domingo, 25 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 142

CENA: Velha

O MENINA BAIANA:  Se sobe à cabeça, lembro da gravidade. É na gravidade que jaz o centro. Não, não é no próprio umbigo, é no meio de si nesse mundo, e existe muita coisa nesse meio. É um meio que olha pro céu e pro chão e não precisa girar todo o crânio - os pensamentos estão na gravidade. Santa Muerte! Minha Santa Fé! Coisa linda me trouxe pra ver! Uma pessoa que namora um cavalo só porque ele é manso e deixou que o alisasse? Isso não existe. Existe um troca de afeto, ainda que nenhum saiba o que está trocando. Na rede todo mundo troca, se quiser. Se não quiser também troca. Como aquele menino na estrada lavando a sua bicicleta ali de dentro da água, ou aquele homem que caiu do cavalo e a velha riu dizendo que era feriado e ele com certeza estava embriagado. Embriagado de andar a cavalo? De novas paixões? De cachaça? Mata um uma queda de cavalo. Superman ficou tetraplegico. Documentário Axé. Episódio cantora da Timbalada (Hora). Documentário Meu Nome é Gal ( "eu n sei o que é q a baiana tem"). Montagem Cantora Criada em três formatos.

sexta-feira, 23 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 141

 Menina no ócio não é flor que se cheire. Apronta é muito, porque mente vazia é casa do diabo. Tanto escutou que no lugar de rezar prefere aprontar. Muito drama. Tudo bem. É um jeito de encher a mente quando não vê que basta praticar outro idioma dentro de casa mesmo e uma alavanca lhe rumará longe. Tem dois dias que não dorme a menina.

O MENINA BAIANA: o corpo sabe mas o sono não vem e isso tem me chamado. Disseram que é pra me tratar quando ansiolítico tem matado mais que cocaína. Sei não. Foi uma pesquisa. Eu quase me afogo. Quando vi ela caiu com o seu peso todo sobre mim e me fez cair numa água profunda. Eu escutava tudo enquanto esperáva o corpo começar a emergir por si só. Segurei a respiração e me senti subindo. Tapei o nariz com uma das mãos tamanha a demora da superfície chegar. Levantei o outro braço pra sentir o ar da superfície que pra mim estava logo ali, mas não! Nunca chegava! Eu comecei a bater o braço na água com a intenção de ser percebida por toda essa gente ao meu redor. Eles estavam lá, escutei todo mundo. Alguns estavam mas não falavam. Eu os escutei ainda assim. Mas a superfície não chegou e eu rapidamente me preparei para a morte: seja bem-vinda! Meu fôlego está acabando, já desmaiarei. E é no desmaio que encontrarei a bifurcação.  Serei salva ou não.

o Menina baiana - claquete 141

CENA: Toi


O MENINA BAIANA: Você é uma flor pra se cheirar. Já tem tanta coisa ruim nesse mundo. Vou ficar longe pra que você nunca mais volte a sentir isso vindo de mim. Não sou especial e uma pessoa com esse comportamento nunca poderá ser admirável.  Me desculpe. Sou um ser humano em dificuldade de viver.  Que a vida sempre lhe ofereça os melhores presentes. Eu creio. Mas não tenho controle muitas vezes. Pensamentos retroagem com a mesma intensidade de um acontecimento real. Tanto as coisas boas e coisas ruins. Você viu mesmo de tão longe, eu me sinto muito mal em ter lhe feito sentir coisas ruins e lhe agradeço por falar pra mim. Eu desejei ser leve pra você. Não é bom ser quem eu sou, tenho feito muitos esforços mas todos me parecem insuficientes pra encontrar a saída. Só tenho visto uma saída ultimamente. Eu queria ser um presente bom na sua vida.  Não tenho sido isso nem pra mim, embora as vezes pense que sim, mas eu minto. Serei uma pessoa mais saudável. Eu creio. Preciso cantar. Lembrei agora que eu sonhei que tentava tocar um violino.. eu quebrava as cerdas do arco. Sem querer... E ficava olhando elas, eram fios de rabo de cavalo. Pra que né, falar do que já se sabe. Quero ver o que existirá depois disso. Entendi que o mundo tem sido movido por pessoas que desejam apagar a memória de outras pessoas. Matam em massa, adoecem em massa, e não se fala no assunto. Que a amizade seja sempre um laço de memórias, um traço no espelho,  pra seguir a vida com saúde.

quinta-feira, 22 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 140

CENA: Bang bang

O MENINA BAIANA: O que é que pode contar e o que não pode contar. É tudo pelas minhas contas. A coisa era tão somente sexo que o assunto acabou. Eu puxando assunto, puxando assunto. Selfies e copos de cervejas, caminhos pelo mundo e pouco texto de si. Parece que conheci alguém que consegue caminhar vazio. Isso me causa inveja. Acho que é inveja o nome disso de querer algo que alguém tem. E quando querer algo que alguém tem impulsiona o conhecimento de si mesmo é inveja? Eu não sei. Sei que gostaria de caminhar vazia muitas vezes. Muitas vezes pra não chorar muitas vezes. Um dia até chegar o outro dia é a única coisa que move. Hoje ainda me movo na cama. Ontem depois de me desafiar nem consegui me assustar muito com o ataque do ser humano precário que se pôs em meu caminho. Meu cigarro na boca e eu dirijo pela cidade à noite e digo não a seres humanos precários.Vivendo eu a minha precariedade em ser humana. Deixando meu corpo consumir-se, reter sangue pra os pensamentos abrandarem. Ou isso ou aquilo. Aqui nessa terra a única escolha é movimentar-se. Paragem, pois sem a pausa o som não existe. Caminhada. Pois sem o tempo a música não existe.
Ao lançar o cordão invisível
Ele me trouxe você
Afoito
aflito
Suado
Minhas mãos se encharcaram
De você
Na outra ponta do cordão invisível
Meu corpo faz ideia do seu
E está alocado bem abaixo
Bacia com bacia
Falanges explorando espinha
Pelos
E suor
E voz
E desejo
Você não me vê
Tem perfume que não faz ideia
Tem a pressa conformada
Páginas em branco viradas, desmanteladas
Quando é hora de recolher o cordão
Amarrá-lo aos meus pés no chão
Abrir os olhos e ver
Com meus próprios olhos
Você não me vê


o Menina baiana - claquete 139

CENA: Lixeira

O MENINA BAIANA:  O plano era me sentir estrangeira e treinar o meu inglês. No caminho veio olhos de luzes e eu derreti. A coisa já estava chamando alguns novos baianos tem um tempo, só não sabia ainda o que, porque a pulsão vai avassaladora e destemida. Sabe que encontra, encontra e desvia pra viver. Meu fantasma é a megalomania ou o Alzheimer. Mentira. Eu sei o que estou fazendo com isso que tô indo buscar. Isso é viver aprendendo. Se wittigeinstein escreveu pedaços e depois juntaram, se colaram os pedaços de Ingrid Jonker, eu já tô colando os meus. Se todo dia é um dia e a gente é todo dia um nesse dia, se a minha voz todo dia é uma voz, são pedaços mesmo um livro quando ajuntam muitas palavras de existir. É viver a idade que tem, com fios de prata que tem pra tecer a rede. É enxergar com os próprios olhos. O frio, o calor, ninguém pode ver. Treinei o meu inglês.

