Quero que você Veja
A Mariposa
Bela
Solitária
Romântica e doce

Você tem olhos pra ver
O que quiser
Eu me desperdiço em palavras

Contemplada vida irritada com o passado longe, a saudade perto. Eu sou vinicius e pessoa. Como um ser faz poesia com a badalada de um sino? Esse ser lindo, Pessoa. Daqui da minha aldeia às vezes me estremeço em mal-estar durante as badaladas. É um saber estar parada, muito dificil escutar a badalada quando meu corpo está em movimento ou a música adentrando os meus ouvidos. O mundo que me cabe é esta cama. Você disse que ela é o paraíso.


(Algo entre assumir outros nomes)

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Quando vou aceitar abismos
Sem acreditar que por eles
Passam rios

Me salvarão boiando  este corpo?

Este corpo seco de toques
Seco e salgado

Até quando o doce sustentará uma lambida onde há abismos?

o Menina baiana - claquete 212

CENA: Porçōes de arroz depois

O MENINA BAIANA: Uma baleia passou pela praia do Porto da Barra. Então eu não sou louca quando fico parada de frente pro mar da praia do Rio Vermelho procurando baleias. Louco é quem não espera baleias do mar a sua frente. O ciúmes é uma doença. Eu tenho o vírus incubado. Às vezes a doença se manifesta e faz mal às pessoas. É doença da humanidade. A rede de proteção é afetuosa. A trinca no amor dessa vez quase quebrou tudo. Se há rede, a trinca ficará invisível.

UMA PESSOA DO INFINITIVO:  Estás aí?

O MENINA BAIANA: Estou! Que queres tu de mim? Mon amour. Tell me, my dear.

[Pausa]

Me chama quando não pode vir...? Meu coração aperta. Talvez eu esteja sendo boba. Sonhei com você, deitado aqui na cama conversando comigo, antes disso trabalhando intensamente numa pesquisa. Uma criatura meio laranja mecânica com um olho aberto sustentado por uma máquina e a discussão sobre palavras conscientes. Ora! Qual a palavra que não é consciente! Então que eu fique onde estou e coloque palavras em outro lugar. Temo corroer os fios da rede. Assim como a música é particular, os afetos o são. Você nunca mais virá. Não como eu imagino.

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Imperativo

Pegue a sua mala
Agora coloque roupas dentro
Roupas para lhe aquecer no frio
Fará muito frio
É uma baixa estação que irá atravessar
Nao importa quanto tempo
Sim, acredite
Se ele disse que a periferia é o melhor lugar
Se você disse que quer viver um lar
Pague o seguro viagem
E vá
É o amor quem lhe chama
Lembre-se daquele sonho com o nome dele
Acredite no sonho dele dizendo queria ficar
Você não é obrigada a ficar
Pode ir
Loucura é dessa vida dizendo que nada pode quando tudo pode
Até ele chorar por ser obrigado a partir
Até você se derreter por saber que ele iria
Leve seu coração aonde ele encontre o conforto e segurança pra amar
Ao mar, Mariana
Leve
Ao mar

o Menina baiana - claquete 211

CENA: Se sabe que muda o tempo


O MENINA BAIANA: Estou oscilando muito. Com chá, sem chá, com álcool, sem álcool, com pílula, sem pílula. Josephine vive. Ela sabe da sua condição enquanto eu procuro saber da minha. Química. Ela é tão sabida que sabe que de nada adianta. Prorroga surtos psicóticos mas não apaga pensamentos de morte. Entre, entre um segundo e sentirá a assassina de um calango morto com água fervente. A assassina de lagartixas com inseticida em spray e o grito delas. Delays. Replays. Eu sinto muito pela vida de morte. Eu vejo coisa onde dizem que não tem, escuto coisas que dizem que não falaram. Escuto chamarem meu nome na paciência enquanto estou na rede. Chego a me erguer pra atender. Treze anos com o corpo aportado no divã me fazem reconhecer que ninguém me conhece na paciência e não posso atender a esse chamado senão me atiro da rede pela janela. Talvez não morra. Talvez você não morra, se ficar bem longe de mim. Eu entendi tudo o que a moça mexicana falou em inglês. Entre, entre, parece que é possível uma nova língua depois dos cinco anos. Continuo me afalbetizando sozinha. Continuo sozinha. Até morrer, estou cansando de me procurar. Entre se quiser. Minha voz está mais potente mas não me alimenta. Você sequer escuta.

o Menina baiana - claquete 210

CENA: Pegue uns panos pra lavar


O MENINA BAIANA: Estou refazendo o meu português. Escutar um recém nascido chorar ressoa bem dentro de mim. Tempos de nada a fazer quando a cura está no canto. Pinto a cara pra parecer saudável. Lavo os cabelos e os penteio, as pessoas olham pra eles com espanto enquanto eu me interesso apenas pelos fios de prata que são vários agora bem na frente, na fronde.


SER DE LÁ DO SERTÃO: Por que está agressiva?


