domingo, 9 de julho de 2017

o Menina baiana - claquete 151

CENA: Despacito.

O MENINA BAIANA: Cartaz. Um filho. Uma carteira de cigarro. A cama. A correspondência do banco. O cachorro. Ou apenas: eu fico perto porque te admiro muito. Pedaços de arame com pedras, apenas. Eu fico perto porque acho você uma pessoa especial que eu admiro muito. A maré em dois, dias. Não mais que isso. Engole seco e nunca esquecerá. "Olhos de brilho penetrante que vão fundo no que olham, mas não no próprio fundo." Jaquinho me viu ontem. Fiquei feliz. Também ontem viram, na dificuldade extrema em encontrar o tom certo, na dificuldade extrema em erguer o olhar fundo e cantar, viram alguma delas. Eles são muito sabidos, sabem de todas elas. É o que chega mais perto da realização de desejo deles, ao que me parece. Escutei: minha Vanessa. Eu sempre sinto algo de devorador. Eu deixo. Ainda tenho dúvidas sobre a saúde desse sentimento. Alguns quando vêm, passam a mão em mim e eu acho isso desconfortável. Quero entender como lidar e me sentir menos invadida. Eu senti a moleza no corpo depois da exposição. A moleza da paz. Deixei de lutar contra ela e me entreguei. Talvez seja a fórmula. Uma menina puderam ver. Está voltando. Vejo barquinhos brancos no mar, cada um com a cruz em suas velas. Algo de errado está acontecendo. São muitos. Alguns acompanhados de alguém da família. Eu pergunto por você e assim você está. Eu passo ao seu lado e toco apressadamente no seu ombro pra você me ver. Você me vê mas não se manifesta - tem alguém ao seu lado e seu  braço descansa no ombro dessa pessoa. Percebo que está machucado. Muitos também o estão. Eu adianto os meus passos porque quero estar em suas vistas, mas não olho pra trás. Sigo com a certeza de que você não vai falar comigo nunca mais. Eu persisto. Vou ao hospital. Fugimos juntos de lá. O ponto de encontro é no barco. Felinos enormes são adestrados pelas forças armadas a lhe farejar e eles vêm diretamente pros meus pés e eu sei, estou com o seu cheiro em meu corpo todo. Subo num andaime metálico tentando fugir desses animais enormes farejantes. Vão me atacar com certeza, eu não correrei mais que eles nunca. Então eu me entrego e um deles vem e me envolve no chão. Sinto minha cabeça dentro da boca quente dele enquanto meu corpo está imobilizado pelo corpo todo dele. Corpo quente. Aguardo mordidas fatais mas não acontecem. Eu consigo retirar a minha cabeça abrindo a boca dele com minhas mãos. Começo a cuspir na boca dele, talvez isso funcione. Ele sentir outro cheiro que não o seu. Busco salivar. Cuspo. Beijo ele com toda a saliva que consigo produzir. Ele vai ficando confuso e eu consigo sair. Corro ao ponto de encontro. Você está ferido, meu amor. Sua perna direita, próximo ao quadril, tem uma ferida aberta profunda. E vejo que sente dores. Mas vejo também um homem forte e resistente agindo rapidamente em fuga. Eu posso confiar em você. Eu me sinto muito segura ao seu lado, trabalhando junto a você. Algo acontece e eu lhe perco no caminho. Continuo em busca e o encontro a salvo na casa de uma velha maruja, sob seus cuidados numa cabana à beira da contenção de pedras que dá pro mar.

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