quarta-feira, 21 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 137

CENA: Bandeira

O MENINA BAIANA: É a transferência. É nela e por ela que se dá. Há quem fale sobre contratransferencia. Eu digo que é transferência. Às vezes só um resquício, às vezes não. Perdura, insiste, quer ficar toda nua, se entregar. Mas de nada adianta supor que o outro saiba. Só porque sabe falar mais do que a sua língua pátria? Eu sei. Só porque anda pelo mundo? Eu ando. Só porque só? Eu só. Eis o fim da logica. Tento me trancar no quarto, passo a chave mesmo e corro para a esquadria em painéis de vidro antes que a mulher violenta chegue. Eu com medo dela, tento encaixar os painéis um no outro e há uma burrice que me impede. Ela está vindo, eu escuto avisarem. Lá fora está escuro mas tem muita gente. Parecem que sabem lidar com a presença dela, mas eu não me sinto apta. Sinto medo. As ferragens são pretas e eu tento combiná-las pra fechar a esquadria inteira mas sempre que algum macho casa com uma fêmea, há um buraco que fica aberto. Eu desisto. Destranco a porta e saio pelo corredor de paredes brancas. Ela está logo ali! Sentada no chão! Eu passo por ela e nossos olhares se cruzam. Nos cumprimentamos e eu sigo em frente. Ao telefone ele está sentado falando comigo, despojado em um dos sofás de uma sala grande, muito iluminada e arejada. Pelas esquadrias de vidro eu vejo o verde de um campo aberto e pergunto onde ele está. Onde você está? Na casa de sua mãe fazendo mil coisas e agora senta pra falar comigo sobre o ativismo, sobre alguém que lhe parece interessante mas que não muito importante também, porque não se faz importante. O menino que passa junto comigo, sob a minha tutela, por um rapaz muito simpático que tira a minha dúvida sobre o caminho parece tenso, sem jeito, sem graça. Continua assim até subimos na bicicleta. Nessa parte eu estou sem querer mexer porque horas depois eu vou saber que o menino foi abusado sexualmente pelo homem simpático. Uma mulher altiva, de voz firme, andar seguro e leve surge pela sala e sabe muito bem cada palavra que lhe sai da boca. Eu fico admirando o passar dela e tento conjugar o seu movimento. Algo sobre o corpo e a gravidade do meu companheiro atual quando diz que "ela constituía e sancionava uma espécie de acordo secreto que a ligava à terra e ordenava o mundo em torno de seus movimentos... ela unia seus gestos ao mundo". Seu partido político agrega crianças e adolescentes.  O ativismo é o amor. Beijar, amar, seja lá quem for. Seja lá quem for.

terça-feira, 20 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 136

O MENINA BAIANA: Vou enviar uma descrição pra ela até quando ela voltar de viagem, deixei o cordão amarradinho pra quando ela voltar a gente se encontrar.

ALGUÉM AGORA: Din din don din don din din din din din din din din don...

O MENINA BAIANA: Lacan é um filósofo analítico. Vai à palavra, encurta as sessões. Vive o real. E ponto. Com certeza teria um Instagram  hoje! Vou a Wittgenstein. Camus é um Dostoiévski ate agora em a morte feliz. Vou ver o que há em O Homem Revoltado e se não tiver muita coisa vou a Wittgenstein. Investigações filosóficas o nome do livro. Eduardo Sande passou pela faculdade de filosofia? Na verdade, eu fico buscando uma companhia, nada mais que​ isso.

ALGUÉM AGORA: Gosta dessa realização?

O MENINA BAIANA: Quando encontro boa companhia sim. Uma companhia mental, sei lá, algo que encontrei com a psicanálise por uma década. Encontrei em Garcia Marquez, encontrei no livro sobre o Movimento Atensional, todos que encontrei. Saleme foi uma companheira muito importante pra mim. É diferente de buscar respostas pra algo, é uma busca por não estar completamente só e sentir o caminho se fazendo em saúde, em alteridade, em alteração. Romances não me apetecem. Não deixem uma criança ler José de Alencar. Mostrem João Ubaldo às meninas baianas, mostrem Vânia contando Riachão, Edu O. falando  da lagarta. Mostrem tudo  a menos romances a uma criança.

o Menina baiana - claquete 134

O MENINA BAIANA: É nada disso. Tem nada a ver com eles. Penso que posso ter sido uma pessoa tóxica. Por intoxicação e por intoxicar. Se há uma mudança acontecendo, é pra esvaziar. Uma mudança que extrapola esse vaso. Quebra o vaso e os pedaços arranham algumas pessoas por perto, eu nem sinto os cascos mais. Tomara que a mudança caiba em algum lugar. Tenho a impressão que encontrei um lugar. Um casarão. Pra despejar a mudança. Encher de voz o menina baiana.

o Menina baiana - claquete 132

CENA: FM rebeldia

O MENINA BAIANA: É que o penúltimo tem a boca do terceiro. O último tem o beijo do primeiro que nunca foi beijado. O antepenúltimo tem um jeito diferente, coisa de irmão parceiro, embora ele diga que tem me querido a sua maneira polimorfa de querer. O que nunca foi agora quer ser. O que foi, foi de vez pra bem longe quando o antepenúltimo chegou o circo já estava armado e seguimos em paralelo. Tão bonito... Só um minuto. [Sai de cena por um minuto e volta] É isso que eles fazem sem avisar. Ficou pensando o que nesse minuto de silêncio? Me diga. [Pausa] Eu sempre crio a expectativa nos minutos de silêncio que cada um faz. Às vezes somam-se minutos e eu fico em instabilidade. Por quê? Fiz meus esforços e fui buscar realizar desejos com Silvana. Que pessoa apetitosa! Que pessoa firme! Que pessoa cheirosa e macia... Eu fui em Silvana e ela veio esfregando na minha cara enquanto eu me esquivava querendo tato. Ela queria mais e, não contente, passou a mão nela e meteu na minha boca. Eu tentando explicar a ela que... Coisa grudando a língua ao céu da boca, como uma cola. Eu tentei dissolver o grude que Silvana me meteu na boca. Eles gostam, elas também imagino que gosto. Eu não. O que entra na minha boca eu quem escolho. Quase fui à menina do samba mas ela nao me quis como Silvana.

segunda-feira, 19 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 131

CENA: São folhas assim

O MENINA BAIANA: Coisa linda. Muitas folhas e elas se mexem. Se mexem acima de mim com o vento brando da tarde, com o sol e o céu de salvador num dia de sol. Que sensação de paz eu sinto ao fechar meus olhos e ver isso tudo. Quero um banho de folhas. Isso é uma imagem somático performativa? [Cochichando] Eu fui lá na escola de teatro nas aulas de Fernandes. [pára de cochichar] A sacerdotisa disse que eu espere porque aprendo muito rápido e a minha cabeça pode ficar com excesso de informações. Pelas minhas contas vai dar certo.