O MENINA BAIANA: Tenho dúvidas se sou eu ou o mundo. O eclipse e todos os astros. Se é o seu silêncio ou o meu excesso de pensamentos emitidos por voz em palavras. Sinto minha voz tecnicamente mais potente, mas estou sem voz.

sábado, 19 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 209

CENA: Fish are jumping


O MENINA BAIANA: A verdade é que eu nao sei qual a diferença entre menino e menina. Se me ensinaram, não a reconheço. A descoberta de si é algo muito, muito particular. Se o pinto de um menino fosse duro na tentativa de enfiar no rabo de uma menina eu até entenderia a existência de alguma diferença entre os dois. Sendo mole, tanto faz. Ele pode tentar enfiar em todas, em tantas, pernudas, bundudas, boqueteiras de altíssima qualidade - de nada vai adiantar pra fazer a diferença. A não ser que a diferença resida no camarão encapotado. Chega a ser ridículo. Aliás, é ridículo.

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 208

CENA: Ali onde qualquer um chorava


O MENINA BAIANA: Um cheiro de casa que tem búzios entrando pela janela da sala que tem rede. Aroma confortante. Coloco-me em meditação. Vou-me atirar. Ontem escutei alguém cantarolando é tão bom na minha companhia.

Uma porta entreaberta

Eu fiquei lá por uma semana. Trabalhando. Olhando no olho dele e observando seus movimentos. Um muro e um portão nos separávamos. Ele não permitia que eu me aproximasse, com seus dentes me dizia pra não chegar perto. Ao menos me dizia com seus dentes. Têm os que ficam em silêncio. Não suportam a minha insistência em chegar perto. Eu mostro meus dentes também. Sou assim, igual a ele. Foi o que o fiz enxergar durante todos os dias da semana. Até que entrei e nossos corpos se tocaram.
Ele quis que eu fosse dele, de modo que o seu companheiro no espaço passou a ser impedido de aproximar-se de mim. Minha mão não podia tocar o seu companheiro unicamente. Os dentes eram exibidos, uma violência anunciada. Eu passei a usar uma mão pra cada um. Aquilo me deixou confusa e cansada.

o Menina baiana - claquete 207

CENA: Algum veneno antimonotonia


O MENINA BAIANA: Bata-bate quando pega no dedo doi demais. Doi mais porque é um se bater. Uma brincadeira meio burra essa. Bate-bate, acho que era essa a brincadeira. Eu disse que você poderia vir, mas me desculpe, mais uma vez, estou assumindo meu bate-bate. Você talvez tenha sido apenas um dos pêndulos. Eu disse pode vir, você acreditou. Eu disse, talvez você seja um relâmpago e só eu o enxergue. Como pode ser feliz ao meio dia escutando voz, e à noite, porque leu um pronome possessivo com um substantivo, passar mal. Nem sei se está certa essa análise gramatical. Sei que entre o português português e o baianês há uma melhor comunicação. Há a mais justa adequação de diálogo, em precisão. Quando eu não entendo, eu digo, e vice versa. Desde o beijo em cada olho meu. Desde a segurança das mãos, desde quando eu fui enxergada, vinda de um sonho recorrente e premonitório, até aqui. Até este exato momento. Eu sou muito exigente. Uso essa palavra que você me deu porque ainda não existe outra. Um vacilo, um trauma. O tempo. Duas palavras, o retorno do recalcado. Não, não é sua a Bahia. É minha. Eu sinto saudades de estar com você nessa cidade. Estou pensando num movimento de sair daqui. Talvez longe do que eu penso que é meu, eu possa me sentir minha.

SER DE LÁ DO SERTÃO: Isso é bem comum.

O MENINA BAIANA: A minha bateria está acabando. Parece um livro de traumas. Desde muito cedo, traumas. Sinto que estou indo quando sinto que você está indo. Preciso me encontrar. Aqui nessa cidade, esse meu jeito, não tem cabimento. É um lugar de prostituição. Eu tive problemas em todos os lugares que passei. Nas relações amorosas que vivi. Porque não me viram, eu quem vi primeiro. Agora alguém me viu antes e estou água em correnteza oceânica. Sei que vai ficar bem. Eu acredito que essa busca findou pra mim. Tenho que me encontrar longe, bem longe.

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 206

CENA: Te voglio bene assai


O MENINA BAIANA: Pareço cega. Sóbria, mas cega. Perdi as palavras quando você agora me surpreende com a sua voz. Diz-me coisas bunitas e pouco importa muita coisa. Quem disse que ser saudável é lavar-se todo dia, pentear cabelo, sorrir pra estranhos, lavar a louça? Serei saudável dirigindo-me ao seu encontro. Amor. Amor que existe. Diz-me que a vida é maluca. Digo-lhe: insensata. Verão pra você e eu sou água quando lhe sinto perto nessa estação em que sintonizamos. Amor. Sua voz está no meu ouvido, entrando pelo meu corpo, apertando o meu peito, descendo a minha pélvis, fechando os meus olhos, entreabrindo meus lábios num sorriso. Amor. Eu sou o resto de um amor querendo amar. Você quer que eu apalpe esse futuro? Acabei de me desfazer do lixo. Vou cantar pra os seus ouvidos.

