segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Carta ao Maestro

Quando tudo é solidão e as paredes em branco nao sustentam o risco que eu faço, eu busco outras paredes. Não sei se o nome dessas coisas que sustentam a ponta do meu lápis, ainda que o façam escorregar, podem ser chamadas de paredes. Podem ser taludes, sapatas, tubulões, pilares, vigas, algo que impeça o meu tropeço. Alguém, não algo, algo não move a humanidade, alguém move a humanidade por alguém. Naquele dia de vento nulo e horizonte desaparecido, naquele dia em que levantei da mesa do jantar com o meu cão, eu cumprimentei alguém cuja fala no passado me fez paredes, pilares, essas coisas que impedem que o pensamento caia no buraco sem fundo. Foi só isso. O espelho-alguém disse que eu não estava tão só nessa cidade de pouca vergonha e muita verdade de pouca justiça e muita vaidade. Depois a saga da travessia, depois axé, depois meu primeiro panorama percussivo mundial, tudo entre o centro e o rio vermelho e eu, querendo silêncio de mim, diminuindo a urgência desse vômito musical, dessa coisa incontida porém barrada com muito esforço por um pouco menos de 220 horas mensais por tantos anos. Um pouco menos. Porque eu só chego tarde, quando as paredes estão trincadas, úmidas e escorregadias, e eu em terreno movediço.

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