o Menina baiana - claquete 130

O MENINA BAIANA: E de tanta vida passar que eu estou aqui, resolvendo viver. Trata-se de uma escolha sempre. Eu quero viver, eu não quero morrer, nem me matar eu tenho coragem. Camus está certo, você está certo,  ele está certo, jesus Cristo apaixonado também está certo. O guardador de carros também está certo: o ser humano é cem por cento - o bem compõe trinta e o mal compõe o resto, e é muito difícil lembrar dos trinta quando a onda ruim vem. Talvez você esteja falando dos trinta de mim que lhe mantém por perto, mas sei que se eu desistir de viver agora, você vai embora de vez. Todos irão. Chegará um dia em que eu não terei pernas pra ir buscar, porque meus passos serão invisíveis pra todos. Lágrimas eu não consigo controlar, mas os meus trinta eu tenho a missão de tomar conhecimento pra viver. Ou quer que eu continue mentindo? Há violência no seu silêncio, há violência no desmoronamento da fantasia. Todo rompimento é violento e as reações descendentes são imprevisíveis. Mas já chega de tanta violência vivida por ser criança, por ser menina, por ser preta, por ser irmã do meio, por ser "muito inteligente", por ser "muito exigente", por ser "impetuosa" e um "jorro de amor" - tudo o que dizem que sentem. Vou andar com minhas contas, eu quem escolhi e minha vovozinha me deu. Ela mandou me dizer que ele estava atrasando minha vida. Eu não entendi e senti muita raiva. Atrasar a vida de alguém é impedir que o amor seja o condutor até a morte junto a esse alguém. Eu quero amor dentro da minha cabeça quando a onda bater forte, quando ela vier virada nos setenta.

domingo, 18 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 129

Não... Não chore... Faz tempo não lhe vejo chorar... É porque chove? Chore. Daqui eu pouco tenho a lhe falar, pouco posso lhe pedir, nem colo tenho pra te dar, menina... Deixa lá, elas caírem, gastarem. Estou lhe acompanhando, menina. Estou daqui lhe acompanhando.

O MENINA BAIANA: Eu aviso pra não chegarem muito perto e não adianta. Vêm e me causam coisas, eu deixo virem me causar, depois vão. Ou não vão. Silenciam no vão. E eu fico com coisas. Coisas de chorar, geralmente. É hora de saber-se estar completamente só. Estar à beira da morte deve trazer muitos benefícios depois que a pessoa sai da beira. Já já eu chego no meu pós guerra. Daí alguns serão reconhecidos, outros reconhecerão.

AQUELE QUE UM DIA: [gargalha] Tá indo né?

O MENINA BAIANA: Indo pra onde? A vida nada mais é do que brumas, só há um lugar pra ir. Ingrid Jonker, Elis, Amy, Joplin, Nina, Whitney, Maísa.. tudo viveu beirando. Cantora baiana que beirou eu não conheço. Você está indo?

AQUELE QUE UM DIA : Tô procurando pro onde a vida passa pra ir passando, passando, passando...

O MENINA BAIANA: OK. Por aqui a vida já passou.

o Menina baiana - claquete 128

CENA: Speak low to me

O MENINA BAIANA: ah, tá. Sim. Poderia dizer  o que gostei sim. Eu gostei. Vi crianças dançando , bons atores trabalhando. Encenar é sempre  é um importante movimento. São tantos teatros nesse mundo! Depois eu desci à piedade bem rápido. Um beco sem saída à direita. Andei bem rápido, quase correndo. Sempre fui desastrada correndo, caindo. Travessia. Eu sozinha quando me despedi de meus pais. É sozinha. Cada um tem os seus problemas. O meu seria descer sozinha à piedade? Eram​ quase dez e daí? É sozinha e daí? Toda menina baiana tem medo e daí? Agora é o menina baiana mesmo. Vou falar com ela. Espero algumas respostas quanto ao trabalho. Travessia. Estou na canoa dos druidas. A parede de brumas me envolve também com seus buracos. Tem volante, eu seguro enquanto fumo. É tudo uma bruma só com buracos. Buraco daquele que fura a fila do teatro e eu muito cansada de ficar indignada e provocar uma reflexão (ou não) no foyer. Eu preferi comer bolinho de estudante a um passo da fila. É tudo só. A força que tenho agora é a meu favor nessa canoa, de mais ninguém, senão eu afundo de novo. Deixe eu contar: não sei nadar!

o Menina baiana - claquete 127

O MENINA BAIANA: Sou tão menina assim não. Quero a Didá no show. Quero a força do Olodum através delas. Eu senti demais a água lavando minha alma quando vivi os dois. Agora eu quero muita coisa, porque quero coisas. Eu quero falar de coisas e coisas das pessoas, quero me dirigir a elas assim. Vamos trocar coisas, conhecimento, compartilhar o ócio, mesmo de vez em quando. Como ficará essa força dentro do teatro? Eu quero ser forte e realizar essa coisa. Eu sou forte se já fiz coisas até aqui.

sábado, 17 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 126

O MENINA BAIANA: São iguais. Quando não me veem mais, são iguais. Ou quando eu já me mostrei demais, são iguais. O choro vem sendo tomado pela respiração. A noite não foi boa passando mal sozinha num quarto. Nada mais é do que a morte ensinando. Agora começa uma boa noite com teatro. A coisa tão bonita que ele é, a liberdade que ele tem. Ele pode ir e eu sei que ele estará em algum lugar. Os outros não. Não não. Economia de fracasso! Não, não! Eu quero sucesso. Eu sou igualzinha.

o Menina baiana - claquete 125

CENA: Roupa suja

ALGUÉM LÁ LONGE: Vou deixar a carteira de cigarro aqui.

O MENINA BAIANA: Pode levar, ninguém usa isso aqui. Tem uma intenção deixar uma carteira de cigarro.

ALGUÉM LÁ LONGE: Te ver mais vezes.

O MENINA BAIANA: Não pode deixar a carteira de cigarro aqui.

ALGUÉM LÁ LONGE: Tá melhor? Ta se sentindo melhor?

O MENINA BAIANA: Sim. Estou bem. Quero aprender alguma coisa nova que mexa com o meu corpo. Você me viu tocando e cantando? Achei tão bonito...

ALGUÉM LÁ LONGE: Voz linda. Deixe eu ir. Obrigada por ficar esse tempo comigo, eu estava precisando. É um dos poucos momentos que não é artificial, é verdadeiro. É difícil pra mim te largar de vez, desmamar de vez.

O MENINA BAIANA: Já tem tempo isso, já era pra ter desmamado, se é que um dia te dei de mamar. [Gargalha, respira, pausa] Entendeu né, o que é uma mulher apaixonada de verdade?

ALGUÉM LÁ LONGE: Eu não sabia. Se isolar de tudo por causa disso?

O MENINA BAIANA: Eu estou vivendo.



sexta-feira, 16 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 124

O MENINA BAIANA: Vou tentar plantar pra ver se consigo colher isso. Nem cara, nem canto, nem sexo... Isso é ir em parte, ou ficar sem essa parte. Devo aprender o lugar do canto. Esse principalmente.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Eu não quero morrer. Eu não quero morrer.

O MENINA BAIANA: [gargalhando] Vou escrever isso!

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Eu gosto de tocar. Não me ofereceram rádios.