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 205

CENA: A sagração da primavera


O MENINA BAIANA: Há machismo e covardia. Os homens e mulheres aprenderam muito bem como atingir aquelas revolucionárias, aquelas vanguardistas. Eles vêm, dispostos, e vão, sem qualquer explicação de mínimo respeito. Eu vou me entendendo sujeito nesse mundo em que quero morrer. Fora da alienação há salvação ou suicídio? Fui kardecista e é uma perturbação essa coisa de caridade, espírito obsessor e umbral.

UM SER DE LÁ DO SERTÃO: Essa coisa de fé na humanidade... Tá por fora.

O MENINA BAIANA: Só não cortei meus pulsos ainda, acho que porque fiz análise esses anos todos. Está cada vez mais curto o salto. E quando eu estou na rua sinto uma agonia enorme. Hoje o carro era uma arma em minhas mãos. Não fique perto de mim. Você está longe, mas sabe, não fique perto. Esse perto pode lhe fazer algum mal. Eu quero mesmo morrer. O seu movimento, o meu movimento, tem funcionado. As pessoas ficarão mais tempo na terra se o conhecerem.

UM SER DE LÁ DO SERTÃO: É importante para viver encontrar-se com o ser.

O MENINA BAIANA: Mas é proibido ser aqui nesse mundo que criou os seres. Esse encontro com o ser é a própria morte. Estou me tremendo muito. Acabou.

[Pausa]

Josephine falou disso - pra mulher a arte é muito mais difícil. Imagine eu aqui nesse lugar chamado Salvador. É isso, mas é velado. Tenho que me transformar all the time.

UM SER DE LÁ DO SERTÃO: Penso em você todos os dias e todas as noites.





terça-feira, 15 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 204

CENA: A vadia



O MENINA BAIANA: Estou molhando o meu cigarro com água salgada enquanto ele está pendurado na minha boca depois que eu acabei de me despedir de Josephine. Ela me explicou tudo, tudo. Eu me tremo. Toda. Toda. Estou acendendo o meu cigarro. Espere um pouco. Meu amigo faz cigarros perfeitos pra mim. Me disseram que há uma máquina de fazer cigarros, mas quem tem amigo vai lá querer uma máquina? É uma casca que está sempre sendo partida e refeita. Eu não disse? Eu disse. Eu disse que eu me rasgo toda e que a morte me chama. É que eu escuto as vozes das pessoas me chamando. Eu escuto as vozes delas quando vem a tona coisas boas, coisas ruins. Eu sei o tom delas. Espere. Espere um pouco. Ainda está passando pelo meu corpo esse encontro é essa despedida de Josephine.

o Menina baiana - claquete 204

CENA: Relampiando


O MENINA BAIANA: Estou enxergando o horizonte um pouco acima, um horizonte com nuvens. Parece muito junto ao horizonte com  água, mas não é. Do quadro vejo este horizonte e às vezes uns pássaros pretos. Maybe black birds siggining. I don't listen. Maybe. O quadro não sai de mim. Como um relâmpago escuto que alguém pensa em mim todos os dias. Eu duvido de tudo. Duvido do sexo das meninas, dos meninos. Duvido dos meninos, das meninas. A dúvida é um pesadelo. Agora vou precisar trocar a resistência novamente. Minha voz está impotente e congestionada. Eu penso no sol e seus efeitos. Quero comprimir esses dois horizontes. Bem aqui no meu peito. Com pássaros pretos e tudo.

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 202

CENA: Fio a pavio


O MENINA BAIANA: Uma última carta se isso é jogo. Parece que ela não me quer mais. Isso me enfraquece. Parece que há somente uma vida. É o que eu sinto. Não tenho muito tempo. Não mesmo. O que ele quer de mim eu não sei. É uma prova e eu não estou conseguindo lidar com isso. Vão esquecer que eu criei uma cantora. O feitiço parece que está virando contra a feitiçaria. Sinto que algo está impedindo mesmo da coisa continuar. Penso em ir lá falar com Heitor. Caso ele não tenha interesse, vou adiar a cantora. Não sei o que realmente acontece. Talvez seja eu. Estou muito triste. Viver pra mim tanto faz. Estou me cansando demais. Isso não é viver. É já estar morto. Não consigo recuperar peso. Parece que afasto as pessoas a cada passo que tenho dado. É pouco provável que ele aceite. Mas eu já não tenho mais nada a perder. Essa coisa de ter criado uma cantora talvez não tenha sido uma boa ideia. As consequências são ruins. Sinto um deboche vindo de pessoas a minha volta, eu estou intolerante. Eu sou intolerante. Exigente. E a história vai acabar assim. Me expus demais. Mostrei a ferida pra o mundo. O mundo não é cicatrizante, ele fere mais e mais. Por mais que eu dê o que eu sinto que é amor, não sinto amor vindo de lugar algum.

