sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Menina Maluquinha

- Mãe, eu sei porque você não ia se matar...


- É? Por quê?

- Porque você não vive sem mim, e eu estou aqui!

Conversando sobre sua aula de violão, ela disse que faria um livro de músicas, mas de músicas que já existem. Eu retruquei: "músicas que já existem?". Ela imediatamente colocou: "Mãe, você faz poesias, então você poderia fazer um livro com suas poesias!" O livro já está a caminho, eu esclareci, e ela perguntou o título. "Desassossegada", já tem a foto da capa e tudo. Eu pensei em um outro nome, "Argolas", então ela disse: "é melhor, você sabe quanto menor o nome, mais fácil de produzir..."! De onde veio este ser prestes a completar 8 anos de nascida, capaz de fazer tais colocações, tão sóbrias, opiniões tão particulares? Talvez seja corujisse de mãe na sua primeira viagem.

Hoje, sexta-feira, dia de levar um brinquedo para a escola. A professora já apreendera dois dos brinquedos que levou fora desse dia e que havia me garantido não usar dentro da sala de aula. Não bastou o compromisso com a palavra, talvez essa seja uma das oportunidades para se tratar do conceito de confiança, compromisso, e assim o fiz. Afinal, crianças não nascem sabendo! Hoje, sexta-feira, ela resolveu não levar um brinquedo, mas vestir seu equipamento de segurança para andar de patins – cotoveleiras, joelheiras e capacete. Tudo rosa, cor que não é mais a sua predileta, agora é o azul. Quando a vi toda encasacada nesse dia chuvoso, equipada, perguntei: "As pessoas não vão rir de você?" Ela prontamente responde: "Tem problema não!" É o seu desejo acima de tudo, acima da opinião alheia, sua segurança, segurança de si. Coisa que quando criança eu não tive, mas hoje queria ter.

No dia das crianças o seu presente foi o livro "O Menino Maluquinho", de Ziraldo, publicado em 1980. Ela já o havia trazido da biblioteca da escola e declarado a sua identificação com a história, detalhando inclusive parte do texto no qual isso acontecera: "(...) tinha dez no boletim que não acabava mais. E ele dizia aos pais cheio de contentamento: Só tem um zerinho aí. Num tal de comportamento" (coincidentemente achei o livro marcado nesta página!) Esse livro sempre esteve disponível na casa me meus primos, e eu nunca inclinei qualquer interesse, mas antes de comprar para minha filha, realizei a leitura completa e, nossa! Como é.... Criança! O livro conta a história de um menino que... fazia as mesmas coisas que ela faz! Risca, recorta, inventa, lê, brinca, canta, dança, chora, joga futebol... Eu quem identifiquei a minha filha na leitura, acredito que muito mais do que ela.

Ontem fui dormir pensando nisso tudo que estou escrevendo hoje, pensando também nas minhas tantas angústias. Hoje ela sai toda segura de si, sabendo inclusive do lucro de alegrar as pessoas caso deem risadas da sua apresentação. De como é possível em meio a minha dificuldade de viver ter no meu seio familiar uma criança tão sadia, tão cheia de tantas coisas para oferecer ao mundo e colher dele. Eu disse a ela, achando ensinar alguma novidade, que é preciso ter coragem para viver, para sair de casa, e ela disse: "Você tem razão, tem ladrão, tem os carros..." E eu disse: "Tem gente." Mas disso ela não tem medo. Ela não tem medo! A maioria das mães, mesmo inconscientemente, desejam realizar-se em seus filhos quando na vida adulta. Eu já sinto a realização, porque com certeza ela crescerá e se transformará numa pessoa legal, aliás, na pessoa mais legal do mundo, mas uma pessoa legal mesmo! Assim como O Menino Maluquinho que no final da história todo mundo descobre que não tinha sido um menino maluquinho, mas que tinha sido um menino feliz! (Contei o final da história! Rsrsrsr).
 

3 comentários:

  1. Que delícia ser mais um dos seus textos. Li todinho e a voz foi ficando embargada de emoção em saber que de uma forma ou de outra estou fazendo parte dessas e de tantas outras histórias. Obrigada!

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  2. Ela me emociona a cada colocação; às vezes fico sem saber o que responder diante de tantas observações que ela faz. Um orgulho, um amor que não tem tamnaho por esse piveta!
    Ótimo texto!

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  3. O Menino Maluquinho se descobriu e está crescendo cada vez mais confiante e seguro de si... Ainda precisa muito das suas orientações, mas já sabe bem o que quer da vida.

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