O MENINA BAIANA: Não tem lugar pra estiar uma toalha e deitar. Fui à mata e me coloquei diante deles. Dessa vez deprimindo nada, só observei. Cheguei até a sonhar esse encontro. Eles nem me notaram. Busquei, busquei e nada. Talvez os répteis tenham me notado. Então eu senti bem dentro de mim o trágico. Tem mesas e bancos espalhados.  Mas vi que vale uma caminhada, olhar pra cara de cada bicho mesmo que pra eles pouco importe a minha presença. O urso parece velho, doente e solitário. O lobo parece solitário. O jacaré enorme parece solitário. As ariranhas parecem estressadas. As araras, conversadeiras. Os hipopótamos transmitem paz - comeram e foram se banhar tranquilamente. O macaco atacou a macaca por ciúmes do cuidador, ele disse que "ninguém pode falar com ela que ele faz isso". Pras zebras a chuvinha com sol pareceu cair-lhes bem e as cobras estavam de barriga cheia e quietas. Vi os gaviões comendo carne vermelha. E havia bichos soltos, soltos na mata. Eu fui surpreendida por um e ele por mim. Uma sensação incrível de estar dentro da mata foi esse encontro. Um alívio tomar consciência do trágico. É um alívio quando mundo me explica melhor as coisas do mundo. É quando enxergo possível conter a minha loucura.




O MENINA BAIANA: Será que é mais uma de mim desdobrando agora? Santa Muerte! Ninguém vai entender nada! Não vão me deixar quieta como tem que ser. Quieta pra servir ao que me inquieta e dizer que é ao dirigir-me ao que inquieta encontrarei a cura? Santa Muerte. Sou apenas uma Catrina, minha santa, tenho nada, apenas palavras, espumas ao vento, uma voz, ao vento, e ainda tento cantar mais uma vez. Pra nada, minha santa Muerte! Agora é a hora. Pouco importa se entenderão. Só preciso protegê-los da minha loucura e exijo reciprocidade. É Darcy, Castaneda, é meu homem, meus homens. É pra ser divertido ainda que trágico.

o Menina baiana - claquete 122

O MENINA BAIANA: Agora eu queria ser as teclas de um piano e me colocar em sua frente. Seus dedos iriam me chamar, eu sei. Eu sei pra onde me levaria cada nota digitada em mim, porque eu já lhe vi. Você lembra? Você me viu? Eu quero tanto acreditar que você perdeu a crença e que virá me tocar, afastar meus livros até todos caírem no chão, quebrar o cinzeiro, eu quero.

O Menina baiana - claquete 120

CENA: Curta

O MENINA BAIANA: Eu tô ficando mansa. Deve ser esse assentamento junto com o esquecimento que pertence à criança, ao inocente, senão ela não cresce nessa Bahia.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Esses dias estava pensando sobre esquecimento importante inclusive.

O MENINA BAIANA: O que é esquecimento importante?

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Esse aí que você falou.

O MENINA BAIANA:  É Camus. Ele é preciso. Quero um dia ter essa objetividade justa. Só sei de uma coisa, tenho pouco tempo

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Tem hoje. Hoje é sempre pouco.

O MENINA BAIANA: Ta vendo? A objetividade justa.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: "O movimento corporal é única e exclusivamente aquilo que desafia a gravidade. O restante é desdobramento." Rosa.

O MENINA BAIANA: Eu rio

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Eu mar

O MENINA BAIANA: Já acabou? Acabe com isso, na objetividade justa! O meu livro será um livro quando o novo show existir. Isso é o meu querer. Se você quiser publicar, eu serei mão de obra pra isso. Eu penso nos boquetes, seu pau é gostoso. Gostoso de chupar, cheirar, tocar... eram boquetes com muito amor. Chupo todo. Por isso gosto da presença. Por isso a velocidade do hoje, de se reinventar. Luc Ferry, acabei de assistir a um entrevista. O trágico no lugar do pessimismo e otimismo. Existem muitos impasses e o caminho é o amor. [Pausa] Gênios não são gênios, são filósofos, gente que olha a vida como obra de arte. E deseja que o ser humano viva bem. Antes de você ir de vez, você me avisa? Basta dizer que está indo e eu entenderei. As pessoas, e com elas as coisas, parecem encontrar os seus devidos lugares. Sem lamentos.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Porque eu iria de vez?

O MENINA BAIANA: Tem resposta.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: No dia que eu for de vez não poderei avisar, pois terei ido.

O MENINA BAIANA: Porque já foi em parte.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Não.

O MENINA BAIANA: Então deve ser isso: há o ir de vez quando a morte chega e há o ir de vez quando ela é convocada. Estou falando da convocação, somos todos assassinos em potencial.

quinta-feira, 15 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 119

CENA: A insensatez

O MENINA BAIANA: Acho que foi só saudade e ele não soube dizer. Ou ele sente ciumes também? Sem me dizer, eu nunca saberei. Por isso eu sempre digo. É horrível esse sentimento, busco estar sempre advertida porque quando vem do outro eu não suporto. Isso faz mal às pessoas e está fora do amor. Está? E a criança, quem ensina o ciúmes à criança? Ela aprende a amar com o ciúmes primeiro. Não é? Não?  Camus é simples. Bem Dostoiévski, eu vejo. Talvez por isso os coloquem parte de um grupo. As poucas parcelas de força que são reagrupadas "refazendo-se a si mesmo e ao seu destino". E a morte que ronda, assassinato e caminhada. É simples matar também. É simples matar e seguir. E eu em Santa Muerte com tantos existencialistas no caminho. São simples analistas, tão naturalmente.

quarta-feira, 14 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 118

CENA:

O MENINA BAIANA: O amor está fora da moral. É isso. De onde estiver, sinta o meu amor. Você sente a minha companhia?

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Sim.

[Pausa]

O MENINA BAIANA: A criança parece sentir também, ela me escuta quando eu explico quem sou eu e os meus motivos. Ela veio pra mim porque contive o sangue sem escorrer pelas minhas pernas, apenas a barriga foi cortada e depois a dor toda no meu peito, um dor muito grande. Eu disse pra não me trazer a criança e hoje eu choro por tê-la deixado tão sozinha a noite inteira. Mas eu não podia deixar ela vir sentindo tanta dor no meu peito.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Sim! Siga o seu coração.