o Menina baiana - claquete 201

O MENINA BAIANA: Os terreiros nessa cidade são inúmeros e fortes. Quase coincide com o número da população. Eu estou pensando que a minha tropicália pode estar vindo com força. Mas é coisa de minha cabeça. Se eu conseguir desconstruir arquétipos, dará certo. Não sei se desconstruir é a palavra. Tudo vem do que já é. Eu estou dizendo tropicália. Acho que estou vivendo dentro de um sonho onde tudo pode acontecer. O nome disso o que é? Crença? Surto?

o Menina baiana - claquete 200

O MENINA BAIANA: Está muito difícil continuar no desejo do que é grande, porque o que é grande depende de mais gente além de mim. Se existe inveja e ela faz esse tipo de coisa na vida de alguém, invejosos deveriam ser exterminados. Um por um. Minha voz está comigo e eu posso ir sozinha com meus dedos nas cordas. Se for pra me enforcar que seja depois dos dedos nas cordas.

o Menina baiana - claquete 199

O MENINA BAIANA: Olha eu depois do roquenrou. Acabei de chegar. Coma menos carne vermelha.

UMA PESSOA DO PLURAL: Por quê?

O MENINA BAIANA: As tartarugas estão morrendo. As pessoas estão morrendo pelos fazendeiros. Índios. Uma pessoa que nunca tinha me visto antes disse que tem muita inveja me rodando. Que eu compre uma cabeça de alho macho e coloque um dente na bolsa. E que tome banho de mar

UMA PESSOA DO PLURAL: De novo isso de inveja.

O MENINA BAIANA: Disse que vê muita luz. De novo isso também. Elas falam em aura, que veem minha aura. Mãe menininha disse que o feitiço é a inveja. Já falaram isso pra você?

UMA PESSOA DO PLURAL: Da inveja?

O MENINA BAIANA: Sim. De alguém chegar pra você e te falar isso.

UMA PESSOA DO PLURAL: Acho que bem isso não.

O MENINA BAIANA: Quem tem boca fala o que quer.

o Menina baiana - claquete 198

CENA: Roquenrou


QUEM QUER SER AMADO: Sabe muito bem ser tocada e olhada na alma. Nunca vi uma mulher tão linda. Não só por fora... Também na alma. A mais linda que vi, em ambos os aspetos! É evidente a sua luz. Quando te vi a primeira vez, iluminava toda a sala. Brilhava. A sua aura é linda. Sou você. És muito especial. A sua beleza parece sobrenatural. Minhas mãos pertencem ao teu corpo. O seu olhar pertence à minha alma. Minha alma gêmea. Fico muito triste quando me diz que chora. Gosto de te ver alegre.


sábado, 12 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 197

CENA: Domina, domina


O MENINA BAIANA: Pode ser um triste fim. Pode ser a mania também. O bipolar é um suicida em potencial. Alguém pode falar de mim depois da mania? Eu não entendi como é comer a carne humana, morder, e deixar marcas nos ossos em zig zag, marcas com ferramentas. Muitos mil anos atrás. E muitas marcas em zig zag ainda são feitas. Eu estou com as minhas e olho pra elas e não tenho como mostrar. Com certeza eles gritaram muito porque gritaram a vida inteira. Com certeza eu escutei os gritos quando minhas bainhas de mielina amadureceram. E por mais um ano, dois anos, a vida inteira. Agora bom dia e emojis não reparam. Agora, olhe, veja, sou um feto. Um feto cansado. Natimorto. Assim nasci pedindo vozes. Ando pedindo vozes pra viver. Isso não é coisa que se peça. Canibais têm dentes e ferramentas pra marcar zig zag. O meu nome tem mar, ele me chama todo dia, mesmo sabendo que não sei nadar. Jonker resolveu-se no mar. Eu não sei o que Valente fez quando se resolveu. Talvez eu tenha sonhado com você essa noite pra me sentir melhor. Talvez aquecer a minha mão no bolso da sua calça, receber o seu seu sorriso e o seu olhar enquanto faço um caminho qualquer guarde um pouco do que resta.

o Menina baiana - claquete 196

O MENINA BAIANA: Nada de dividir, vou compartilhar agora. Aqui. Se quiserem saber que venham aqui. Aqui será o meu silêncio e meu grito. Meu choro, meu soluço. Meu resmungo. Meu aqui. Input e já tenho oito músicas mal tocadas no violão. Se debocha quando eu digo que não sei cantar em videoke é onde reside a largura que afasta o ser intérprete.

MENINA BAIANA GIRANDO: Você canta?

