domingo, 29 de março de 2020

O coração dela vai parar
Tenho quer ser rápido daqui onde estou
Meu deus, ela morrerá...
Por quê?
Preciso fazer algo rápido!
Pronto. Consegui.
Polícia.
Médicos.
Socorro
Ela vai parar
Não
Não era um romance
Ela não tem condições de explicar
Um amigo
Amigo
Ouviram?
Anotaram?
Eu salvo muitas vidas todos os dias
Perco muitas vidas também
Mas não percam ela
Por favor
Fuma, ela fuma

Lufá
Vou embora

segunda-feira, 23 de março de 2020

A rede

Baianos deitam na rede pra se balançar
O balanço da rede com as pernas pra fora faz um vento passar
Parece um cavalgar
Baianos usam a rede para conter a inquietação
Baianos
Baianas
Baianxs
Baianes
Baian@s

A rede que balança parece um cavalo
Com a ventania entre as pernas
Uma motocicleta para baianos trabalharem
Trabalha, baiano, nesse confinamento da existência
Falem dos baianos que deitam na rede
Se arriscam pra te entregar o que você pediu
Por telefone sem sair do sofá
Baiano dorme na rede
Também pode ignorar o que lhe está prestes a lhe matar
Amanhã baianos saberão de baianos mortos a cavalgar
Na rede saberão
Como se lembram Dorival a se balançar
Fez uma revolução mundial
Revolução mundial
Um baiano.






sexta-feira, 20 de março de 2020

o senhor Aleluia

como julgar o seu olhar? Apenas seu corpo amuletado pelas suas mãos virando e olhando para minha direção. Eu dirigindo julgo seu olhar. Está-me julgando, senhor? Pelo canto de uma flauta que um dia lhe levou uma notícia ruim sobre mim? No meu rádio, aquele que eu escolho as músicas, o senhor prefere pescar do que retirar a sua própria vida, senhor? E quando o senhor aqueceu a voz na garagem e me ensinou a solfejar gargarejando, eu estava escondida aprendendo tudo, o senhor não viu. Esta minha cabeça feita de ar, às vezes batem ondas e o seu olhar pareceu julgar os meus peixes, meu peixe mulher. Senhor, eu fiquei para mais águas, pra ver mas cachoeiras, para sentir mais o seu cantar. Olhou-me assim, por quê? A paixão não deu certo, o trabalho formal acabou, a batalha pelo pão de cada dia continha, senhor Aleluia. Abençoa com seu canto que ecoa pelas paredes de concreto onde o seu canto funciona. O canto funciona. O canto ecoa do canto. Naquele corpo perto das pilastras atrás de sua mulher, o senhor me olhou eu eu lhe julguei por parecer me reprovar porque eu pensei em desistir. Eu canto, senhor Aleluia, sabe? Vou continuar. Talvez tenha que fazer uso de muletas tais quais as suas. Qual problema há nisso? Pensei em escrever para isso. Continuo crescendo, senhor Aleluia. A sua velhice me reprovou na minha rádio deturpada. Mas segui levando minha mãe, cumprindo até o lugar onde estacionar. Eu às vezes páro, senhor, talvez não saiba. Distraio-me entre o bem e o mal de mim, essas coisas que ninguém pode julgar. Também me distraio. O senhor queria saber qual era o nome de quem pensou em desistir. Estou aqui, resistindo, olhando e pensando, escrevendo sob seu olhar. Continua a moça. Continua a vida. Eu escuto flutuante mirando aquela pedra que não se cobre nem em maré revolta, onde passarinhos fazem ninho algumas vezes e depois voam. Se eu colocar um ponto (ou mais), fui ferida. Vi tudo mudar. Modificar, senhor. Tenho voz cantante, o senhor ainda não sabe. Pesquisei-lhe, sonhei, dormi com uma proteção da maré numa casa sobre as águas salgadas tentando enxergar um novo dia. Senhor Aleluia, o tempo dá, tira, comove-me. Entre o lógico e o cronológico nessa penumbra, com muletas, continuo. Vamos nos reencontrar e quero olhar nos seus olhos e ver outra direção. É impossível julgar o seu olhar e o seu corpo virando-se para mim. Merecemos novos encontros. O lápis vai e eu voo, senhor Aleluia. Cantarei, Aleluia. Há uma diração.

segunda-feira, 16 de março de 2020

Eu acho que é gritar
Eu acho que é gritar
Você grita de lá e eu grito de cá
Você grita de lá e eu grito de cá
Ver os carros passando e o meu parado cá
Ver Caetanos cantando e eu me pondo a chorar
Caetano canta de lá e eu grito de cá
Eu acho que é gritar.
Eu acho que é gritar.
Eu acho que é gritar esse  cantarolar.
Eu acho que é gritar.
Eu acho que é gritar.
Ver os carros passando e eu o meu parado cá.
Ver a cidade andando e meu pé fincado cá.
As folhas balançando e eu parado cá
Eu acho que é gritar.
Eu acho que é gritar.
Eu acho que é gritar
Eu acho que é gritar
E se não for gritar esse é o meu chorar
Eu canto de cá eu acho que é gritar
Nada disso vai passar
Isso só vai piorar
Eu acho que é gritar.
Eu acho que é gritar.
Eu acho que é gritar
Eu acho que é gritar
Ver os carros passando e o meu parado cá
As folhas balançando
E o meu corpo da desdobrar
Meu corpo desdobrando e as pessoas andando
Todo mundo correndo e eu andando devagar

sábado, 14 de março de 2020

Quem me ensinou a tragar foi meu corpo
E brisa
A fumaça é do fogo dos raios na mata
E a gente puxa
Prende
Solta
Puxa
Prende
Solta
Puxa
Prende
Solta
Brisa
Quem me ensinou acender com fogo
Foi meu avô
Tio
Tia
Novela
Amiga
Bar
Holywood
Wolkswagen
Rota de fuga
Máscara
O fumaça entra
Prende
Puxa
Solta
Todo mundo
 Puxa
Prende
Solta
Puxe
Prenda
Solte

quarta-feira, 4 de março de 2020

Seu nome é Daniel e o meu é Mariana
Você anda assim, fala assim, faz tudo isso
Você é maravilhoso
Eu consigo ver a beleza aos poucos novamente
Que seja sempre enxergada pelos meus sentidos
Você me aparece na televisão enquanto eu choro emocionada
Estou vendo manifestações da vida
Amigos, sons, palavras, o teatro
A música
As reuniões pra dramatizar e dançar e tocar e cantar
As nossas mamães, mainhas
São nossas imagens no tempo cuidando de nós
São as Marias
Que sejamos nós Jesus e que deixe pra lá o martírio e o pecado a ser pago com os nossos corpos
Sejamos jesus vivos
Com nossas Marias
Deixar o amor crescer
Belezas brotarem
Daniel, vou lembrar de você caminhando pela Lapa vestido daquele jeito
Maravilhoso