O MENINA BAIANA: Eu tenho que me dispor a ir, ver o que existe pela estrada. Colher imagens pra habitarem o instante e bloquear meu imaginário. Eu vou. Com minhas pílulas. Com elas tenho férias durante o sono. Ele chega em paz e eu nem escuto o som da coruja, sequer dos outros pássaros na alvorada. São gritos muitas vezes. Eu vou pra lavar o adesivo dos meus pêlos, do meu corpo todo. Tem adesivos por dentro também.  Estou muito cansado. O homem que dizia viver de luz me disse que eu nao falei nada sobre a humanidade, sobre servir à ela, que eu só estava falando do meu querer. Os sabidos da vida alheia . Quem já viu viver só de luz? Soube que ele come pipoca e acarajé. Eu penso nos humanos, penso e já agi muito junto a eles, mas quiseram me jogar numa fogueira muitas vezes e eu fui obrigada a pensar em mim pra sobreviver. É ruim pensar só em si, mas é necessário aprender, afinar esse instrumento. Tem as pílulas, tem a erva, tem a música, tem a escrita, tem os desenhos... Tem o aquecimento da voz. O p de puta, de power, tem o queixo pra baixo.

o Menina baiana - claquete 117

CENA: Último pau de arara

O MENINA BAIANA: Pronto, já foi um duto com direção, o próximo será você. Muitos dias sem comunicação, o próximo será você. Meu corpo parece que quer ser adesivo, minha mente parece querer invadir mentes, meu desejo parece me sufocar. Então eu durmo, durmo o sono de quem nada tem a fazer. Não há companhia a não ser de si mesmo. Amigos são reconhecidos, os demais, adornos. Eu, adorno alguém. Eu amiga de alguém. Amante não sirvo, fico querendo entrar com um pau que não tenho e lasco tudo, lasco tudo.

o Menina baiana - claquete 116

CENA: Barriga cortada

O MENINA BAIANA: Se a televisão vier pedir pra falar com a cantora, eu vou. Do contrário não vou.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Que contrário?

O MENINA BAIANA: Essa coisa que não tem escola pra ensinar a não ser a escola de quem me gerou. E isso não é tão boa escola quando a criança é forçada a virar adulta e cuidar de outra criança quando o tempo já passou muito. E a criança nem fez conta.

AQUELE QUE É RECONHECIDO: Ela está viva?

O MENINA BAIANA: Tanto sangue escorrendo entre as pernas tantas vezes que quase ela nem vem pra mim. Está viva. Tão viva que me colocou na crista de uma onda irreversível, quando eu nem sei nadar numa piscina. Tô tomando vários caldos de mim. O tempo que tenho passado submersa cria irritação na banca julgadora. Pensam que a onda acabou e podem ir, mas é uma sequência infinita. É muito fôlego pra muita frustração. Estão me mandando parar pra me tratar. Eu fiquei um mês na cama pro sangue não escorrer entre as minhas pernas, enclausurada. Será uma necessidade de mim quando na onda? Vi notas tão baixas que desanimei. Todo dia eu penso que consigo sair do mar, mas estou contida nele, quase criando guelras de tanto mergulhar. A criança está viva e passa bem, muito bem, tão bem que anda por aí vagabundando.

terça-feira, 13 de junho de 2017

Ê morte certa. O que tem pra fazer hoje? Ir às compras do mês? Varrer a casa? Limpar o blackout, por favor. Obras imensas você tem pouca força, senão pintaria essa casa inteira. Quer pintar? Tirar tudo do lugar, lixar, emassar e pintar essas paredes pedindo pra serem brancas. Eu toda borrada de vermelho. Vai manchar. Limpa. Limpa. Você tem pouco tempo. Suja. Mostra a cara suja e depois limpa.

o Menina baiana - claquete 115

O MENINA BAIANA: Muito mal estar e é segredo. Se essa onda não passar, eu não passarei. Eu não recebo notícias pra continuar querendo, eu não encontro um caminho. Eu faço coisas pela metade. Fico procurando a criança que foi alegre, mas quando ela existiu eu não lembro. Você lembra de alguma coisa? Me ajude, você pode? Pode não? Ninguém salva ninguém, pessoas são apenas pedras que rolam num caminho com lama, sem lama, com sol, com chuva. Ta doendo e onde eu coloco isso? Você sabe? Sabe onde eu perdi a criança? Ela nem dá sinal, nem pergunta por mim. É fria demais. Eu fico me suportando e quero que ela morra de vez.

o Menina baiana - claquete 104

CENA: Pernas pro ar

O MENINA BAIANA: Eu não sei o que acontece, suspeito dessa coisa de entrar, deitar, levantar e sair por tantos anos. Me lambuzando por tanto tempo e agora é um vício, eu não páro. As coisas que a televisão me trouxe ontem eu fico trabalhando incessantemente na minha cabeça.  Foi um atrás do outro. Por isso que prefiro meus livros. Impressiona devagar, quando impressiona. Ela disse que escolheu errado em não ser amiguinha dele e entendeu isso quando ele morreu. Ela disse que poderia ter sido amante dele. Se ele quisesse. Eu também. Se ele quiser. Outra diz que casamento e sexo não se misturam. Eu gosto tanto dele, gosto tanto de mim quando estou com ele, mas a escolha é sempre uma morte do que não foi escolhido. Eu morri esses dias, por falta de crença, ele disse. É tudo muito sem limite, não estou só, tem sim alguém no mundo igual a mim, eu não sinto essas coisas porque estou sozinha, nenhum sentimento é de um só. Sentimento é sempre objetal. Vai, amor, deixa eu te dar carinho.

o Menina baiana - claquete 113

O MENINA BAIANA: Há muitas maneiras de mutilação. Ela quebrou a testa no espelho, cortou os pulsos e por fim lançou-se ao mar depois de escutar o seu amor lendo sua poesia de despedida. Uma vida de abandono e desilusão. É assim a vida? Talvez pra quem a sinta insuportável. Ela foi à menina dela, à criança quase morta, à criança viva. Ela foi ao discurso de Mandela. Eu eu? Nem sei pra onde estou indo. Do underground ao mainstream? Eu me enxerguei também nela, na agonia de viver, na necessidade de escrever, sentada no parque vigiando a criança brincar enquanto nas mãos papel e caneta, papéis pelo quarto, voando pela casa, enquanto na cabeça os pensamentos invadindo em poesia pra um livramento de sentimentos. Uma prisão em si. Mas fui pra rua sabendo algo de mim, desse lugar agora, passageiro. Concordo que já não sirvo ao amor pra alguém. Quero servir a muitos, a minha cidade, a um país, e deixar minhas palavras pra humanidade fazer o que quiser delas. Fazer nada delas. Mutilar minha existência de vez.

o Menina baiana - claquete 102

CENA: Jazz em mim

O MENINA BAIANA: A capoeira começa dentro da roda mas é difícil dizer onde ela termina. Tô escutando. Mas Ferreira acabou de concordar comigo que a vida é uma invenção. Agora eu quero inventar uma vida. Acho que por isso Santa Muerte veio. Ferreira disse que se lembra de Vinicius sorrindo. Me vi toda lá em Vinícius. Acho que se nos víssemos, nos apaixonaríamos. Não à toa ele veio criar a cantora em duas músicas! É muita invenção! Seria muita invenção ainda mais com tanta distância. Mas Vinícius se casou pelo correio. E acabava, e elas ficavam irritadas, não queriam ser suas amigas. Amiguinhas. Sou mais Vinícius que você.

segunda-feira, 12 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 110

CENA: Manifestação

O MENINA BAIANA: Eis que a sensação de paz voltou a chover. No final da manifestação, um toró. E no meio do toró um forró na bruma leve das paixões que vêm de dentro. Eu me vi deixando ele ir em mim nessa paz. Eu fiquei contente porque dia de domingo o buzu é mais barato e eu aprendi qual a porta que salta.