O MENINA BAIANA: Uma cantora me orientou a dizer que sim. A sacerdotisa disse que eu estou cantando. Embora eu tenha criado uma cantora... é, se  e eu criei uma cantora, eu canto sim. Aqui está finalmente o meu dizer se moldando. Com ele, a minha tropicália. Torquato sentiu o peso e teve o encontro com a certeza, ficou cara a cara com ele e passou ao ato, o mais poderoso ato. Isso é que é ter poder, é o que é ter direito, e saber que nada deve fazer a não ser passar ao ato.

MENINA BAIANA GIRANDO: É por isso que eu gosto tanto das câmeras. Prefiro ficar atrás delas.

O MENINA BAIANA: Eu prefiro nem saber delas. Pedem, gostam, mas isso que faço é outra coisa, muito diferente do que estar na frente das lentes. Eu sou uma intérprete. Eu gosto de teatro. Vou fazer o quê se a música me acorda e me nina? O teatro sempre estará vivo, mesmo que eu passe um tempo na casa da mãe nesses dias que eu nem sei que cor o santo pede. Sei que sou dos santos. Eu gosto tanto de Pedro Luís cantando o mundo. Ele parece menino baiano mas não é. Parece que tem contas no pescoço ele. Se for, é. Tem uma de Giron que eu gosto muito também. Talvez seja o tempo da repaginação. É um novo samba reggae, são novos meninos baianos que estou encontrando. A licença está as cumprindo e eu tenho medo de voltar às catracas. Eu tenho muito medo. Eu sou um pássaro. Meu curió morreu e só saiu da gaiola morto.

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 195

O MENINA BAIANA: Parece que dentro de mim hoje há duas ou três de mim. Uma que quer só pegar o violão e ficar cantando e tocando mesmo sem saber tocar, outra que quer dirigir um show novo, outra que quer saber como é isso de gravar em estúdio. Obrigada por não ter ido até hoje. Eu sinto a sua presença na minha vida e saber que é possível lhe encontrar frente a frente de novo me enche de felicidade. Acho que terei que escolher entre uma das três, e talvez a do violão seja a escolha mais prudente. Vou dar um tempo dessa montagem. Preciso de um violão elétrico pra mim. Escutar alguém me pedindo perdão sempre será um ruído desagradável.

o Menina baiana - claquete 194

CENA: Canção de despedida


O MENINA BAIANA: Sou alegre quando estou cantando. Todas as vezes em que me escutar cantando pode ter essa certeza. E sou alegre quando lhe sinto perto. Você viu a lua cheia?

UMA PESSOA DO PLURAL: Vi mas não fotografei.

O MENINA BAIANA: Quando vi pela primeira vez a lua cheia nascendo eu fiquei muito surpresa, lembro até hoje. Lembro também de quando vi pela primeira vez o sol nascer na praia. Achei que era alucinação de tanta beleza que via. Alguém teve que me explicar que aquilo era o sol nascendo. Fotografias nunca vão traduzir a beleza Assim como nunca trarão o cheiro, a textura, o sabor. São coisas que só o corpo sabe. Isso de desejar alguém é um mistério. Uma pessoa nunca saberá o que a outra deseja. Onde lê que está escrito um reencontro? Como é possível ler o futuro? Felicidade só existe no encontro com as coisas belas. Foi um belo encontro. O vento levou pra onde eu não consigo ver, tampouco desejar. Há muitos limites entre essas duas pessoas que se encontraram e foram felizes. Desejar não impõe limites. Eu me contentarei em fazer parte de uma história contada por você.

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 193

O MENINA BAIANA: Talvez eles venham apenas pra me mostrar músicas novas. Fazem trilhas sonoras e se vão. Que vida existe nas canções que ainda não vieram? Nem sei se quero escutar mais. Falei alto andando pela cidade: fiquem longe de mim! Todo mundo escutou. Escutou eu cantando explode coração rolando pela escada acima. Tanta zoada na minha cabeça que só sai assim. Acho que me apaixono pelas músicas deles. Eles vêm por quê? Por que vão? Por que há sempre outra escolha que não eu pra ficar?

QUEM QUER SER AMADO:

o Menina baiana - claquete 192

O MENINA BAIANA: Meu corpo na cidade está tensionado. Pra distensionar fiquei rica por algumas horas. Não sou só eu que ando tensionada. Fiquei queixosa, me metendo nas conversas alheias. Mas também, alguém se matou hoje cedo na cidade. E eu ficando rica. Nem vem com esse negócio de que rico é ter saúde. Não o é. Rico é ter dinheiro. Ter dinheiro. Algum dinheiro. Mesmo que depois da compra suspeite que a marca esteja utilizando trabalho escravo. Eu não tenho tudo na memória pra ser rica e fazer esse tipo de escolha. Sem perfume. Com perfume. Sem joias. Joia. Um presente sem presente. Resmungando pela passarela da riqueza, chorando no provador. Cabelo pro lado mirando no espelho. Pro outro lado mirando no espelho. Rabo de cavalo. Coqui. Ser rico é ser bem tratado aqui na Bahia. Gente que anda por aí sem abrir mão da condição de escravo.