"Onda do mar me levou" (Lazzo)

domingo, 11 de junho de 2017

É um jeito seco e rude que pode ser derretido por um toque. Toque que deseja. Toque de gente que toca, diferente de gente que quer tocar. Toque de gente que conhece toca. Diferente de gente de tocaia. Gente de tocaia mata gente. Talvez por isso o jeito seco e rude depois te tantas vezes atocaiado. É bom caiar, arrumar gente que toca pra caiar. Da cor que quiser mandar caiar.

o Menina baiana - claquete 107

CENA: Pega batom

O MENINA BAIANA: Você pode trazer o violão pra mim? Tem que lembrar de buscar o outro.

ALGUÉM TOCANDO: Okei.

O MENINA BAIANA: [gritando] Pegue um batom!

ALGUÉM TOCANDO: Não escutei nada.

O MENINA BAIANA: [gritando] Pegue um batom!

ALGUÉM TOCANDO: Tem aqui em cima?

O MENINA BAIANA: Qualquer batom.

ALGUÉM TOCANDO: O que é que tem nesse quarto, menina?

O MENINA BAIANA: O que tem nesse quarto?

ALGUÉM TOCANDO: Nesse quarto. O que é que tem nesse quarto?

O MENINA BAIANA: Batom.

ALGUÉM TOCANDO: Batom?

O MENINA BAIANA: Batom.


sábado, 10 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 106

O quadro está coberto por um blackout. Tem risco de luz entrando pra dizer que é dia mas já passa do meio do dia e ela ainda não levantou. Acordou cedo mais não levantou. Está de bruços com os pés em cruz apontados para o teto. Escutei daqui umas cinco versões de speak low e vi a cabeça levantar com o tronco apoiado pelos cotovelos pra cantar alguns trechos, mas a pélvis ficou no mesmo lugar. Mesmo sem o quadro, a cara se mantém voltada para o quadro. Das vezes que levantou a cabeça pra cantar, continuou voltada pro quadro coberto.

O MENINA BAIANA: Acreditar em algo faz parte do delírio. Quero morrer primeiro do que essas pessoas que estão entendendo quando eu falo com elas e parecem acreditar em mim. Se a aula particular de inglês valesse pra todos e eu não tivesse sido barrada, talvez eu conseguisse entender outras gramáticas, ler outros livros, estar em páginas... A voz em páginas só se aproxima do possível em partituras, eu nunca estarei em livro algum.


Basta ser um artista e já existe um endereço. Ele tem urgência em ser havia vista o chamado derradeiro. O que tem lá nos búzios senão o endereço? O lugar de liberdade de um artista é enquanto artista, o resto é endereço. Pega esse seu teatro, essa sua música, e entrega - tem nada seu, nada meu. O momento é muito delicado e tem gente no meio se tem endereço. Faz o que tem, artista. Faz o que tem que toda arte tem endereço. Relaxe.

sexta-feira, 9 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 105


O MENINA BAIANA: Isso não é preciso. Quando saio de lá sempre existe um dever de casa. É bonito isso. Dever de casa sabendo onde é que mora é muito bonito.  Dever é se escutar falando. Muita merda sai. O que fazer senão viver? Tem jeito? Se ainda tenho fé em santa Muerte, o jeito é um só. Sei que ela pode qualquer coisa mas aparecer é só quando quer, dilacerando tudo de tão poderosa que é. Eu entendo muitas coisas de maneira errada, muitas pessoas apontam. Tem algo que eu entendo muito rápido, ele disse, que vai me poupar mas que existe uma atenção especial nesse meu caso. Se o nome disso fosse outro que não viver, aí não teria mesmo outro jeito. Se meter em um furacão, ver o olho dele,  o umbigo de todos os ventos, é de arrombar um. Lascar tudo. Ver o que sobrar. Chamar por uma fé. Continuar.

o Menina baiana - claquete 104

Ele não a quer, eu escutei em bom som.

O MENINA BAIANA: Uma ferida aberta cicatrizando, pra ser romântica e decidir que metáforas, metáforas, memórias, migalhas, mortalha, tudo com a letra m não presta, pra ser menina. Que diabos foi isso que eu aprendi com o que me ensinaram? A chorar por leite derramado? Eu sou tão rude. Quero rumar a minha imaginação. Pela primeira vez fiz uma luz. Muita coisa ao mesmo tempo mesmo. Ser artista pelo nosso convívio é ver o ceu e o inferno todo dia. Eu vi no espelho, ele me disse que na hora da multidão programada é possível ir ou voltar. Esse espelho tem tanta história pra me contar. Ele sabe que é espelho, está tudo bem. Eu sei que narciso acha feio o que não é espelho. Assim a rede vai se tecendo. Competir é inútil. Assim como o amor. Servem a nada. Ficam desejando bom dia por aí, pra quê? Porque assim o é. Menina cheia de queixas e pesares. Lavar a alma é uma pesquisa de alma. Aos poucos vou lavando a minha até ficar transparente e ninguém sentir a falta, só a voz.

o Menina baiana - claquete 103

CENA: Desocupação da vida

O MENINA BAIANA: Eu quero trabalhar as inéditas. Cantora criada batendo sozinha na porta do bar é cabreirante. Meus dentes não são tão fortes pra morder beirada de cinzeiro de louça e conseguir arrancar um pedaço. Minha voz será mais forte cantando o que ninguém nunca ouviu, você me entende? Aí eu descolo de todas que me dizem que veem. É Elis, é Maria, Mariene, é Elba, é Piaf e agora deram pra escutar Nana. Nana, Santa Muerte! Diga a ele pra me avisar logo se vem porque estou com pouco tempo por aqui. É a história que tem tempo curto agora, não sou eu. Passo os dedos pelas minhas costas e os sinto contornar todas as costelas, fazendo meu próprio raio x. É preciso marcar o tempo. O " beat" é mais rápido, neném disse. Você concorda?

DONA DA MINHA CABEÇA: Laços frouxos existem muitos.

O MENINA BAIANA: É uma irmã que você vê em mim? É uma laço fraterno semelhante a isso?

DONA DA MINHA CABEÇA: Eu tô limpando, faxinando, arrumando.

O MENINA BAIANA: Pouco importa, meu amigo. Pouco importa. Veja, é uma doença mesmo. Algo que talvez eu nunca dê conta. Como tantas pessoas iguais a mim por aí.

DONA DA MINHA CABEÇA: Que texto lindo. É essa dissociação talvez o reencontro com o alívio.

O MENINA BAIANA: Quero conseguir ver a beleza desse texto.

DONA DA MINHA CABEÇA: "sinto na pele meu organismo pedindo esse quase nada"...

O MENINA BAIANA: Vai ver que eu ainda não​ posso ver. Está tudo bem. [pausa e muda de lugar] Ele quer ter o dinheiro dele toda semana.




quinta-feira, 8 de junho de 2017

O Menina baiana - claquete 102

O MENINA BAIANA: Eu venho, eu venho. Não tem santo nem orixá na Bahia que não se curve a seus pés, minha santa Muerte! Esse livro quase não tem cheiro e as notas eu deixei de acompanhar. Eu me deito hoje com Camus e Beauvoir. Hoje gozei muito gostoso dizendo que quando esse homem chegar que deus me livre, minha santa Muerte! Me faz essa menina baiana de tanto pesar ficar sabida de sua liberdade e ir, ir, ir, marinheira nessa corrente êxtima que vem se alojar bem no meu peito e que me impede de chorar hoje. Leia pra mim em voz alta e grave essa poesia, por favor.