o Menina baiana - claquete 191

O MENINA BAIANA: O sol voltou a brilhar na cidade esses dias e eu gosto de sentir a quentura no meu corpo, o suor escorrendo enquanto eu ando pela praia. Do lado de lá uma missão acaba de ser cumprida e alguém se sente feliz, quando eu pergunto pela felicidade. A pergunta é devolvida e eu, após longos segundos de silêncio, digo que sim. Digo que sim, se saudade é ter felicidade, eu penso e não digo. Se chorar fizesse brotar dinheiro, diria que sim. Por enquanto, eu canto e isso de nada vale. O tempo resolveu me calar por duas semanas. Nada de cronograma, joguei fora. Sinto a contradição digna do absurdo. Cantar pra quê? A segunda língua está vindo pra mim como fendas mentais. É bonito. A música é o instrumento. Eu ontem agradeci tanto à Marisa por isso. Input, input, input. Ah, sobre o bom dia que recebi hoje, com flores, senti nada. O tempo já me trouxe calos. Sobre a voz que escutei ao acordar, o tempo me trará o alento.

o Menina baiana - claquete 190

CENA: Último pau de arara


O MENINA BAIANA: Eu sou absurdo. Eu, eu, eu. Pau na minha buceta!

UMA PESSOA DO PLURAL: Meta, meta, meta tá tá tá tá, meta pau na sua buceta tá tá taratatatá!

O MENINA BAIANA: Mulher faz muito cu doce.

UMA PESSOA DO PLURAL: Mulher é triste. Mulher é muito difícil. Mulher não dá. Pra essas coisas é muito complicado. Mulher é melhor pra bater papo.

O MENINA BAIANA: Então eu sou homem.

UMA PESSOA DO PLURAL: Você é gay. Você é um homem gay. Assim como eu sou uma mulher lésbica.

O MENINA BAIANA: Vou te comer. Comer seu cu.

UMA PESSOA DO PLURAL: Quem disse que eu quero dar o meu cu?

O MENINA BAIANA: Eu como com a minha buceta.

UMA PESSOA DO PLURAL: Uma hermafrodita, auto-suficiente!

O MENINA BAIANA: Sou bipolar, não hermafrodita.



Voltei ao salão
A batucada está
Olho em cada rosto passante
É certo
Você nunca mais virá
É certo
É certo isso?
Eu vim de branco pra me entranhar no azul
Eu vim de branco sobre minha pele preta pra ser orixá
Lhe chamar
Gritar
Chorar
Cantar este meu fado
Mirando o mar
Que se vê derramado pelos meus olhos
Onde está escrito?
Eu quero ler onde está escrito que vou olhar
Fundo em seus olhos de luzes
Onde está escrito consegue ler que as ondas se agitarão ou se acalmarão?

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 189

CENA: Que vem


O MENINA BAIANA: Você tem razão quando diz que estou andando à margem. Eu sou absurdo e você diz que é legal quando o ego começa a trabalhar a favor do real. Eu a favor do que não tem jeito de ser a favor porque não tem jeito. Meu corpo está em ressaca. Ressaca e sonho. Tudo bem que a lua apareceu como uma bola de fogo ontem e eu estive tão encharcada, sem saber. Waltinho diz que esse artigo definido masculino singular pode suscitar ideia de erro. Eu já falei? Que suscite. Quero suscitar. Esse é o absurdo. Camus diz que respirar é julgar. O mundo todo é marginal. O mundo todo gira fazendo borda no real.

o Menina baiana - claquete 188

UMA PESSOA DO PLURAL: Bateu uma onda.

O MENINA BAIANA: Também tô sentindo. Forte. Não tem cura. Tô enviando algo que me aliviou. Jocasta enforcou-se. Matar é todo dia. É assim o tempo quase todo. Eu não vou aguentar por muito tempo. Com não ou sem não, é tudo não. Não sou amorosa. Sou uma mentira. Tudo isso é não. Vou capotar o carro com eu e ela dentro. Desgraçada. Eu teria o direito de matar se não fosse essa merda de civilização.

UMA PESSOA DO PLURAL: Aí nem precisaria de direito.

o Menina baiana - claquete 187

CENA: Se encher mais cedo


O MENINA BAIANA: Conheci uns meninos baianos. Eles já estao vivendo o farol da naturalidade faz tempo. Já falei com um dos pais de Ogã Mirim. É linda. É lindo receber abraços, conversar com uma linda menina baiana e  um compositor baiano enquanto rola o som, depois que rola o som. Eu estava apontando pra mim e perguntando quem sou eu o tempo todo pra decidir que sou eu. Ali. Se sou feio ou bonito, pouco importa. É no discurso, no dispôr, na entrega. Sinto que tenho pouco tempo de vida, preciso correr. Solidão no salão hoje. Sambadinha e carinhosos cumprimentos. Não fui à cozinha. É samba e forró. Coisas lindas em frevo no meio do azul e branco. Eu fiquei contente por avistar um retorno. Eu acho.