QUEM?: Sem pontuação é foda.

O MENINA BAIANA: Invente.

QUEM?: Você​ tinha que raspar orixá. Você tem ancestralidade. Não se pode escapar do quem. Vai jogar uma búzios!

O MENINA BAIANA: Por que diz isso?

QUEM?: Porque gosto de você​.


quarta-feira, 7 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 101

CENA: Isso aqui é o umbigo do mundo

O MENINA BAIANA: Pensei em voltar à filosofia, mas também seria competir. Competir com quem está me mostrando que as coisas não são como eu quero. Eu devo me conformar. Quando sou quase nada é quando recebo sinais de ser um pouco. A razão eu questiono. Mas fui avisada, você não sabe ficar só. Você está muito longe e eu devo viver minha vida daqui desse lugar. Há simulações de um estar perto, pra mim, com isso que tenho sentido, já lhe senti muito perto. Acho que você não. Descobri que andei competindo sem ter o mínimo de recursos pra isso. Senti meu corpo enfraquecendo muito. Volto pra essa tela todo santo dia em busca de algo que nunca vou alcançar. E choro. Às vezes acordo chorando. Vai passar. Antes de você chegar, isso há de passar. Com, formar. Observar o que estou formando com essa experiência. Tenho medo das cascas que tive um dia em todo o meu corpo.

O Sol

E se eu chegar mais perto da pobreza?
(Me olhando no espelho)
Mais perto? Todos somos pobres
E se eu adentrar a caridade indo ali no mercado comprar ... Tem coisas que faltam nas prateleiras
E se eu voltar lá naquela imensidão e buscar o livro que eu beijei e larguei
Eu vi Caeiro tão lindo ele diz que não é o que ele escreveu porque o sol não incide sobre a flor do mesmo jeito todas as horas do dia
Santa Muerte!
Eu volto pra lá?
É a paixão me levando pra lá?
(Um olho no espelho)
Meu deus bem aqui dentro desse espelho meu deus
Eu passei por lá
Eu posso voltar
O sol a essa hora da noite resolveu visitar minhas pétalas!
Ó Sol de minhas pétalas! Você é impossível!

terça-feira, 6 de junho de 2017

Claquete 100

CANTORA BAIANA: O passarinho está voando agora. Uma ave de rapina atravessando o mar. Tomara que o frio lhe poupe e as horas passem como um raio lhe poupando do assento. Trezentos e sessenta graus, passarinho, eu ainda estou aqui e não me pergunte por quê. Porque você sabe. Afrodite tinha um cinto, mas um único amor. Quem colocasse o cinto, atrairia quem quisesse. Eu queria o cinto de Afrodite. Ou não... Ela fez começar a guerra de Tróia sem saber. Talvez a minha voz seja o que me faz um semi-deus. Ela diz que todos os mortais o são. É muito louco depois que eu canto, é quase como estar com o cinto de Afrodite, com a ausência do amor desejado. Talvez só você estando na plateia enquanto eu canto pra me desejar, pra querer me abraçar no final do show. Pode ser que não aconteça eu Afrodite. Posso ser apenas eu nesse dia. Tomara que sim. Tô buscando um nome pra essa etapa da pesquisa. Eu compreendo, dedico atenção, a morte me sonda como santa, eu ando moinho. O vento bom é quando eu canto, passarinho, e você me traz notícias de seus voos.

Claquete 100

Que voz é essa, menina?

CANTORA BAIANA: É medo. Eu sinto muito medo. Tenho pesadelos, sinto medo de muitas coisas. É tristeza, um tristeza que não tem me deixado em paz e eu choro no minuto em que meus olhos abrem pra o dia. Eu tenho pesadelos sem pílulas. Estou perdendo a minha gargalhada. Poucas coisas me fazem feliz. Quando vem o riso, é quase forçado. A não ser que eu esteja lá. Quanto a isso seria um mentira eu dizer que estaria triste. Eu digo, são poucos momentos, é um deles é lá. Outro deles é com ela, que aponta na minha cara, no meu corpo, e a minha voz eu começo a sentir mais forte. Isso de ter ido embora, de ter resolvido deixar ele, me entristece em demasia. Isso de eu ter que chamar o nome de alguém quando tenho que protegê-lo do perigo, me causa desespero. E escuto todo mundo resignado me dizendo que isso é a vida. Eu não sei. Eu não entendo. Nada é tão fácil pra mim. Eu não sou tão bom.

Claquete 100

QUEM?: Você vai me ver. Deixa eu chegar. Não creio que isso que você pede será possível mais. Talvez faça mal a você.

O MENINA BAIANA: Vou parar de pedir. Me faz mal sim. Me coloquei agora diante de um espelhinho de duto. Eu vi. Faz mal a mim mesma. O objeto é pra ser desviado. Eu invisto tanto que na hora de desviar por um motivo que eu julgo ruim, eu me sinto assim. Lembrei do livro de Heloísa Penteado. Apenas queria a calma daquela lesma, porque devagar eu já sou. E tenho amigos. Desconfio deles também. De alguns. De você eu desconfio, mas é uma desconfiança diferente. É desconfiar que você é igual aos outros, quando eu não vejo nada, só desconfio. Estou aqui porque quero, e sofro com o meu próprio querer. O que é que tem nesse gozo? Amor de pica? Foi quando você disse que me queria morando com você. Quando me disse que se estivesse aqui provavelmente estaríamos namorando. Depois me disse mindfullness. Depois que algo o repeliu.

QUEM?: Estou estressado com a preparação pra viagem.

O MENINA BAIANA: O que falta?

QUEM?: Arrumar as malas e organizar a casa.

O MENINA BAIANA: Arrume as malas e se não der tempo organiza a casa na volta. É um lógica. Tô ficando melhor de lógica. Será esse meu gozo? Por isso teimo em ficar mesmo você dizendo que acredita não ser mais possível? Foi possível eu cantar quatro vezes na rua e pagarem pelo meu canto. Você vai querer pagar? Não, não. Acabou isso também. Eu entendi tudo. Meu querido, eu vou embora daqui.


segunda-feira, 5 de junho de 2017

Claquete 100

O MENINA BAIANA:   Foi aparecendo esse corpo em mim. Esses pêlos, esses seios, essas curvas e meu rosto foi mudando. Pari uma criança de mim tão prematura e me apontaram mais esse corpo. É o mesmo, menina. O violão. É o mesmo motivo, menina. De um dor que não passa e a vida inteira desde de menina me põe a chorar. Que dor é essa? Eu tô pensando em dor de alma que piora quando alguém chega muito perto e enxerga que ela existe. Eu vou comprar um tênis, será que resolve? Não. Esse corpo mudado não carece de nada mais, está fraco, praticamente morto. Nem me peça pra cantar. Isso acabou. Um fantasia, inconsequente como toda fantasia. É microfone, é técnico de som, é violão, retorno. É melhor que antes, é taquara rachada de notas descontroladas. É cena, pura cena. Aquele braço que queria alavancar o corpo inteiro que se conteve porque escutou o salto no tablado. Faz bem pra quem? Pra eles olharem pra mim querendo me devorar depois? Pra virem me cumprimentar e achar que podem passar a mão em mim? Acabou a música. Acabou a menina. Acabou esse meu jeito de achar que há saída. Acabou... Talvez se eu sentar... Se eu descer agora pra quadra... Sozinha... Se eu pegar o carro na garagem, fechar tudo e ligar.

domingo, 4 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 100

CENA: Eu sou cavaleira

O MENINA BAIANA: Tremendo por dentro, pra variar. A paz estiou, mas ainda posso avistar quando eu me concentro pra lembrar da sensação. Lembra da paz, embora da paz. Ressaca de paz. Muitas vezes lembrar não dá paz em mim. Uma fraqueza de dor de barriga, tremedeira de um corpo desidratado talvez. Mas tem comida pra dentro. Eu vejo ela e me alimento. Esqueço que espero uma palavra alheia, um aviso de leitura, uma gargalhada, uma resposta. Já não acredito em respostas nessas vida. Duvido que vão aguentar escutar minha voz por muitos minutos, ficou muito aguda e esganiçada. Tô procurando meus graves que perdi de tanto aquecer. Espero o dia de encontrar com ela pra uma explicação nesse espelho, espelho meu. Não quero mais passar vergonha, nem pedir desculpas pela minha voz. Eu entrei num mantra aquecimento desde a hora que levantei da cama e isso pode ter me prejudicado. A descarga quebrou. Meu coração parece andar acorrentado nessa liberdade de desejo sabendo que o mundo não sabe nada de mim. Nem você sabe, e nem você quer saber. Consulte os pixels e verá. Meu silêncio virá com o som, meus olhos fechados ainda lhe enxergam. Vá. Vou ficar bem com ela. Quando tem sol demais sobre mim eu passo mal.

sábado, 3 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 99

CENA: Do lar

O MENINA BAIANA: pode ser esse dengo que estou recebendo hoje.. eu tô mole, mole... Sem pílulas, e numa moleza gostosa... Um dengo que eu fui ali do dique pequeno buscar e fala meu nome, sabe meu jeito, me ajuda a arrumar meu lar. A casa está cheirosa com tanto dengo e eu, de tão dengosa, choro. Quando alguém existe assim é bom. Quando vem encher de outros ruídos a minha casa, não reclama do meu cigarro, me bordeia em presença, me faz sentir que eu ainda existo. Tem passado comigo, eu não preciso dizer muita coisa, tem passado, isso é muito bom pra mim agora.

o Menina baiana - claquete 98

CENA: Liberdade demais aprisiona e mata


O MENINA BAIANA: Você é igual aos outros. Minha liberdade é insustentável. Pra que me disse que queria se era tudo mentira? Pra que mentir se o que deseja é alguém quase todo dia olhando no seu olho, alguém pra você tocar e ser tocado? É a minha liberdade, não é? Você fala tanto na minha liberdade, e desdenha de mim. É a tal segurança que você quer? Você disse pra eu te contar se eu deitasse com outro, que lhe faria bem, lhe excitaria. Você gostou de ver o meu corpo pixelado? Você me trouxe uma agitação tão forte e de repente nem escuta mais o que eu falo... Quer ser o falo? É isso que todo homem quer?

o Menina baiana - claquete 97

CENA: Strong and sweet

O MENINA BAIANA: Vou buscar realizar de novo. Não sei o que eu faço agora com a música.

BOMBA: Em relação ao lance de eu acreditar em você, é a pura verdade, eu acho você um artista foda. Agora, um questão que concordamos é que você precisa calejar mais. Você tem quatro shows na carreira, é pouquíssimo. A gente nota que você precisa de algumas coisas, o que é natural. Em poucos shows você já está com o nível foda. O que quero dizer é que você não precisa marcar poucos shows para garantir público. Essa não deve ser mais sua preocupação. Você só precisa se soltar mais, tá muito contida! As pessoas tão chegando cada vez mais pra você​, pelo seu trabalho, pela sua voz.

O MENINA BAIANA:  O que vou fazer na música agora é estudar. Hoje me sinto feliz como sentindo a maciez da brisa quando ela me refresca. Estou indo pra mais um level.

sexta-feira, 2 de junho de 2017

o Menina baiana - claquete 96

O MENINA BAIANA: Eu tô aqui lendo Camus mas pensando em Homero . Eu não sei ficar sozinha, você me entende.

SEJA LÁ QUEM TE MANDOU:  Tem pouco tempo você com ele...

O MENINA BAIANA: É. Paciência. Geovani também está por aqui comigo. Incrível. Música baiana. Tem muita gente fazendo música por aí. Esse veio fazer bem no rio vermelho. Veja que sorte! Eu continuo andando pra ir à análise, depois de dois anos. Continua, querido, o que se pode ver hoje é o que já se apresentou, a única coisa do presente é a respiração das nossas células corporais. O resto é música e silêncio. Dizem som. Eu digo música, porque música só quem faz é ser humano. A palavra é música.

SEJA LA QUEM TE MANDOU: Acho que vou fumar.

O MENINA BAIANA: Fumei pela primeira vez na vida quando acordei. Foi bom. Mas antes chorei.

quinta-feira, 1 de junho de 2017

Diante do incompreensível
Vou me acovardando
acho que algo vai mal e passa pelo meu sangue
Quero trocar de sangue
Quero sangue novo
Meu sangue novo
Todo dia parece que troca uma parte do que mancha a roupa
Eu me confundo com as manchas
A minha cara que gosta de elastecer em gargalhadas fica dura e a boca não abre
Combinei de me divertir
Combinado
A minha liberdade se dirige à angústia
A minha esperança me aprisiona
E a carne treme involuntariamente
Os meus lábios
O pedaço na perna logo acima do joelho
Outro pedaço no braço
Um sacode
Sacode mamãe
Sacode tudo
o que há de incompreensível
Sacode e pensa
No eterno retorno
Assujeita-se
ao eterno retorno


o Menina baiana - claquete 95

CENA: Passando a limpo

O MENINA BAIANA: Começaram a chegar os presentes!! Presente dessa vez foi pra eu passar na frente de alguns brasileiros na fila do TRE. Qual o direito a mais que essas pessoas eu tenho? Por que alguém se encantou com a minha voz? Será que o artista tem que ter prioridade assim como o idoso, uma gestante, uma lactante...ohh... Meu deus do céu.... Será? [cochichando] eu tô duvidando de todo mundo. Eu tô com Camus no capítulo dois que é bem confuso. Eu tô indo a ele pra ver se eu encontro alguma coisa como aquelas pessoas disseram ao redor do mundo. A onda bate forte de vez em quando. Puta que pariu! Bate muito forte! [pára de cochichar] Acho que eu tô ficando maluca e vão me internar a qualquer momento, como os usuários de crack em São Paulo. De dentro do manicômio não sei se posso fazer alguma coisa. Se eu for parar lá vou ter que trabalhar. Ai, nossa senhora da santa Muerte. Livrai-me de mim. Ele disse que isso é se vitimizar. Então eu vou ficar aqui mesmo se isso é se vitimizar. Eu não sei viver. Ninguém sabe! Ninguém sabe!