terça-feira, 8 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 186


  • O MENINA BAIANA: Quero acreditar em várias vidas. Sem o barulho das contas em minha cabeceira. Sem Smetak caminhando na minha cabeça. Sem essa pontada nas costelas ao respirar. Sem criança saindo entre as pernas. Eu odeio os barulhos de minha mente. Enfio música mas não está amenizando a agonia. A agonia desse dedo triste apontando pra mim e dizendo: você não é amorosa. Quero voar, por favor...

o Menina baiana - claquete 185

O MENINA BAIANA: Se todo dia houvesse rede em alto mar eu viajaria com você. Nao, não é romantismo, é o que chamo de espírito. Você fala alma. Que sou sua alma. Até quando? Sempre, você diz. Eu não tenho o futuro. Tenho apenas ensaios programados. Essa coisa que alguns desejam, essa coisa de só eu e você, eu estou fora disso.  Você sabe. Esse silêncio que fica, voce sabe cuidar. Eu sei cuidar. O silêncio quando é um silêncio entre almas é sempre um cuidado diante dessa distância navegando até tomar onde está a sua raiz. E quando o próprio dedo tem boca, dentes, fala, tem olhos. Uma cara no dedo indicador com vida própria, exigindo viver, chorando de fome, se queixando porque está mal cuidado por mim, pois não aceito aquela vida andando na ponta do meu dedo. Cara feia. Horrorosa. Algeum me dizendo que eu devo cuidar.
Você veio
Tomar
Minha alma
Tomar
Sou você
Em terra à vista mar
Você veio
Tomar
Maré alta e mansa
Pra eu cheirar
E te responder
Se o seu corpo é bonito
Tomar
Meu corpo dizendo sim
Enquanto dançamos pela cidade
Tomar
Na beira do mar
Tomar
Banho com você
Porque
Eu não sei nadar
Tomar água de côco
Na beira do mar
É o que tenho pra lhe dar
Tomar
Lembranças
Dessa ilha baiana
Que cá está
Tomar


Enraizada

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 184

O MENINA BAIANA: Aquela nota no início eu não escutei. Demora mesmo entrar. Eu demoro mesmo pra ir. Isso me atrapalha. Me estimula excessivamente desde as fotografias expostas como ossos expostos dessa Bahia. E daí que eu seja baiana? É daí. Meio Nara, eu mostro uma delas a ela quando sou público. Sinto dores antes das bolhas. Depois de todo choro, bolhas. Eu pergunto quando você chega pra evitá-las. Barba cheirosa e eu desconfio que visita as minhas histórias. Estou entrando no rio vermelho.

UMA PESSOA DO PLURAL: Estou com muita dificuldade em enviar as mensagens.



o Menina baiana - claquete 183

CENA: Trava língua


O MENINA BAIANA: Eu sei entrar e sair e olhar pra quem eu quero. Eu dei a volta pra fazer visitas. O som esteve muito bom. Menos os pastéis de bacalhau. Nem com azeite. Nunca mais. Nesse rio vermelho eu faço voltas, vou no samba. Sou grata a você pelo silêncio. Pra mim, isso não se faz. Isso de pausar caracteres. Existem cumprimentos básicos e simpáticos emojis. Mas silêncio? Silêncio é pra chamar o som? Morte súbita? Sinto muito. Já não fica mais no meu estômago ou fazendo tremer o meu corpo. Fica numa rua da minha fronte. Faço o trabalho de compreensão. O silêncio se não está para o som, está para morte. Que assim seja se assim prefere. Morra.

domingo, 6 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 182

CENA: Quando a sede chamou


UMA PESSOA DO PLURAL: Eu tenho medo que você sofra por mim, meu amor.

O MENINA BAIANA: Prometo que não. Eu choro, mas é de emoção por você existir. Por você falar comigo, por escutar a sua voz e sentir o que vem de você. Você não largou a minha mão, não desviou a atenção de mim.

UMA PESSOA DO PLURAL:  Tinha medo de te perder. É fácil ser sincero contigo. E adoro olhar para coisas lindas.

O MENINA BAIANA: É fácil te amar e levar esse amor dentro de mim pra aonde eu for. Eu me senti segura e forte e muito desejada

UMA PESSOA DO PLURAL: Espero que te inspire na sua arte, que melhore o teu fado. Eu sei que o seu projeto musical é um projeto artístico e não comercial. Por isso o estruturas com tanto cuidado, profissionalismo e carinho. Vejo a sua alma nos teus olhos quando fecho os meus. Uma vida inteira seria de menos.

O MENINA BAIANA: Você inspira o meu viver. 

UMA PESSOA DO PLURAL: Quando olhei o seu corpo na praia, fiquei enfeitiçado com a sua cintura perfeita. A sua beleza parece sobrenatural.

O MENINA BAIANA: Existem muitas parecidas aqui.

UMA PESSOA DO PLURAL: Teu corpo e a tua alma em sintonia com as minhas mãos.

O MENINA BAIANA: Mãos que não têm dúvidas. Eu sou água do mar perto de você.

UMA PESSOA DO PLURAL: Fico completo.

O MENINA BAIANA: Não tenho direito de perguntar nada a essa vida.

UMA PESSOA DO PLURAL: A Bahia é a sua alma. Se você sair, definhará como uma flor envasada. Não gosto de gente desterrada. És enraizada. Como eu.

sábado, 5 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 181

CENA: Riacho do navio


O MENINA BAIANA: Que as luzes se apaguem e eu sinta apenas aquela bem quente acima da minha cabeça, cegando o meu olhar. Isso não é esperança, é um grilo. Cega eu poderei dormir sem erva. Na caixa preta. Parede aberta diante de mim. Ah! Quantas saudades eu sinto de você. Quanto amor! Quando escuto a sua voz meu corpo recebe uma descarga elétrica. As lembranças são mesmo muito fortes. Tenho vontade de ir ao seu encontro mas devo todo dia entender que o tempo é o senhor dos destinos. Foi luz que você me trouxe.

UMA PESSOA DO PLURAL: Meu Deus!

O MENINA BAIANA: Vamos ficar por aqui só umas horas.

UMA PESSOA DO PLURAL: Tão linda, tão sensual, tão romântica, tão mulher...


o Menina baiana - claquete 179

CENA: O sol não adivinha


O MENINA BAIANA: O mar faz silêncio mas a minha mente não. Nem essas pessoas na rua. O vento traz o barulho delas a se unirem com a zoada da minha cabeça. Já coloquei o fone. Vou escutar minha sorte e estudar o que posso colocar nela. Não sei se outra língua. Esse meu jeito não cura com reza. A reza é pra encontrar esse meu sujeito. Encontrar sujeitos que me dão espelho em seus jeitos, meus jeitos, em seus cheiros que pedem minhas narinas, em seus ouvidos que pedem a minha voz, em suas vozes que pedem meus ouvidos. E parecem estar por perto pra não perdê-la. Estética, tropicálias, na minha, meu canto. Me encontro metendo pesquisa pra viver. Não foi o sistema de catracas que se dispôs a me destrancafiar. Foi a música. É ela. Nem foi a oração torta de minha mãe durante todos esses anos. Ainda que eu cante minha sorte, tenha chorado com minha sorte. Minha mãe é minha música. Eu me derreto em lágrimas duras, tão duras quantos aquilo que se coloca na ponta da perfuradeira, enfiando ela bem no fundo do mar pra encontrar sinais da pérola negra mundial. Eu me encontrei no negro gato antes mesmo dele morrer, ele sim é uma pérola negra. Brasileira. Assim, brasileira. Desse jeito meu, brasileira. Sentindo a nacionalidade toda pelos poros e pêlos. A naturalidade em meus fios de ouro prata no espelho. Na rachadura de minha pele porosa e flácida. Nos rasgos novos em volta dos meus olhos. Todo dia. Quando é dia. Eu me levanto e lavo a louça pra deixar a casa arrumada. Passar pano no chão tem que ajoelhar pra enxergar a sujeira.

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 180

O MENINA BAIANA: Eu digo logo. Pra quê engolir o dizer se é algo bom isso que sinto? Não sei se é bom pra você. O meu dizer vem de algo bom que sinto em direção a você. É assim que esse mundo pode me conter. Só assim. Olhando todo dia pra minha baía, escutando tropicálias, buscando as cantigas pra ninar a minha dificuldade de viver. Biscoitinhos e vitamina de frutas. Mão no ventre. Os lugares bons de entrar não deveriam ter saída. Ou são bons lugares de entrar porque têm saída? Seriam prisões se não tivessem saída? Olhos fechados. Mão no ventre.

UMA PESSOA DO PLURAL:  Olá, minha Rainha.

O MENINA BAIANA: Eu desejo ser amada por alguém assim como sinto o seu amor. Sinto vontade de lhe abraçar.

terça-feira, 1 de agosto de 2017

o Menina baiana - claquete 177

CENA: Cochicho


O MENINA BAIANA: Ainda estou e entendo que você sente a minha presença. O imaginário é proibido de criar expectativas em relação a você. Você é o ar, vem fazendo redemoinhos no mar e depois parece que nem brisa faz. Você também está, como é possível. Eu te entendo. A paixão entra. O amor entra e sai. A paixão arrebenta. O amor acalenta e vai. Quero dizer pra você que te amo. Acho que já lhe disse antes. Mas quero dizer agora, mesmo sendo dois pontos, nós dois, nessa distância que percorreu carta na garrafa ao mar até você estar. É a Bahia, é Salvador, rio vermelho quando a sua mente lhe trai. Ainda sou menina baiana, meu existencialista ateu sem rótulos. Sou menina baiana e nem precisa se mexer enquanto há língua. Pode ir, mas volte de vez em quando, lembre-se de mim, sob o céu da baía.